segunda-feira, 13 de novembro de 2023

Paulo Corrêa - A erosão do presidencialismo de coalizão

Valor Econômico

Novo ímpeto do Parlamento busca a ascensão sobre funções como alterar metas, objetivos e decisões alocativas de programações orçamentárias

É exponencial o avanço de PECs (Propostas de Emenda à Constituição) expandindo o modelo impositivo do Orçamento federal. Entre as mais expressivas estão a que extingue o orçamento de bancada estadual e turbina o montante para as emendas individuais e que torna mandatório o pagamento de emendas de comissões (PL 46/2023). Este movimento também é acompanhado pelos membros das assembleias legislativas. Mas quais são as consequências da célere progressão do orçamento impositivo sobre o presidencialismo de coalizão?

Este instante de “hiperimpositividade” tem como foco intervenções administrativas no processo de execução das despesas públicas, com sinais evidentes de conflito entre poderes da República. A principal evidência dessa ambição dos congressistas, em meio à tramitação da LDO, é a inserção de um dispositivo estabelecendo um cronograma rígido para o pagamento de emendas individuais. Seja no Congresso Nacional ou nas casas legislativas estaduais, esse comportamento é sistêmico, com reflexo direto na formação de maiorias governativas.

Logo, cabe questionar se há um futuro seguro para o presidencialismo de coalizão diante do novo instante de “hiperimpositividade” no ciclo orçamentário nacional. Com o irreversível processo de superapropriação do Orçamento federal e a capacidade de ascender sobre estatais e bancos públicos, a elite parlamentar desenha um parlamentarismo casuístico, porém, sem responsabilizações constitucionais de um novo regime constitucional no qual o governo eleito deve responsividade democrática à coletividade.

Na “hiperimpositividade”, a elite parlamentar redireciona dotações orçamentárias visando benefícios privados (bases eleitorais), sem vinculação com programações orçamentárias estruturantes ou políticas públicas. Esse arranjo de ocasião induz a incertezas sobre a efetivação de políticas públicas reveladas pelas preferências populares no processo eleitoral.

Chegamos a este instante devido ao grau de fragmentação partidária. O custo transacional para a votação de pautas de interesse do governo tem-se moldado em acordos particulares devido à incapacidade de estabelecer uma aliança partidária imune a defecções ou meramente consistentes. Logo, é possível vislumbrar um quadro de esgotamento de incentivos ao Legislativo em virtude da perda de tração do Executivo.

Outra razão é o pleno domínio da elite parlamentar sobre o processo orçamentário. A elaboração e aprovação de dispositivos constitucionais referendando o orçamento impositivo tem exaurido o modelo autorizativo e retirado competências exclusivas do Poder Executivo.

Para operacionalizar o design da “hiperimpositividade”, as lideranças legislativas têm explorado prerrogativas que permitem alterar a Constituição. O marco inaugural da superapropriação orçamentária é a Emenda Constitucional 86, de 2015, que deu origem à impositividade em razão da baixa execução orçamentária e financeira das emendas individuais por parte do Poder Executivo. A ascensão decorre da EC 105, de 2019, a qual originou as transferências especiais (“emendas pix”) e seus desdobramentos no “accountability” vertical, horizontal e governança orçamentária.

Mas agora o novo ímpeto do Parlamento tem como propósito a ascensão sobre funções administrativas, como alterar metas, objetivos e decisões alocativas de programações orçamentárias em desacordo com o dever constitucional de fiscalizar as contas nacionais. Este assenhoramento de competência, inclusive, já está destacado na lei orçamentária. Os autores de emendas detêm o poder de fazer escolhas de beneficiários e realocar valores de programações orçamentárias.

Mas a ambição dos legisladores vai além. Veja que a governadora de Pernambuco vetou, em outubro, o parecer aprovado na Comissão de Finanças da Assembleia Legislativa que obrigaria o pagamento na íntegra do montante das transferências especiais estaduais até junho de 2024. Por sua vez, em setembro, em meio ao debate orçamentário, o presidente da Câmara dos Deputados manifestou em entrevista a possibilidade da criação de mais um tipo de repasse: a emenda de liderança. A inventividade em relação a novas formas de emendamento, conectadas ao movimento de “hiperimpositividade”, está materializada em proposituras legislativas. Vejamos a seguir.

Uma delas sugere a extinção de emendas de bancadas, com redirecionamento do montante financeiro bilionário à cota parlamentar de emenda individual. Outros dois deputados idealizaram a modalidade de transferências especiais para bancadas. Todas ainda buscam assinaturas suficientes para tramitar no Congresso. Diferentemente da PEC 44, de 2023, que obteve a adesão de um terço dos membros de uma das duas Casas Legislativas ao propor a reserva de 5% das emendas individuais para atender emergências naturais.

Tamanha liberalidade em formas de emendamento ao OGU (Orçamento Geral da União) produz incertezas anuais. Um prejuízo para a governança orçamentária e aprofunda a disfuncionalidade do presidencialismo de coalizão. Embora seja uma atribuição do Parlamento, a multiplicidade de formas de emendamento do Orçamento federal parece afastar a previsibilidade e induzir questionamentos sobre a eficiência alocativa das propostas.

Um risco para o alcance de um dos objetivos fundamentais da República: a redução das desigualdades regionais e sociais. Vale ressaltar o papel essencial das emendas individuais nesse mandamento constitucional, tendo em vista a incapacidade plena da União em compreender as necessidades locais de investimentos públicos em todos os entes da federação. Somados às disputas já existentes, novos conflitos entre os poderes podem levar à exaustão do regime constitucional vigente. Isso não é bom ou ruim, é apenas uma hipótese diante da superfragmentação partidária. Se atingirmos o estágio de “hiperimpositividade”, o Executivo seria forçado a produzir uma coalizão personalíssima, deteriorando assim a capacidade estruturante das lideranças parlamentares de orientar votações em pautas convergentes com o governo.

Outro efeito indesejado seria o avanço mais incisivo sobre programas discricionários em companhias públicas, como aconteceu com o remanejamento de recursos do Ministério da Agricultura para a Codevasf e, mais recentemente, na troca de comando da Caixa e a correlação direta com a votação na Câmara dos Deputados da taxação do projeto de lei que prevê a tributação de investimentos de pessoas físicas no exterior e a antecipação de imposto em fundos fechados no Brasil.

Com o presidencialismo de coalizão exaurido pela “hiperimpositividade”, o caminho para o sistema parlamentarista ou semipresidencialista está sedimentado, ou outros poderes podem frear essa mobilização?

 

4 comentários:

EdsonLuiz disse...

Com os deputados, senadores e presidentes da república que temos elegido, fica tudo bem igual::
■Fisiologia ;
■Aristocratismo ;
■Gastança ;
■Demagogia ;
■Violência ;
■....

Não se espere de presidentes da república demagogos e fisiológicos o combate à violência. E se o presidente for um miliciano, espere menos ainda!

Um presidente precisa exercer a ascendência que o cargo lhe dá sobre as forças policiais, inclusive sobre as forças armadas, e prover segurança à população e ao país, mostrando a presença efetiva do Estado no controle do território.

Um presidente precisa ter uma política de saúde que cuide e proteja a população.

Um presidente precisa ter uma política educacional que eduque e dê formação profissional.

Um presidente precisa mostrar que é responsável com o dinheiro público, tanto no que gasta e na forma como gasta o dinheiro quanto em como arrecada, para não fazer extorção contra a sociedade e pegar uma montanha de dinheiro do brasileiro para fazer festa eleitoral junto com gente como Arthur Lira.

A autoridade para um presidente exercer sua ascendência é derivada da lei e não da pessoa que estiver investida do mandato. Mas quem exerce mandato tem que conseguir ser respeitado pelo corpo técnico-burocratico do Estado e pelos agentes públicos, policiais, auditores fiscais, professores, médicos, etc

■Qual funcionário público vai respeitar o corrupto Lula?
■Com que moral Lula vai conseguir exercer autoridade sobre um policial ou sobre um auditor fiscal?

■Qual funcionário público vai respeitar o miliciano Bolsonaro?
■Com que moral Bolsonaro vai conseguir exercer autoridade sobre um médico ou professor?

■Lula e Bolsonaro o que fazem é curriola e farra de dinheiro público com Arthur Lira, Odebrecht, Joeslei Batista...
■ Lula e Bolsonaro, o PT e o PT e os blogues sujos que os apoiam o que fazem é curriola na POLÍTICA internacional com gente como Vladimir Putin, Donald Tramp, Xi Jiping, ameaçando e fragilizando a democracia.

■Que respeito e autoridade vai ter um CORRUPTO e um MILICIANO, os dois demagogos e gastadores irresponsáveis?
■Como se dará a composição dos legislativos em um país cujos líderes são Lula e Bolsonaro e o ativista político tem sua mentalidade formatada por um modelo de cognição deplorável como o que o colunista Helio Schwasterman difundiu ontem em uma coluna publicada aqui, modelo cognitivo que substitui o uso da racionalidade humana e cuja primeira consequência é denominar o ativista político como "militante" e transformar o exercício da política em uma atividade policial irregular e paralela?

EdsonLuiz disse...

Temos que adotar o Parlamentarismo para que a politica não tenha "pais" protetores dos próprios interesses e dos interesses de suas "famílias" ampliadas.

Temos que adotar o Parlamentarismo para que o eleitor passe a ter responsabilidade na escolha do político e para que o político seja responsabilizado pelas suas decisões, inclusive pela decisão de alocação e avaliação dos Gastos.

EdsonLuiz disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
EdsonLuiz disse...

■Já deveria estar mais do que claro que ao deixar o país por conta de gente como Lula, Bolsonaro, Arthur Lira e Renan Calheiros nós só vamos cavar mais o buraco em que estamos.

A economia do Brasil encalhou desde 1982. Mas de 2007 para cá estamos andando para trás e pouco damos conta do retrocesso por estamos sendo enganados pela expansão de gastos que Lula e Bolsonaro fazem fora dos fundamentos da nossa economia.
■■No momento em que Lula, Dilma e Bolsonaro fazem a farra de gastos eles criam a fantasia de que tudo está ficando bem e seus apoiadores batem bumbo para comemorar.
▪Um pouco depois o país desaba mais um pouquinho.

●Temos que substituir o conluio de Lula e Bolsonaro com carreirista e oportunistas do parlamento, deputados de todos os partidos mas principalmente do PP, PMDB, PT, PL e PSD por um parlamentarismo em que eleitores e eleitos assumam suas responsabilidades.