As defesas dos réus buscam falhas nas acusações formu¬ladas pela Procuradoria-Geral da República para conse¬guir adiar a decisão do STF. A estratégia é fazer de tudo pa¬ra que a análise e o veredito dos ministros sejam anun¬ciados só depois das eleições municipais em outubro.
Advogados orquestram atraso no julgamento
Defesas articulam questões de ordem contestando brechas na acusação dos réus formulada pela Procuradoria-Geral da República. A intenção é empurrar a análise do caso para depois das eleições municipais de outubro
Josie Jeronimo
Advogados de defesa dos réus do mensalão elaboram uma estratégia orquestrada para atrasar a fase inicial do julgamento. Além do risco de anunciar a troca de defensores em cima da hora, como mostrou ontem o Correio, os representantes dos acusados vão levantar questões processuais logo após a leitura do relatório do ministro Joaquim Barbosa, etapa que antecede a sustentação oral dos advogados, para tumultuar o cronograma dos trabalhos. A defesa do empresário Marcos Valério já tem pronta sua estratégia: o advogado Marcelo Leonardo informou que apresentará questão de ordem contestando a competência do Supremo Tribunal Federal (STF) para julgar Valério, pois ele não tem foro privilegiado e a análise da ação penal pela corte cercearia seu direito constitucional ao duplo grau de jurisdição, caso seja condenado. "Três réus alegaram a incompetência do Supremo Tribunal Federal. O Supremo vai ter que examinar essa questão, colocada também pelas defesas de José Genoino e José Roberto Salgado. Se não for examinada após a leitura do relatório, será apresentada na forma de questão de ordem", afirma Marcelo Leonardo, advogado de Valério.
Representantes dos réus e ministros da corte ouvidos pelo Correio afirmam que a estratégia de orquestração entre os advogados de defesa dos réus sem foro privilegiado é dada como certa no julgamento do mensalão. Levantando questões de ordem e elementos processuais, os defensores esperam forçar manifestações individuais dos ministros, debate que pode se estender por todo o primeiro dia de julgamento, atrasando a sustentação da acusação do procurador-geral da República, Roberto Gurgel. Com o artifício, os advogados de defesa apostam que uma discordância irreconciliável entre os ministros sobre a questão de ordem apresentada force o pedido de vista de algum dos 11 magistrados, adiando o julgamento por tempo indeterminado.
Na prática, a questão de ordem questionando a competência do Supremo em julgar réus sem foro privilegiado tem o mesmo efeito da petição apresentada pelo advogado Márcio Thomaz Bastos solicitando o desmembramento do processo. O advogado de Marcos Valério afirma, no entanto, que quando a corte rejeitou a petição analisou o pedido somente do ponto de vista processual. "Não foi avaliado na Constituição. Nós temos precedentes de todos os ministros (sobre o duplo grau de jurisdição). Foi formulado o pedido de desmembramento, colocado fora do plano da Constituição."
Caixa dois
Supostas falhas na denúncia do Ministério Público serão usadas pela defesa de Marcos Valério para "derrubar" elementos da acusação. Limitações no texto que aborda o crime de lavagem de dinheiro na peça do Ministério Público se tornaram trunfos nas mãos dos advogados do empresário para aliviar a pena de Valério em caso de condenação. De acordo com Marcelo Leonardo, a tese de lavagem de dinheiro não se sustentará no decorrer do julgamento por erro da denúncia do MP. Segundo o advogado do empresário, a peça não estabelece qual é o "crime antecedente".
Até maio deste ano, as leis estabeleciam que a caracterização do crime de lavagem de dinheiro ocorreria após um primeiro julgamento apontando o dinheiro em questão como oriundo de fontes ilegais. "A lei estabelece quais são os crimes antecedentes, de onde viria o dinheiro. A lavagem teria que ter a operação de ocultação do dinheiro e indicar os recursos voltando depois à economia formal", alega o advogado.
Um magistrado ouvido pelo Correio corroborou a argumentação do advogado de Valério. "É muito difícil você ter uma lavagem se o Ministério Público não indicar o crime antecedente. No caso da Ação Penal nº 470, o crime antecedente está sendo julgado com o crime de lavagem." Assim, o advogado avalia que o empresário poderia receber condenação apenas por crime eleitoral. "O que nós entendemos que aconteceu foi o caixa dois de campanha."
Nós temos precedentes de todos os ministros (sobre o duplo grau de jurisdição). Foi formulado o pedido de desmembramento, colocado fora do plano da Constituição"
Três réus alegaram a incompetência do STF. O Supremo vai ter que examinar essa questão, colocada também pelas defesas de José Genoino e José Roberto Salgado" Marcelo Leonardo, advogado de Marcos Valério
Toffoli mantém suspense
A cinco dias do começo do julgamento, o ministro Dias Toffoli ainda não anunciou se participará da análise do caso. Ele tem manifestado a pessoas próximas que pretende julgar o mensalão, mas sofre pressões para se declarar suspeito ou impedido, por ter sido advogado do PT, assessor da Casa Civil durante a gestão de José Dirceu — um dos réus do processo — e, ainda, por ser companheiro da advogada Roberta Rangel, que atuou na defesa de um dos réus do mensalão.
A estratégia é protelar
Táticas de protelação miram brechas na denúncia da Procuradoria-Geral da República
Questões de ordem
Logo após o ministro Joaquim Barbosa fazer a leitura do relatório, advogados de defesa podem apresentar questões de ordem levando o presidente da sessão, ministro Ayres Britto, a decidir sobre a colocação dos representantes dos réus. A questão de ordem pode ser discutida por todos os ministros, atrasando a sustentação da acusação do procurador-geral da República, Roberto Gurgel.
Falhas processuais
No momento da sustentação oral, os advogados de defesa poderão apontar "falhas" na tramitação do processo, alegando que o direito de defesa foi cerceado por falta de inclusão de informações que consideram relevantes, como relatórios financeiros e relato de testemunhas.
Lavagem de dinheiro
A defesa enxerga falhas na denúncia em relação à tipificação do crime de lavagem de dinheiro. Segundo os defensores, a acusação não aponta o "crime antecedente", elemento jurídico indispensável ao conceito de crime de lavagem de dinheiro até maio deste ano, quando a legislação foi alterada.
Corrupção passiva
Réu do mensalão que não tinha cargo público foi denunciado por corrupção passiva, o que constituiria uma falha, de acordo com a defesa.
Origem do dinheiro
Defensores dos réus apontam brechas em relação à definição da origem dos recursos que abasteciam o suposto esquema do mensalão. Os advogados reforçarão que a maioria do dinheiro apontado na denúncia é de empresas privadas.
Origem dos recursos
Fragilidade das investigações sobre o esquema do mensalão, a blindagem política da CPI criada para apurar as denúncias de cooptação de parlamentares, e a centralização do processo no Supremo Tribunal Federal (STF) podem favorecer a defesa dos 38 réus que serão julgados a partir de quinta-feira. Brechas na acusação, que não conseguiu comprovar todos os pontos da origem do dinheiro, acendem entre os defensores a esperança de derrubar a tese de que o esquema foi abastecido por recursos públicos.
Entre os pontos cegos que os advogados dos réus comemoram está a ausência de provas envolvendo transações diretas entre o Banco do Brasil e empresas comandadas por réus da ação penal e a predominância de bancos privados no cerne do suposto esquema. A decisão do Tribunal de Contas da União (TCU) que considerou regular um contrato entre a agência DNA Propaganda e o Banco do Brasil, que teria rendido R$ 4,4 milhões a Marcos Valério em descontos obtidos com fornecedores, também pesa na sustentação de ausência de dinheiro público no esquema. O Ministério Público apresentou recurso da decisão do TCU.
Outra fragilidade a ser explorada pelos advogados é a caracterização de crime de formação de quadrilha em relação ao chamado "núcleo político" do mensalão. O conceito de formação de quadrilha é alcançado quando pelo menos quatro acusados admitem ter agido em conjunto buscando uma mesma finalidade ou a denúncia apresenta provas dessa atuação. No caso do núcleo financeiro, informações de movimentação de recursos podem atestar que alguns dos réus agiram em grupo, mas, em relação ao núcleo político, a confirmação carece de elementos mais sólidos, alegam advogados de defesa.
FONTE: CORREIO BRAZILIENSE
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