Correio Braziliense
É inadiável a criação de um código de conduta
para o STF. Porém, não me parece que devamos nos limitar a qualquer documento
que venha a ser construído exclusivamente pelos magistrados
"Não poderia, nessa direção, deixar de fazer referência à proposta, ainda em gestação, de debatermos um conjunto de diretrizes éticas para a magistratura. Considerando o corpo expressivo que vem espontaneamente tomando o tema no debate público, dirijo-me à eminente ministra e aos eminentes ministros e, também, à sociedade brasileira para dizer que o diálogo será o compasso desse debate. O país precisa de paz — e o Judiciário tem o dever de semear paz."
As palavras acima foram ditas pelo presidente
do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Edson Fachin, na sessão de
encerramento do ano judiciário, em 19 de dezembro. Eu as reproduzo aqui porque,
apesar da grande e positiva repercussão na mídia em geral, a página inicial do
sítio do Supremo optou por não as destacar no resumo do pronunciamento. Essa
decisão certamente atendeu ao espírito de parte da Corte que, publicamente ou
não, vem torpedeando a iniciativa.
Ministros como Dias Toffoli não se
constrangem em pegar carona num jatinho do dono do Banco Master para assistir à
final da Libertadores, em 29 de novembro, em Lima. Não bastasse isso, em 3 de
dezembro, avocou o processo para o Supremo, atendendo petição da defesa do empresário,
além de suspender as investigações e decretar sigilo absoluto.
Outro useiro e vezeiro em menosprezar
qualquer proposta de um código de conduta é o ministro Gilmar Mendes. Nesta
semana, em conversa com jornalistas, criticou os dois principais eixos do
código de conduta alemão que limitam a participação de magistrados em eventos
privados e declarações públicas.
Não bastasse esses maus exemplos, em 9 de
dezembro a jornalista Malu Gaspar, de O Globo, publicou em sua coluna que a
esposa do ministro Alexandre de Moraes teria firmado um contrato para atuar na
defesa do Banco Master com valores milionários, muito acima dos praticados no
mercado. E, na segunda-feira passada, dia 22, a jornalista trouxe a público que
Moraes teria procurado o presidente do Banco Central, Gabriel Galípolo, em
quatro ocasiões para tratar de assuntos referentes ao Banco Master.
A denúncia caiu como uma bomba, e, quase 24
horas depois, o gabinete do ministro divulgou uma nota oficial em que não toca
no assunto, preferindo afirmar que os contatos foram para tratar dos problemas
advindos da então aplicação da Lei Magnitsky contra ele e sua família. Causa
espécie que, sendo ele uma pessoa que se notabilizou por posicionamentos sempre
claros, objetivos e duros, tenha passado ao largo do assunto.
A verdade é que tais acontecimentos
demonstram ser inadiável a criação de um código de conduta. Porém, não me
parece que devamos nos limitar a qualquer documento que venha a ser construído
exclusivamente pelos magistrados. Nesse sentido, destaco três propostas
recentes. A primeira, elaborada pela Fundação FHC, intitulada A
responsabilidade pela última palavra e entregue ao presidente do STF em
outubro. A segunda, o abaixo assinado Por um código de conduta no STF Já!, que
está circulando nas redes e coletou milhares de apoiamentos. A terceira, o
Projeto de Lei 6540/2025, apresentado pela bancada federal da federação
PSOL/REDE.
Devemos aproveitar essa oportunidade para
avançarmos em mudanças estruturais no processo de funcionamento das Cortes
Superiores. Uma delas seria a discussão para adotarmos o mandato fixo de
ministros, a exemplo do que ocorre em países democráticos como Alemanha,
Espanha, França, Itália e Portugal. No primeiro dessa lista, o mandato é de 12
anos, e, nos outros quatro, é de nove anos. Essa ideia é defendida publicamente
pelo ex-presidente do Senado Federal Rodrigo Pacheco e por Luís Roberto
Barroso, ex-ministro do STF.
Outra seria a limitação de decisões
monocráticas aos casos de urgência. No balanço apresentado por Fachin na sessão
do dia 19 último, o Supremo, em 2025, proferiu 116.170 decisões das quais
apenas 19,5% foram de forma colegiada, numa clara deformação em oposição ao
fortalecimento da colegialidade e da deliberação plural defendidas pelo
presidente do Supremo.
Apesar do debate se concentrar nas Cortes
Superiores, as mudanças precisam alcançar o conjunto do Poder Judiciário.
Enquanto os outros dois Poderes são objeto de diversas formas de controle
social, sendo o voto o mais relevante, o Judiciário continua uma verdadeira
caixa preta, em que corporativismo, favorecimento e corrupção têm campeado,
como comprovado nas diversas denúncias feitas pela imprensa nos últimos 40
anos.
O que se espera de homens e mulheres no
exercício da função e de cargos públicos é a adoção da máxima À mulher de César
não basta ser honesta, deve parecer honesta.

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