Por Tiago Angelo e Beatriz Roscoe / Valor Econômico
Ministro lembrou que regra prevê perda automática de mandato em condenações transitadas em julgado, caso da deputada
O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo
Tribunal Federal (STF), anulou na quinta-feira (11) a decisão da Câmara que
manteve o mandato da deputada Carla
Zambelli (PL-SP). Ele decretou a cassação imediata da
parlamentar e determinou que Hugo
Motta (Republicanos-PB), presidente da Casa Legislativa,
efetive no prazo máximo de 48 horas a posse do suplente da parlamentar. Adilson Barroso (PL-SP) deve
assumir o posto.
A deputada está presa na Itália aguardando o desfecho de um processo de extradição. Ela foi condenada pelo Supremo a dez anos de prisão por invadir os sistemas do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Moraes já havia determinado a cassação da parlamentar, mas a Câmara decidiu na quarta-feira (10) manter o mandato de Zambelli.
Flávio Dino, presidente da Primeira Turma do
Supremo, marcou uma sessão extraordinária para esta sexta-feira (12). Nela, os
integrantes do colegiado decidirão se mantém ou não a perda do mandato. Também
integram o colegiado Cristiano Zanin e Cármen Lúcia.
Moraes afirmou na decisão que desde o caso do
Mensalão, de 2012, o Supremo entende pela perda automática do mandato
parlamentar em condenações criminais transitadas em julgado (quando não cabem
mais recursos), em razão da impossibilidade de o parlamentar seguir atuando
regularmente.
“Nesse exato sentido, a Primeira Turma deste
Supremo decretou a perda do mandato parlamentar determinando, após o trânsito
em julgado, a comunicação para a Mesa da Câmara dos Deputados”, disse o
ministro em trecho da decisão.
Ainda segundo ele, nos casos de condenação
com trânsito em julgado, cabe ao Judiciário determinar a perda do mandato. Já o
Legislativo, prossegue, deve apenas editar ato administrativo cumprindo a ordem
dada pelo Supremo.
“É o Poder Judiciário quem determina a perda
do mandato parlamentar de condenado criminalmente com trânsito em julgado,
cabendo à Mesa da Câmara tão somente declarar a perda do mandato, ou seja,
editar ato administrativo vinculado.”
Para Moraes, a deliberação da Câmara rejeitou
a perda do mandato parlamentar ocorreu em “clara violação” da Constituição.
“Trata-se de ato nulo, por evidente inconstitucionalidade, presentes tanto o
desrespeito aos princípios da legalidade, moralidade e impessoalidade, quanto
flagrante desvio de finalidade.”
Zambelli foi condenada em maio por invasão a
sistemas do CNJ. Segundo a decisão, ela atuou para incluir um falso mandado de
prisão contra Moraes e um alvará de soltura em favor de um líder do Comando
Vermelho. Para isso, foram utilizadas credenciais falsificadas de servidores do
órgão.
Apesar da condenação com trânsito em julgado
e o fato de Zambelli não exercer suas funções por estar presa, a Câmara decidiu
na quarta manter o mandato. O placar foi de 227 a 179 pela cassação. O
resultado, no entanto, não chegou aos 257 votos que seriam necessários para
determinar a perda de mandato.
Deputados de várias tendências ideológicas,
no entanto, argumentaram que o comando constitucional é claro quando aponta a
perda automática de mandato no caso de condenação criminal com trânsito em
julgado. Eles também alegaram que o fato de a deputada estar ausente e fora do
país a impede de exercer o mandato plenamente. Ainda assim, não foi possível
atingir a maioria.
Em sua sustentação oral, a defesa de Zambelli
lembrou que há cerca de cem processos contra parlamentares no Supremo, o que
abriria um “precedente perigoso” para deputados.
A tendência é que Moraes decida de forma
semelhante no caso do deputado Alexandre Ramagem (PL-RJ). A Primeira Turma do
Supremo determinou a perda do mandato no mês passado, quando decretou o
trânsito em julgado da condenação do parlamentar na ação da trama golpista.
Ramagem foi condenado a 16 anos de prisão.
Ele integra, junto com o ex-presidente Jair Bolsonaro, o chamado “núcleo
crucial” da trama golpista. Apesar da ordem do STF, a Câmara ainda não analisou
a cassação.
Na Câmara, como era de se esperar, o líder do
PT, deputado Lindbergh Farias (RJ), comemorou a decisão, enquanto o líder do
PL, Sóstenes Cavalcante (RJ), chamou Moraes de “ditador psicopata”.
Para o petista, o ministro “restabeleceu a
autoridade da Corte”. Ele ressaltou ainda que o plenário “não pode rever,
relativizar ou descumprir efeito automático decorrente de condenação criminal”.
Esse não foi o entendimento do deputado do
PL. “O ditador psicopata que hoje manda nos três Poderes voltou a atacar.
Quando um ministro anula a decisão soberana da Câmara e derruba o voto popular,
isso deixa de ser Justiça e vira abuso absoluto de poder”, declarou Sóstenes.
O Valor entrou em contato com a Câmara e com a defesa de Zambelli. Não houve resposta até o fechamento desta reportagem.

Nenhum comentário:
Postar um comentário