O Estado de S. Paulo
A relação entre Brasil e China: de política e
comércio a inflação; de aviões e soja a quinquilharias
Donald Trump empurrou o mundo para o colo da
China e o desafio do Brasil é calibrar a intensificação da parceria, não apenas
no comércio, que é óbvia, mas também na política, que é consequência. As
exportações para a China vão crescer, mas as importações também tendem a
disparar. O risco para os consumidores/eleitores brasileiros é aumento de
preços, já excessivos. E, para a indústria, competição desleal.
A China ultrapassou os Estados Unidos como principal parceiro comercial do Brasil ainda nos primeiros governos Lula, com um detalhe que vai muito além do detalhe: o Brasil é superavitário nas relações com a China e deficitário com os EUA, o que deve ficar ainda mais estridente a partir da guerra insana, irresponsável e inconsequente de Trump contra tudo e todos. A diferença: os EUA estão reféns de Trump, impetuoso e personalista, e a China é estratégica, tem rumo e determinação.
As conversas e negociações entre Brasil e
China ocorrem em várias frentes, a partir da agricultura, passando por aço,
alumínio, aviões, chegando a meio ambiente e desaguando na cúpula dos Brics, em
julho, no Rio, que ganhou uma importância imensa após o tarifaço. Destaque para
a substituição do dólar como moeda internacional.
Um trunfo do Brasil é a previsão de safra
recorde em 2025, mais de 10% acima de 2024 e focada em arroz, feijão, milho e a
soja, a joia dessa coroa, com 13% a mais que no ano anterior. Como os EUA devem
deixar de ser os maiores fornecedores de soja para a China, é natural o Brasil
ocupar boa parte desse vácuo, entre tantos outros. A população chinesa tem em
torno de 1,5 bilhão de bocas, que precisam de alimentos e de soja para a
pecuária. Como nem tudo são flores, há problemas. Se as exportações dispararem,
podem comprometer a oferta doméstica, com mais inflação justamente de alimentos
e reflexos sociais, econômicos e até políticos. Os preços da comida na mesa são
dramáticos nos lares, nos juros e na perda de popularidade de Lula, a um ano e
meio das eleições.
O segundo problema grave é a enxurrada de
produtos chineses, desde aqueles de alto valor até quinquilharias, o que pode
sufocar setores da indústria brasileira que geram riqueza, empregos e renda,
num processo que vem de décadas e impactou diretamente o setor têxtil, por
exemplo.
Essas preocupações não são só do Brasil, mas
do mundo todo, espremido entre o “imperialismo” dos EUA e da China e obrigado a
calibrar o que é e o que não é bom para os interesses nacionais. Trump trocou o
multilateralismo não por "America first", mas por “Me first”, que
passou a valer para todos. Salve-se quem puder!
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