Folha de S. Paulo
Ministro da Fazenda agora prega corte de
juros como qualquer político do governo
Selic não cai tão cedo e, se caísse agora,
causaria tumulto ruim também para Lula 3
No Banco Central,
o ministro Fernando
Haddad (Fazenda), daria um talho da Selic,
pois taxa real de juros de
10% ao ano "não se sustenta", afirmou nesta
terça. Não se sustenta, é verdade. Dá em aumento ainda mais
descontrolado da dívida pública, crescimento menor da economia, aumento ou
estagnação da desigualdade de renda etc. É óbvio.
Supõe-se então que o ministro acredite no
seguinte: se a direção do BC diminuir a taxa Selic nesta quarta, não haverá
efeito colateral, prejuízo para a atividade econômica. Ou, então, tais efeitos
seriam menores do que os custos de manter a Selic no nível em que está.
Mesmo que alguém pudesse acreditar nesse balanço positivo de perdas e ganhos, o problema nem é esse. Dados o nível de inflação, a inflação esperada para 2027 (3,8%, meta de 3%) e o descrédito dos credores no controle do tamanho da dívida e na moeda brasileira, BC não vai cortar a Selic. Nem mudar a meta de inflação, "na prática" —não agora.
Mas suponha-se que a direção do BC, submetida
a lavagem cerebral, decidisse dar uma mãozinha eleitoral a Lula 3
e passasse a baixar a Selic. Ainda que não acontecesse mais nada depois de tal
decisão, uma hipótese "tudo mais constante" desvairada, o corte da
Selic pouco efeito teria no desempenho econômico do ano que vem. Não seria nem
pragmático, assim como seria contraproducente elevar ainda mais o gasto.
Mas isso tudo é conversa doida. Na hipótese
de lavagem cerebral bem-sucedida, essa dobradinha BC-governo teria como
resultado alguma fuga do real, "alta do dólar", e um aumento de taxas
de juros para todos os demais prazos (a Selic é uma taxa de curtíssimo prazo).
Os donos do dinheiro grosso que não dessem o
fora cobrariam mais para emprestar ao governo, ainda deficitário e que precisa
tomar mais empréstimos a fim de pagar a conta de juros. É óbvio.
Então, supõe-se que o governo queira fazer
"hedge" político-eleitoral (proteção contra a potencial
"desvalorização" da carteira de votos governista). Se o
desaquecimento da economia for maior do que ora se espera, se o salário médio
parar de subir, se houver menos emprego novo, o bode expiatório seria o BC.
Cola? Atribuir à política monetária um aumento de mal-estar (que aliás deve ser
marginal) vai render voto extra de quem, da massa do povo?
Ainda que se tratasse de "hedge"
político bem-sucedido, também essa operação teria custo. Se o governo acredita
que a inflação está controlada e que a taxa de juros não tem influência na
compensação do descrédito financeiro do governo, isso tem custo de reputação —a
inflação está entre 4,5% e 5% ao ano e o déficit externo é grande e crescente,
sinais de economia inflacionada. Isso para começar.
Para continuar, a atitude do ministro reforça
suspeitas, exageradas, de que o governo pisaria ainda mais no acelerador do
gasto a fim de dar um gás ao PIB no ano
eleitoral. Tem gente pesada na praça do mercado que acha possível até o governo
aparecer com um projeto de "tarifa zero" (subsidiar transporte
público) já no ano que vem. Pois é.
Lula 3 poderia ajudar a antecipar o corte da
Selic (e das taxas do mercado) com um plano de contenção de gasto. Não vai
acontecer, é óbvio. O governo dá até agora dribles no arcabouço fiscal. Terá
mais déficits, a perder de vista. Em anos de crescimento bom de PIB e receita,
a dívida pública vai subir de 72% do PIB para uns 83% sob Lula 3.
O que quer o governo com essa conversa de
juros do BC?
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