- O Globo
Presidente do TSE diz que crime já atua na política, e financiamento restrito pode abrir caminho para um laranjal nas campanhas
Qual o maior risco de interferência do crime nas próximas eleições?
Nós acabamos com o sistema de financiamento (empresarial) descolado do sistema eleitoral. O ideal era que tivéssemos feito ajustes no sistema eleitoral, porque aí poderíamos adequar melhor o financiamento. Certamente, teremos um número elevado de candidatos, porque as coligações estão mantidas, e aí entra a questão do financiamento. Eu temo muito pelo financiamento das eleições por organizações as mais diversas, inclusive as criminosas. Já temos casos de países em que o crime financia as eleições, como o México. No Rio, temos o problema do tráfico, das milícias, que é notório. Para colocarmos urnas nas favelas precisamos de blindados da Marinha. Portanto, a liberdade do voto está fortemente ameaçada. Em São Paulo, já se fala que o PCC elegeu vereadores na Câmara da capital. No Amazonas, a calha do (rio) Solimões vem sendo utilizada pelos traficantes e se diz que algumas prefeituras foram tomadas por eles. No Maranhão, nós acompanhamos a situação de agiotas financiando as eleições, com dinheiro que viria do PCC. Tudo isso é preocupante e não podemos querer que o quadro da política no Brasil, que já não é exemplar, se torne ainda pior.
Nesse cenário, a aprovação do fundo eleitoral público é boa ou ruim?
Eu torci pela aprovação do fundo, porque pelo menos temos um elemento institucional. O problema é que esse fundo é insuficiente para financiar as eleições, e continuamos dependendo das doações privadas. E é nesse caso de pessoas físicas que temos quadro de instabilidade. Das 730 mil doações feitas em 2016, em 300 mil pelo menos, indicou a Receita, havia problemas, sobretudo de capacidade financeira. É o que eu chamo de caça ao CPF, e isso pode alimentar o laranjal. É aí que entra o crime organizado.
Hoje o crime já está mesmo na política?
Acho que sim. Eu diria que não podemos ser ingênuos. A situação praticamente de domínio de certos territórios, como ocorre no Rio de Janeiro, não permite um voto livre, uma campanha livre, e, certamente, já há representantes de facções nos parlamentos municipais e quiçá até alguma identidade no plano federal. Temos que monitorar esse quadro, porque esse é o pior dos mundos. Temos que ter cuidado com o desenvolvimento disso e, por este motivo, dei atenção aos desdobramentos que tivemos no Rio e passei para as altas autoridades de segurança. É óbvio que a liberdade do eleitor está comprometida.
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