O Estado de S. Paulo
Crescimento bem mais forte da economia deveria depender mais de estímulos ao setor privado e da busca de um espaço nas contas públicas para ampliar seus investimentos
O
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) anunciou esse resultado
relativamente ao trimestre anterior, na série com ajuste sazonal. Não houve
surpresa, pois era esperado por analistas do assunto e até um valor negativo,
pequeno, também foi cogitado.
Com
isso, o PIB volta a evidenciar o mau desempenho que tem marcado a economia
desde a década de 1980, num movimento que meu dicionário define como de
estagnação, em que a economia cresce abaixo de seu potencial. Infelizmente,
esse grave desempenho recebe pouca atenção da classe política e da sociedade em
geral, em razão do que não é enfrentado adequadamente e segue se repetindo.
Passando a detalhes do resultado, ele foi muitíssimo inferior aos resultados do 1.º e do 2.º trimestres deste ano, que mostraram taxas de 1,4% e de 1,0%, respectivamente. Mas estas resultaram principalmente de uma safra agrícola excepcional, que impulsionou o agronegócio. Também pesou, entre outros fatores, o efeito expansivo da chamada PEC da Transição, que aumentou benefícios sociais. Recorde-se que antes mesmo de tomar posse Lula conseguiu aprovar essa PEC no Congresso Nacional, o que lhe assegurou uma série de benefícios sociais a título de pagamento de promessas de campanha.
A
taxa de investimento (ou de formação bruta de capital) também foi uma decepção,
pois foi de apenas 16,6% do PIB e inferior à do mesmo período de 2022, quando
foi de 18,3%. Aí se trata de uma fragilidade crônica com forte impacto na
referida estagnação, pois idealmente essa taxa deveria estar em 25% ou mais. Em
face de muitas incertezas quanto ao futuro da economia, os empresários não se
sentem confiantes para expandir seus investimentos. Uma outra razão dessa baixa
taxa é que o Brasil, neste período de estagnação, reduziu fortemente a taxa de
investimento do setor público, que na década de 1970 chegou a 10,58% do PIB e
hoje está perto de apenas 2,5%. O investimento cedeu espaço a outras despesas,
como de previdência e assistência social.
Recorde-se
que o investimento é o que aumenta a capacidade produtiva de um país e, assim,
quanto maior for, tanto maior será o crescimento do PIB. Não sei como está
hoje, mas no seu período de maior crescimento a China investia cerca de 40% (!)
do PIB, uma taxa excepcional.
Setorialmente,
e na mesma comparação trimestral, a indústria e os serviços avançaram 0,6%, mas
a agropecuária recuou 3,3%, uma queda normal neste período de entressafra.
Do
lado da demanda, já fiz referência à queda dos investimentos. Mas o consumo das
famílias cresceu 3,3%, enquanto o do governo subiu 0,8% no período. O IBGE
atribuiu esse forte crescimento do lado das famílias aos auxílios
governamentais e a uma melhoria do mercado de trabalho. E esses dados do lado
da demanda, inclusive investimentos, mostram que a propensão a consumir é alta
e a de investir é baixa nas famílias e no governo.
O
lado externo teve desempenho favorável, com as exportações de bens e serviços
aumentando 10,3% e as importações caindo 0,1%. Esse lado da economia vem se
saindo bem e é, também, estimulado pela agropecuária.
Olhando
à frente, as expectativas para o trimestre atual, o quarto, são também de uma
taxa muito baixa ou mesmo negativa, mas 2023 deverá fechar com o PIB mostrando
uma taxa perto de 3%, como resultado do que aconteceu nos dois primeiros
trimestres. Para o ano que vem, as análises apontam para um crescimento perto
de apenas 1,5%, pois a agropecuária não deverá repetir o resultado excepcional
deste ano e não se percebem outras forças que poderiam levar a um crescimento
maior. O mesmo vale para 2025.
O
governo federal, como de hábito, quer gastar mais para impulsionar a economia e
se animou com a perspectiva de pagar os precatórios com essa finalidade,
apoiado numa decisão do Supremo Tribunal Federal (STF). É um valor
considerável, cerca de R$ 95 bilhões, e o governo tenta pagálos evitando que
prejudique o resultado primário. Mas não vi informações quanto ao perfil
financeiro dos beneficiados por esse pagamento, pois, se forem
predominantemente de renda mais alta, não gastarão tanto em consumo – o contrário
ocorrendo se parcela significativa for de renda mais baixa. E o governo criou,
ainda, um benefício para reter estudantes no ensino médio também fora das
regras do arcabouço fiscal.
Ou
seja, ele segue sua prática de tentar estimular a economia com mais gastos,
ignorando que isso aumenta a sua dívida já alta e é um dos ingredientes que
impedem uma redução das taxas de juros. Isso também prejudica os investimentos
privados, contribuindo para manter o custo de capital em valores elevados por
padrões internacionais.
No fundo, prevalece o que já venho apontando há tempos. Não há uma preocupação do Executivo, do Congresso e da sociedade em geral com um crescimento econômico bem mais forte e que deveria depender mais de estímulos ao setor privado e da busca de um espaço nas contas públicas para ampliar os seus investimentos, e não de medidas que ampliam a dívida pública e encarecem os juros no seu impacto.
*Economista (Ufmg, Usp e Harvard), é Consultor econômico e de ensino superior.
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