Wilson Tosta
RIO - A menos de quatro meses de renunciar ao cargo para, ao que tudo indica, disputar o Senado pelo Rio, Sérgio Cabral (PMDB) vive um paradoxo raro no mundo político: comanda o Estado que mais investe no País e é, ao mesmo tempo, um dos governadores mais mal avaliados - ocupa a quarta pior posição entre os 27 chefes de Executivo estaduais.
O Rio investiu R$ 14,4 bilhões de janeiro de 2011 a novembro de 2013 - aumento de 330% sobre o que foi investido em igual período no primeiro mandato de Cabral. No entanto, a última pesquisa CNI/Ibope lhe deu 18% de avaliação positiva (ótima e boa), contra 47% de negativa (ruim e péssima). Nunca antes rivais diretos, entre eles o antigo aliado PT, com o senador Lindbergh Farias, tiveram diante de si, a um ano antes da eleição, um quadro tão favorável para chegar ao Palácio do Guanabara.
"Estruturalmente, o Rio melhorou. E deveríamos esperar que Sérgio Cabral se beneficiasse disso, e também seu candidato à sucessão, Luiz Fernando Pezão. Não é o que está acontecendo", afirma o cientista político Octavio Amorim Neto, da Fundação Getúlio Vargas - para quem Cabral é "o melhor governador (do Rio e Janeiro) desde a redemocratização em 1983".
Amorim Neto faz um paralelo entre as situações de Cabral, do governador Geraldo Alckmin (PSDB) e dos prefeitos do Rio, Eduardo Paes (PMDB), e de São Paulo, Fernando Haddad (PT): todos foram atingidos pelos protestos de junho, causados pela deterioração da qualidade de vida nos grandes centros. No caso do governador do Rio, porém, a sucessão de escândalos iniciada com a divulgação de fotos de uma viagem a Paris e que teve episódios como o uso de um helicóptero do Estado para ir à sua casa de verão em Mangaratiba e a proximidade com o empreiteiro Fernando Cavendish maximizaram o efeito das manifestações. "Isso levou a uma irritação muito grande da população", diz o pesquisador.
Aliança. Essas más notícias para Cabral deixaram em segundo plano um feito político importante do governador: ele conseguiu articular com o Palácio do Planalto uma aliança que viabilizou os investimentos no Estado. Na direção oposta de antecessores como Leonel Brizola ou Anthony Garotinho, Cabral não mostrou intenção de desafiar o governo federal apresentando-se à disputa da sucessão presidencial. Ainda em 2006 ele abdicou dessa pretensão e preferiu aliar-se ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que iniciava seu segundo mandato.
Esse gesto repercute até hoje a aliança abriu caminho para grandes investimentos no Estado. O pacote de obras hoje em andamento no Estado é majoritariamente financiado com recursos da União (via convênios) e do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Levantamento do Estado aponta que perto de 1/4 do dinheiro investido sai dos cofres estaduais.
São obras como o Arco Metropolitano, alça rodoviária projetada para desviar o tráfego de veículos que passam pela cidade do Rio de Janeiro, com custo estimado em R$ 1,6 bilhão. Outro projeto relevante é a Linha 4 do Metrô (Ipanema/Jardim Oceânico), por R$ 8,5 bilhões, que deve estar pronta para os Jogos Olímpicos de 2016. Um terceiro, as cerca de 3.500 casas populares, ao custo de R$ 124,2 milhões. O Estado também começará a receber em abril 60 novas composições chinesas, com ar refrigerado e capacidade para quase 600 mil passageiros. Junto ao Maracanã será construída uma estação multimodal, com cinco plataformas para trens e metrô.
Demora. O que pode explicar a baixa popularidade, na avaliação do cientista político Geraldo Tadeu Monteiro, "é que muitos desses investimentos não têm resultado até agora". Diretor do Instituto Universitário de Pesquisas do Estado do Rio de Janeiro (Iuperj), Geraldo Tadeu lembra obras "que se arrastam há anos", como a do Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro. "Outras só terão impacto em 2014 ou em 2016. Em parte isso explicaria essa contradição entre o alto investimento e a baixa popularidade. E há problemas persistentes como os alagamentos das chuvas, cujo enfrentamento não é atribuição do Estado, e o transporte público, muito ruim e com engarrafamentos intermináveis."
Geraldo Tadeu avalia que mesmo antes dos protestos de junho o governo Cabral exibia sinais de desgaste. "Já havia uma fadiga ", diz ele, revelando que a reforma do Maracanã, por mais de R$ 1 bilhão, "emergiu" nas qualitativas, misturada a críticas ao alto preço dos ingressos no estádio reformado e à prioridade duvidosa da obra. "No primeiro mandato, as Unidades de Pronto Atendimento (UPAs) e as Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs) criaram uma crescente positiva. O segundo não tem novidades." A isso, agregaram-se problemas como demora para implantação de programas sociais em favelas pacificadas pelas UPPs, com a repetição de tiroteios e ameaça de volta de traficantes. Por fim, ele lembra a inabilidade, nos protestos de junho, da Polícia Militar acusada de abuso uso excessivo da força.
Para o cientista político Fabiano Santos, do Instituto de Estudos Sociais e Políticos da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Iesp-UERJ), algumas políticas do governo estadual geraram uma forte oposição por parte de alguns prejudicados pelas mudanças. Uma foi a implantação das UPPs, que atingiu traficantes, milicianos e policiais corruptos. Outra foi a gestão fiscal, marcada pela contenção salarial e irritou o funcionalismo. Houve ainda a ação de partidos de oposição, que, diz, assumiram como prioridade "ganhar no grito" o jogo da eleição de 2014. O resultado teria sido o movimento "Fora Cabral", que gerou conflitos perto do Palácio
Guanabara e acampamentos perto do prédio onde ele mora. "Houve uma confusão grande entre o que era insatisfação e o que eram interesses eleitorais", afirma Santos.
Resposta. Em nota, o governo Cabral afirma que "os avanços do governo do Rio desde janeiro de 2007, não somente no volume de investimentos mas em todas as áreas de atuação, são inegáveis. Há três anos, este governador foi reeleito no primeiro turno com 66% dos votos. O governo do Rio deste segundo mandato é o mesmo, com a mesma equipe, a mesma linha de atuação. No momento correto, a população do Rio de Janeiro saberá avaliar os resultados do trabalho realizados nesses últimos sete anos."
Fonte: O Estado de S. Paulo
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