“Quero deixar uma coisa clara: não há tema proibido na CPI” (Deputado Odair Cunha , PT-MG, relator da CPI do Cachoeira)
É no que dá ser generoso com Sérgio Cabral, Fernando Cavendish, dono da Delta, e o “bando dos homens de guardanapo”.
Escrevi aqui que só farrearam juntos em Paris há três anos porque não existia o Código de Ética que desde 2011 rege a conduta de Cabral e dos demais servidores públicos do Rio. Acertei no acessório, errei feio no principal.
O acessório: de fato até 2009 não havia código que orientasse Cabral a governar preservando a ética. E sem um código ficava muito difícil para ele ter certeza se a ética corria perigo ou não.
Cabral é simpático, porém simplório. Só no ano passado sentiu a necessidade de um código. Para ser exato: depois de 17 de junho do ano passado.
Naquele dia, Cabral voou a Porto Seguro, na Bahia, em jatinho do empresário Eike Batista. Foi comemorar o aniversário de Fernando Cavendish, dono da empreiteira Delta e de quase R$ 1,5 bilhão em contratos com o governo do Rio.
À noite, um helicóptero caiu ao transportar sete convidados do aniversariante. Todos morreram.
Cavendish perdeu a mulher, Jordana, e o filho de três anos do primeiro casamento dela. Cabral perdeu a amiga Fernanda Kfuri, acompanhada do filho e de uma babá. Marco Antônio, filho de Cabral, perdeu Mariana Noleto, sua namorada.
Quem pilotava o helicóptero era Marcelo Mattoso de Almeida, ex-doleiro. Na ocasião chovia forte.
Primeiro a assessoria de Cabral informou que ele não estava em Porto Seguro quando o helicóptero caiu. Estava.
Depois informou que ele viajara às pressas para lá ao saber do acidente. Negou, contudo, que Cabral tivesse viajado em jato de Eike – viajou.
E negou que tivesse retornado ao Rio em jato de Eike. O retorno ainda é um mistério.
Criticado por ter comparecido ao aniversário de um fornecedor do Estado em jato cedido por outro fornecedor, Cabral disse: “Sempre procurei separar minha vida privada da minha vida pública”.
Apesar disso, prometeu mudar de comportamento – não sei por quê. E anunciou a criação de um código de ética ao qual se submeteriam todos os servidores do Estado.
O decreto com o Código de Conduta da Administração, “que limita as relações entre agentes públicos e privados”, só foi publicado no Diário Oficial no dia cinco de julho passado. Na véspera, Cabral fora atingido por mais uma denúncia: no dia 2 de dezembro de 2010, viajara em jato de Eike para as Bahamas, onde encontrou Cavendish.
Além do código, o decreto criou duas comissões de ética: uma formada por membros do governo para fiscalizar o procedimento dos funcionários do primeiro escalão do governo; a outra por gente de fora para dirimir eventuais dúvidas quanto ao código e garantir sua aplicação aos funcionários dos demais escalões.
Segundo o código, empregados do Estado são proibidos de “receber presente, transporte, hospedagem, compensação ou quaisquer favores, assim como aceitar convites para almoços, jantares, festas e outros eventos sociais” – quer seja obrigatório ou não o uso de guardanapos na cabeça.
E agora, o principal, onde errei.
Dez meses depois da publicação do decreto que criou o código e as duas comissões de ética, supus (jornalista deveria ser proibido de supor) que o código estivesse em vigor e as comissões funcionando.
Nem o código nem as comissões saíram do papel. Como em 2009, Cabral segue livre podendo atropelar a ética.
Cabral levou oito meses para nomear os integrantes das duas comissões. Uma delas reuniu-se uma só vez. A outra, algumas vezes, mas não há registros das reuniões.
Sem que tenha sido aplicado até aqui, em breve o código será reformado para se tornar mais rigoroso.
Pois é. Zombaria! Deboche! Escárnio com a nossa cara!
Peço desculpas por tê-los enganado acreditando no que disseram Cabral e seu bando. Doravante serei mais cuidadoso.
Cabe a vocês cobrarem respostas de Cabral para dezenas de perguntas que teimam em não calar. É espantoso que podendo liquidar o assunto de uma vez por todas ele prefira alimentá-lo com o seu silêncio.
Por que Cabral não exibe a relação completa das viagens oficiais e particulares que fez a Estados e ao exterior desde que assumiu o governo? Com data, destino, meio de transporte, duração e a identidade da fonte pagadora de cada despesa?
Por que não revela quantas vezes voou com Cavendish? Ou o encontrou no lugar para onde voou? Seria tão simples! Não é verdade?
Fonte: O Globo
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