Redução da jornada de trabalho não passa de engodo
O Globo
PIB brasileiro sofreria queda de até 16% caso
houvesse mais uma folga semanal, estima estudo da Fiemg
Os projetos em tramitação no Congresso
defendendo a redução da jornada semanal de trabalho ganharam apoio de setores
da esquerda com base numa visão idealista e distorcida da realidade econômica.
Defensores do fim da jornada de 44 horas semanais — ou 6x1, com seis dias
trabalhados e um de folga — ignoram (ou fingem ignorar) que a mudança teria
consequências dramáticas para o crescimento e a geração de riqueza.
Num cenário otimista, reduzi-la para 40 horas, com duas folgas semanais, provocaria queda de 14,2% no PIB, com perda de 16 milhões de empregos e de R$ 102 bilhões em impostos, segundo estudo da Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg). Tal cenário considera que haveria aumento de 1% na produtividade do trabalho, patamar muito superior ao 0,2% anual registrado entre 1981 e 2024. Sem esse aumento, a queda no PIB chegaria a 16%, com perda de 18 milhões de empregos e de R$ 118 bilhões em impostos, destinados a investir em educação, segurança ou saúde.
Estimando a perda com base noutra
metodologia, o economista Fernando de Holanda Barbosa Filho, do Instituto
Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV/Ibre), calculou que a
redução da jornada para 36 horas resultaria em queda de 11,3% no valor
adicionado pelo trabalho à economia. Independentemente do método, é consenso
que haveria encolhimento da riqueza produzida, portanto menos oportunidades e
maior miséria.
Não é difícil entender os motivos. De olho
nos votos, ninguém no Congresso defende diminuir salários de forma proporcional
à redução das horas trabalhadas. Sem isso e sem maior produtividade, a redução
da jornada não passa de um aumento salarial sem lastro. Muitas empresas não
podem absorver o baque, e os custos seriam repassados ao consumidor, aumentando
a inflação. As incapazes de repassar tudo seriam forçadas a demitir ou a
substituir trabalhadores formais por informais.
Defensores da redução da jornada argumentam
que a medida ajudaria a aumentar a produtividade. Trata-se de uma falácia. De
acordo com esse pensamento mágico, os trabalhadores gerariam a mesma produção
trabalhando menos horas — como se estivessem fazendo corpo mole à espera da
mudança. A realidade é o oposto disso. Setores que conseguem se manter
produtivos já reduziram a jornada para cinco dias semanais. De resto, a
produtividade do trabalho no Brasil tem evoluído de forma medíocre há décadas,
e nem Congresso nem governo têm tomado medidas para resolver essa deficiência,
a principal da economia brasileira.
Os países que reduziram a jornada com sucesso
viviam conjuntura bastante distinta. A Coreia do Sul introduziu a semana de
cinco dias em 2004. O novo sistema começou no setor público e nas empresas
maiores antes de ser adotado pelas demais. De lá para cá, o desemprego se
manteve abaixo dos 5%, mesmo durante a pandemia. Coreanos trabalham mais horas
que empregados nos países ricos, mas dedicam cada vez menos tempo ao emprego.
Como conseguem? A produtividade cresce a altas taxas. Três garçons coreanos dão
conta de atender o mesmo número de mesas, trabalhando menos. Com isso, pode
haver mais folgas. No Brasil, a situação é outra. Levando em conta férias e
feriados, o brasileiro trabalha muito menos que a média global. Sem que se
torne mais produtivo, não é hora de reduzir a carga ainda mais.
Morte por ‘desafio do desodorante’ expõe
barbárie na internet
O Globo
Episódio que vitimou menina de 8 anos em
Brasília comprova urgência de resgatar PL das Redes Sociais
Causou comoção no país a morte de uma menina
de 8 anos, no Distrito Federal, por ter, segundo investigações preliminares,
inalado gases ao participar do “desafio do desodorante” na internet. Essa
aberração, que circula na rede social TikTok, consiste numa disputa para ver
quem inala a maior quantidade do produto em menor tempo. A polícia apura os
responsáveis pelo conteúdo e se houve falhas por parte da plataforma digital.
O avô encontrou a criança desacordada. Sob
uma almofada úmida, havia um frasco de desodorante. A menina chegou a ser
levada ao hospital, onde a equipe médica conseguiu reanimá-la, mas morreu dias
depois. Não há racionalidade em tais desafios. Há outras versões da sandice,
com inalação de esmalte de unha, solvente de tinta, spray de limpeza de
computador, gasolina ou laquê. Todos relativamente fáceis de encontrar no
ambiente doméstico. Quando participa do desafio, geralmente a criança está
sozinha, dificultando o socorro.
Infelizmente, casos como o do Distrito
Federal são mais frequentes do que se imagina. Recentemente, uma menina de 7
anos no ABC paulista e outra de 11 em Pernambuco perderam a vida em
circunstâncias semelhantes. Levantamento do Instituto DimiCuida — que atua na
prevenção de jogos perigosos na internet — mostra que, de 2014 a 2025, ao menos
56 crianças e adolescentes entre 7 e 18 anos morreram ou ficaram gravemente
feridos no Brasil em consequência de desafios compartilhados nas redes sociais.
O número leva em conta casos noticiados na imprensa ou relatados a organizações
da sociedade civil.
Episódios assim expõem o território sem lei
das redes sociais, onde proliferam os conteúdos abjetos, como desafios letais,
incentivos à automutilação, apologia a crimes de ódio, a maus-tratos de animais
ou moradores de rua e à perversidade. Tais atrocidades continuam disponíveis e
podem ser acessadas por crianças e adolescentes, a despeito dos filtros que as
empresas afirmam aplicar. O Projeto de Lei das Redes Sociais, que, entre outros
pontos, atribui às plataformas a corresponsabilidade por conteúdos que veiculam,
se perdeu nos labirintos do Congresso. A proposta foi bombardeada pela oposição
sob o pretexto descabido de que instituía censura — e rigorosamente nada foi
colocado em seu lugar. Pela urgência do tema, deveria ser resgatada sem demora.
Nos últimos dias, as Polícias Civis de Minas
Gerais e do Rio Grande do Norte, com apoio do Laboratório de Operações
Cibernéticas da Secretaria Nacional de Segurança Pública (Senasp), deflagraram
operações para reprimir essas práticas criminosas. A Polícia Civil do Rio
prendeu dois adultos e apreendeu seis adolescentes acusados de cometer crimes
contra menores na internet. São ações necessárias, mas precisam ser constantes
e mais abrangentes. De nada adianta agir depois que as tragédias já se
consumaram. Algo precisa ser feito — e logo. Não é possível que crianças
continuem a morrer de forma estúpida, vitimadas pela barbárie que se esconde
nas redes sociais.
Política econômica se subordina ao modo
eleição
Folha de S. Paulo
Com baixa aprovação a Lula, governo prioriza
medidas de impacto; ministro anuncia isenção da conta de luz a 60 milhões
A administração petista indicou com clareza o
que pretende nesta segunda metade do mandato presidencial ao trocar um projeto
aprofundado de mudança do Imposto de
Renda, que daria sequência à reforma tributária, por uma proposta de
isenção para rendas até R$ 5.000 mensais, hoje peça de propaganda oficial.
Premido pela baixa aprovação popular a Luiz
Inácio Lula da
Silva, o governo entrou em modo eleição —e suas ações, aí incluída a política
econômica, estão subordinadas a essa prioridade. Assim também se demonstrou com
a nomeação do marqueteiro de campanha para o posto de ministro da Comunicação.
Não por acaso, a outra grande inovação
gestada neste ano pelas pastas da economia foi o crédito consignado para
trabalhadores celetistas garantido pelo FGTS, com o qual
se procura atenuar os efeitos da alta dos juros promovida
pelo Banco
Central autônomo para conter a inflação impulsionada
pelo gasto público.
Divulgaram-se há poucos dias estimativas
oficias de que a expansão contínua de despesas de execução obrigatória deverá
inviabilizar, a partir de 2027, o funcionamento da máquina pública, por
esgotamento de recursos nos limites do Orçamento. O governo Lula, no entanto,
parece reagir como se os números tratassem de décadas à frente.
Em tal contexto, não espanta que o ministro
Alexandre Silveira, de Minas e Energia, sinta-se à vontade para anunciar de
moto próprio um projeto de lei destinado a isentar 60 milhões de pessoas da
conta de luz, mesmo depois de seu colega da Fazenda, Fernando
Haddad, ter negado estudos nesse sentido em sua pasta ou na Casa Civil.
A aparente divergência não passaria, segundo
Silveira, de uma "falta de comunicação". É sintomático, de todo modo,
que nem Haddad nem Lula tenham se posicionado sobre uma medida de tamanho
impacto.
Ainda que a sugestão não venha a prosperar,
trata-se de exemplo da forma com que temas complexos, como o intrincado sistema
elétrico brasileiro e seus subsídios cruzados, vão sendo tratados à base de
voluntarismo —enquanto problemas de fato urgentes são empurrados com a barriga,
e o BC enfrenta sozinho a ameaça inflacionária.
Em entrevista ao jornal O Globo, o ministro
responsável pela publicidade oficial, Sidônio
Palmeira, considerou que o governo não explorou o bastante a herança danosa
recebida de Jair
Bolsonaro (PL).
Concorde-se ou não com a afirmação, o fato é que foi a rejeição ao bolsonarismo
que deu um terceiro mandato a Lula.
A esta altura, um presidente que lidera as
pesquisas para a disputa do próximo ano deveria estar mais preocupado com a
herança que deixará. Na última reeleição petista, Dilma
Rousseff manteve o pé no acelerador do gasto público, negou o quanto
pôde a necessidade de ajustes e adiou as decisões difíceis para o segundo
mandato. Deu no que deu.
Mensagens cifradas do planeta K2-18b
Folha de S. Paulo
Cientistas encontram sinais de organismos a
124 anos-luz, reacendendo na Terra a esperança de entender a origem da vida
Um ditado célebre no meio científico diz que
ausência de evidência não é evidência de ausência. Agora, com notícias
entusiasmantes sobre possível sinal de vida no planeta K2-18b, cabe a
paráfrase: presença de evidência não é (ainda) evidência de presença.
Feita a ressalva, impõe-se reconhecer a
importância da descoberta do astrofísico Nikku Madhusudhan, do Instituto
de Astronomia da
Universidade de Cambridge (Reino Unido).
Madhusudhan e colaboradores usaram dados do
telescópio espacial James Webb para analisar
informações físico-químicas provenientes do K2-18b, que se encaixa na
classe sub-Netuno —de tamanho inferior ao menor dos planetas gasosos do Sistema
Solar, mas maior que a Terra; no caso em tela, 8,6 vezes sua massa.
Utilizou-se o chamado método de trânsito.
Quando um planeta passa em frente à estrela que orbita, parte da luz do astro
atravessa sua atmosfera e o espectro de brilho assim modificado carrega
informação sobre os gases que a compõem. O grupo de Cambridge encontrou
assinaturas de dimetilsulfeto (DMS) e dimetildissulfeto (DMDS).
Na Terra, tais compostos são produzidos
unicamente por seres vivos, como microrganismos. Trata-se, portanto, de uma
evidência indireta de vida no K2-18b, que se acredita ser um planeta hiceano,
ou seja, com hidrogênio na atmosfera e oceanos de água em estado líquido.
O próprio Madhusudhan aponta a necessidade de
repetir observações para garantir que o sinal encontrado seja robusto, no nível
em que as chances de anomalia estejam abaixo de 1 em 1 milhão. Afinal, pode ser
um artefato estatístico —quando o resultado não é reflexo da realidade, mas
efeito secundário de métodos de análise ou coleta de dados.
Tampouco se exclui que haja um mecanismo
abiótico desconhecido para gerar DMS ou DMDS em outros mundos. Por ora, a
hipótese mais aceita é que os mares do K2-18b fervilhem com bactérias ou algo
assim.
E
vida inteligente? Há muito a humanidade busca saber se não está
solitária no cosmos. Mesmo que haja extraterrestres entre as estrelas, subsiste
a dificuldade da distância: o K2-18b está a 124 anos-luz da Terra (cada ano-luz
corresponde a 9,5 trilhões de quilômetros). Pelas leis da física como as
conhecemos, qualquer contato se afigura como altamente improvável.
Nada disso diminuirá o brilho da descoberta, se comprovada. Ela fala à curiosidade atávica da humanidade pela origem dos fenômenos que lhe deram a luz.
O insulto e a injúria sentados no Salão Oval
O Estado de S. Paulo
Trump se junta a um autocrata
centro-americano para desmoralizar o Judiciário dos EUA. A Suprema Corte tem
evitado cair em provocações, mas precisará estabelecer um limite
Os apetites autoritários de Donald Trump,
combinados com sua concepção maximalista do Poder Executivo, estão submetendo o
Estado de Direito nos EUA a um teste de estresse sem precedentes, que põe a
Casa Branca em rota de colisão com a Suprema Corte. Ante os atritos do governo
com o Judiciário, a Corte, com a prudência que lhe cabe, tem buscado garantir o
devido processo legal, preservar as prerrogativas do Executivo e evitar uma
crise constitucional.
Essa encruzilhada ficou evidente no caso de
Kilmar Abrego Garcia, um salvadorenho residente nos EUA que foi deportado para
uma prisão de segurança máxima em El Salvador sem qualquer processo legal. No
dia 10 passado, a Corte sustentou unanimemente uma decisão da Justiça federal
determinando que o governo “facilite” o retorno de Abrego Garcia. A resposta de
Trump foi a mais cínica possível: em um teatro midiático armado no Salão Oval,
calculado para tripudiar da Suprema Corte, Trump mostrou ao mundo que ignorará
a sua decisão fingindo respeitá-la.
Com a presença de autoridades do alto
escalão, Trump recebeu o presidente de El Salvador, o orgulhoso autocrata Nayib
Bukele, para encenar um impasse conveniente, como se nenhum dos dois pudesse
fazer nada sem abusar de seus poderes. “Cabe a El Salvador decidir”, disse a
procuradora-geral dos EUA, Pam Bondi. “Se quiserem devolvê-lo, vamos facilitar,
fornecendo um avião.” De sua parte, Bukele afetou escrúpulos: “Espero que não
estejam sugerindo que eu contrabandeie um terrorista para os EUA”, disse aos repórteres
referindo-se a Abrego Garcia, contra quem não há nenhuma acusação de
terrorismo. O secretário de Estado dos EUA, Marco Rubio, recitou diligentemente
seu papel na pantomima, advertindo que a relação entre dois países é uma
questão de política externa, cuja condução cabe ao Poder Executivo e escapa à
alçada do Judiciário.
Como notou o articulista do Financial
Times Edward Luce, “o drama no Salão Oval ofereceu uma lição cívica para o
mundo: o governo dos EUA tem mais respeito por um homem forte estrangeiro do
que por sua própria Suprema Corte”.
A farsa se prestou a normalizar dois
precedentes assustadores e interligados. O primeiro é a ideia de que o governo
pode prender pessoas à revelia da Justiça americana e encarcerá-las em algum
Gulag improvisado mundo afora. Esse corolário foi expresso em uma declaração de
três ministras da Suprema Corte: “As implicações da posição do governo” são “de
que não só cidadãos estrangeiros, mas também cidadãos dos EUA podem ser detidos
nas ruas, colocados à força em aviões e confinados em prisões estrangeiras sem oportunidade
de reversão se a revisão judicial for ilegalmente negada antes da remoção”. E o
voto prossegue: “A história não é estranha a tais regimes ilícitos, mas o
sistema de leis desta nação foi projetado para impedir, e não viabilizar, a sua
ascensão”.
O próprio Trump confirmou essa intenção: “Se
for um criminoso nacional (americano), para mim não há nenhum problema”, disse
durante o encontro. “Os nacionais são os próximos. Você precisa construir mais
uns cinco lugares”, disse a Bukele, referindo-se às prisões salvadorenhas,
arrancando risos no Salão Oval.
O segundo precedente é o descumprimento de
decisões judiciais, como parte do projeto de Trump de emular não só o Estado
policial de Bukele, mas todo o seu maquinário autocrático: remover juízes,
intimidar adversários políticos, solapar o devido processo legal e
eventualmente os limites de mandatos presidenciais. “A acumulação de todos os
Poderes, Legislativo, Executivo e Judiciário, nas mesmas mãos”, já alertava um
dos Pais Fundadores dos EUA, James Madison, “pode justamente ser designada como
a própria definição de tirania”.
Uma colisão entre o Executivo e a Suprema
Corte parece cada vez mais próxima. As políticas mais caras ao movimento Maga,
das tarifas indiscriminadas à chantagem com os recursos do ensino superior,
passando pelo desmonte da burocracia federal até a deportação de residentes
estrangeiros por crimes de opinião ou mesmo sem qualquer acusação formal,
ameaçam a divisão dos Poderes e direitos fundamentais. Até o momento, a Suprema
Corte tem dado exemplos meritórios de autocontenção para evitar uma crise
constitucional. Mas esse objetivo não pode ser mais importante que impedir a
dilapidação da Constituição.
O caminho para a insolvência
O Estado de S. Paulo
Taxa real de 7% imposta aos títulos da dívida
pública expõe nível de desconfiança no Brasil semelhante ao da crise do governo
Dilma e serve de alerta para o fracasso da política fiscal
Os investidores estão dando ao governo
federal a oportunidade de aferir o nível de desconfiança que ronda a política
fiscal de Lula da Silva. Ao embutirem, desde dezembro de 2024, juros reais – já
descontada a inflação – de mais de 7%, os títulos da dívida pública brasileira
de longo prazo mostram que é alto o descrédito na solvência de um governo
focado no aumento dos gastos e sem margem para elevar ainda mais a arrecadação.
O descontrole impõe um preço muito alto pelo risco de compra dos títulos que financiam
a dívida.
Uma recente reportagem do Estadão mostrou
que há quatro meses esses títulos, com vencimento aproximado de dez anos,
romperam a barreira dos 7% e desde então mantêm taxas semelhantes às que eram
cobradas entre 2015 e 2016, quando o País viveu uma das piores crises de sua
história, que culminou com o impeachment da presidente Dilma Rousseff. Apesar
de o novo marco ter sido atingido em dezembro, desde outubro a taxa vinha
gradativamente se aproximando desse patamar.
A simples equivalência com um período tão
crítico para a economia nacional seria suficiente para disparar sinais de
alerta no governo, diante de um endividamento público de 76% do Produto Interno
Bruto (PIB). Economistas ouvidos na reportagem estimaram que, mesmo que o País
não registrasse déficit nas contas públicas, ainda assim seriam necessários ao
menos 13 anos para estabilizar o patamar de uma dívida tão acentuada.
Mudar esse cenário é uma escolha de governo,
que não aparenta disposição para se afastar da crença lulopetista que vê no
Estado o grande indutor do desenvolvimento nacional. Assim, mesmo em meio a uma
situação fiscal complicada, criam-se programas sem o respectivo aprofundamento
da capacidade orçamentária. Um exemplo é o Pé-de-Meia, que combate a evasão
escolar no ensino médio. O programa tem previsão de custo de R$ 12,5 bilhões
neste ano, mas só teve R$ 1 bilhão incluído no Orçamento de 2025 aprovado pelo Congresso.
Há outros exemplos, como o Auxílio Gás e o próprio Bolsa Família.
Um relatório da Instituição Fiscal
Independente (IFI) do Senado divulgado em fevereiro alertou para o aumento dos
desafios do Tesouro Nacional na gestão da dívida em momentos de aperto
monetário como o atual. A taxa básica de juros de 14,25% – com probabilidade de
chegar a 15% até junho – piora a percepção de risco no controle da dívida,
deixa os títulos mais voláteis e afasta investidores dos papéis destinados ao
financiamento da dívida pública. Além disso, ter uma elevada parcela de títulos
remunerados pela Selic na composição do endividamento faz com que o custo médio
da dívida suba proporcionalmente mais em situações de aperto monetário. E haja
recursos para a rolagem desse endividamento.
Não à toa, o descasamento entre as políticas
monetária e fiscal é hoje um dos principais entraves à economia. A política
monetária busca controlar a inflação, que em março acumulou taxa de 5,48% em 12
meses pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), calculado pelo
IBGE. A expectativa do mercado financeiro, de acordo com o mais recente
relatório Focus, do Banco Central (BC), é de que chegue ao fim de 2025 em
5,65%, isto é, 1,15 ponto porcentual acima do teto permitido. A redução de
gastos pelo governo poderia contribuir para conter a inflação e, por
consequência, afrouxar um pouco a política de juros do BC. Mas o que se vê nas
medidas apadrinhadas por Lula é exatamente o oposto.
O conturbado cenário internacional já traz a
sua cota de incertezas a países emergentes, como o Brasil. Soluções internas
voltadas ao equilíbrio econômico e fiscal – como um efetivo corte de despesas,
desindexação da economia, fiscalização e redimensionamento de programas sociais
– seriam um bom sinal em direção à equalização da dívida e recuperação da
confiança no País. Mas, pelo que mostra o levantamento da venda de títulos pelo
Tesouro, o governo Lula da Silva está a anos-luz dessa meta. Como bem resumiu o
ex-secretário do Tesouro Jeferson Bittencourt, as taxas de juros refletem hoje
a certeza de que o arcabouço fiscal não vai entregar a solvência prometida.
Uma vitória das mulheres
O Estado de S. Paulo
Para Justiça britânica, mulheres trans não
podem ter todos os direitos das mulheres
A Suprema Corte britânica decidiu por
unanimidade que, para efeitos da lei antidiscriminação (Equality Act), os
termos “mulher” e “sexo” se referem a “uma mulher biológica e um sexo
biológico”. Fundamentalistas da ideologia de gênero, para quem qualquer
questionamento ao slogan “mulheres trans são mulheres” é uma “violência”, já
dispararam acusações de “transfobia”. Em antecipação, o vice-presidente da
Corte, Patrick Hodge, advertiu ao anunciar a sentença: “Aconselhamos a não ler
esse julgamento como um triunfo de um ou mais grupos na nossa sociedade à custa
de outro. Não é”. Pessoas transgênero continuam protegidas contra discriminação
por serem transgênero, mas agora as mulheres terão instrumentos legais para
defender suas prerrogativas enquanto mulheres.
O gatilho foi uma decisão do governo escocês
de conceder 50% das vagas em conselhos públicos para mulheres, inicialmente
garantidas a qualquer pessoa que se declarasse mulher. Organizações feministas
recorreram à Justiça, e o governo restringiu a possibilidade a portadores do
Certificado de Reconhecimento de Gênero, um documento obtido mediante um
diagnóstico de disforia de gênero após dois anos de experiência com o novo
gênero. Mas isso significava que, em teoria, um conselho poderia ser formado
por 50% de homens e 50% de “homens vivendo como mulher”. As associações
recorreram de novo e o caso terminou na Suprema Corte.
O problema é que o certificado garante a
mudança de gênero (a identidade social). Mas autoridades estavam esticando (ou
sendo pressionadas a esticar) essa ficção legal como se ela garantisse a
mudança de sexo (a constituição congênita).
Que uma Corte tenha sido obrigada a constatar
que a realidade biológica é inelutável é revelador sobre o obscurantismo de
nosso tempo. Mas quando pessoas são instruídas a normalizar fórmulas exóticas
como “gênero fluido” ou “corpos que menstruam”, há algo de revigorante numa
sentença que afirma que “o conceito de sexo é binário, uma pessoa é ou uma
mulher ou um homem”. Pessoas estavam sendo canceladas, demitidas ou processadas
por dizer o que a Corte está dizendo agora: que mulheres trans são homens, ao
menos biologicamente. Mais do que revigorante, é questão de justiça garantir às
mulheres certas proteções que “necessariamente excluem homens”, mesmo que eles
tenham um pedaço de papel que os declare mulher ou até tenham passado por
cirurgia de mudança de sexo.
Pode uma associação de lésbicas ou de apoio à
amamentação ou de terapia a mulheres vítimas de estupro excluir uma mulher
trans sem o risco de ser recriminada ou criminalizada por transfobia? Agora,
sim. A sentença restaura a possibilidade de provisões exclusivas para mulheres
em banheiros, vestiários, hostels ou serviços médicos. Isso sem falar em
esportes ou prisões femininas. Uma pesquisa no Reino Unido revelou que dois
terços dos prisioneiros trans que se identificam como mulher foram condenados
por ofensas sexuais.
Sem tolher nenhum direito ou proteção das pessoas trans, a decisão da Corte é uma vitória para as mulheres – e para o bom senso.
O significado de Brasília, 65 anos
Correio Braziliense
Celebrar o aniversário de Brasília é
reafirmar o compromisso com o Estado Democrático de Direito. Não se trata
apenas de uma cidade que tem importância política por se tratar de uma capital
federal; trata-se de marco civilizatório
Na fachada do Museu Histórico de Brasília,
esculpida sobre o mármore, lê-se uma das mais célebres frases de Juscelino
Kubitschek sobre a nova capital. "Deste Planalto Central, desta solidão
que em breve se transformará em cérebro das altas decisões nacionais, lanço os
olhos mais uma vez sobre o amanhã do meu país e antevejo esta alvorada, com fé
inquebrantável e uma confiança sem limites no seu grande destino". Era com
esse espírito, genuinamente patriótico, que o então presidente da República, em
1956, dava novo rumo ao país.
O pensamento de JK, gravado em um dos
monumentos que formam a Praça dos Três Poderes, dá a dimensão do significado de
Brasília para a nação. Ao completar 65 anos, a capital de todos os brasileiros
cumpre a missão de enfrentar as grandes questões nacionais — não sem momentos
difíceis. Em praticamente um terço de sua trajetória, Brasília representou o
regime de exceção. Foram 21 anos em que as liberdades civis estiveram
subjugadas por um regime autoritário, com consequências presentes até os dias
de hoje.
Mas Brasília também é palco de conquistas
relevantes. Foi na capital federal que o Brasil se reencontrou com a
democracia, em 15 de março de 1985. E desde então o país vive, há 40 anos e de
forma ininterrupta, em um regime de liberdade política. Em outra contribuição
histórica da nova capital, Brasília foi palco da Constituição Cidadã. Nenhuma
carta constitucional, em todos os tempos, assegurou tantos direitos aos
brasileiros como a que foi elaborada a partir de 1987 e promulgada em 5 de
outubro de 1988. Não se pode, portanto, falar de democracia sem considerar a
fundamental contribuição de Brasília para essa conquista.
Celebrar o aniversário da capital federal é
reafirmar o compromisso com o Estado Democrático de Direito. O sentimento e o
trabalho árduo de homens públicos como JK, Tancredo Neves, José Sarney e
Ulysses Guimarães é que animam o espírito de Brasília. Não se trata apenas de
uma cidade que tem importância política por ser a capital federal; trata-se de
marco civilizatório. É papel intransferível de Brasília trabalhar e dar o
exemplo para que o Brasil se torne mais democrático, mais justo e mais
inclusivo.
Para o todo e sempre, o 21 de abril também
deve ser lembrado como o antídoto para episódios infelizes como o 8 de Janeiro.
Os ataques às instituições da República, na mesma Praça dos Três Poderes onde
está escrita a mensagem de JK mencionada acima, evidenciam uma total
incompreensão do significado de valores como democracia, Estado Democrático de
Direito — e de Brasília. É preciso combater a intolerância e o extremismo. E
Brasília é o palco principal para essas iniciativas.
O caminho para o avanço nacional passa necessariamente por Brasília. Ao completar 65 anos, a capital federal reitera sua vocação de servir o país. Essa missão traz grande responsabilidade. Mas, com a confiança depositada por seu criador, a cidade de todos os brasileiros está preparada para seguir adiante no desafio.
Páscoa: uma confraternização pela paz
O Povo
Neste domingo, celebra-se a maior festa do
cristianismo. É o dia em que Jesus ressuscita dos mortos e, libertando a todos
do pecado, também assegura a vida eterna, pela fé cristã. A partir desse
pensamento, os fiéis são levados a refletir sobre o amor de Deus e o sacrifício
de Cristo por todos. É um momento de renovar a fé dos que creem e de refazer o
compromisso em seguir os passos de Jesus, vivendo de acordo com o que ele
pregou.
Pela tradição católica, a Semana Santa teve
início no Domingo de Ramos, relembrando a chegada triunfal de Jesus a
Jerusalém. Na Sexta-Feira Santa, os cristãos relembram a morte de Jesus na
cruz. Há celebrações, orações e meditações, mas é o único dia do ano litúrgico
em que não há missas nas igrejas católicas. Predominam a reflexão e o silêncio,
com o objetivo de rememorar a crucificação e a morte de Cristo. É dia de jejum
e abstinência.
O Sábado de Aleluia é um dia de espera,
representando o tempo em que Jesus permaneceu no túmulo. O altar das igrejas
fica desnudo e o sacrário está vazio, simbolizando a ausência de Cristo. Há a
Vigília Pascal. Neste Domingo de Páscoa, ou Domingo da Ressurreição, os fiéis
comemoram a vitória sobre a morte e o pecado. Após o luto dos dias anteriores,
ressurge a esperança da nova vida.
Para os fiéis, os rituais têm um caráter
celebrativo e espiritual. Para a população em geral, é uma tradição reunir as
famílias independentemente das crenças de cada um. É uma das festas do ano em
que as comunidades se preparam a fim de confraternizar. É louvável que isso
ocorra diante de tempos tão tensos como os que têm sido vividos nos últimos
anos.
Em meio a disputas polarizadas, muitas das
vezes causadas por conflitos de posicionamentos políticos, assiste-se
constantemente a imbróglios familiares devido a opiniões distintas. Os pontos
de vista divergentes se tornaram inimigos, e não apenas adversários. É
lamentável, pois, que tenha havido esse afastamento entre famílias, amigos e
outras comunidades próximas. Assim, faz-se necessário ajudar a promover um
clima marcado pela não violência a fim de contribuir para a redução da
violência e o estímulo da reflexão crítica e da convivência com o diferente.
A propósito, a Páscoa já era comemorada antes
da época de Cristo. Era o festejo do povo judeu por causa da libertação da
escravidão no Egito, que teria durado cerca de 400 anos. O próprio Jesus,
segundo a Bíblia, participou de celebrações pascais. A partir dele, houve um
novo significado para a festa. A boa-nova anunciada por ele trouxe mais
conforto para o povo se libertar dos sofrimentos à época.
Assim, crendo ou não nos rituais religiosos,
espera-se que os sentimentos de esperança e alegria que nutrem este dia sejam
suficientes para reunir as pessoas queridas em torno do pensamento da
confraternização e da paz universal.
A todos, uma feliz Páscoa!
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