terça-feira, 24 de novembro de 2009

Raymundo Costa:: Ao sabor da conjuntura

DEU NO VALOR ECONÔMICO

Justiça seja feita, desde junho passado, pelo menos, Aécio Neves defende que a decisão do PSDB sobre o candidato tucano a presidente deve se dar em dezembro, mais tardar no início de janeiro de 2010. Nesse sentido, o governador mineiro tem sido coerente, como mostra a coletânea de discursos e entrevistas que concedeu no período. O mesmo não se pode dizer sobre o que Aécio pensa fazer no governo e qual é precisamente sua opinião sobre o governo Lula.

O discurso de Aécio é genérico, algumas vezes contraditório e quase sempre escorregadiço. A crítica econômica é simplificada. O discurso recorrente de Aécio, nesses seis meses, defende a conclusão das reformas "que ficaram pela metade, como a previdenciária e a tributária, e as que nem sequer foram ainda debatidas em profundidade, como a trabalhista ou a política".

Dizer que o Estado petista é "ineficiente" é uma generalidade, mesmo quando o governador aponta para sua causa mais provável: o aumento de cerca de 27% do PIB, nos últimos sete anos, enquanto os gastos correntes do governo cresceram quase 80%. "Uma conta que não fecha", repete Aécio.

O governador de Minas fez o melhor esboço do que seria seu eventual governo num encontro recente com empresários de São Paulo. Para Aécio, "a gestão mais complexa em um governo" não é a administrativa e muito menos a econômico-financeira. "É certamente a gestão política".

As gestões administrativa e econômico-financeiro (consideradas o forte de José Serra, o adversário que Aécio tenta desbancar no PSDB), na opinião do governador, podem ser partilhadas e a autoridade, delegada. O mesmo não se poderia dizer da gestão política (considerada o forte de Aécio, que se apresenta ao PSDB como o candidato com maior poder de articulação, entre os tucanos). "A autoridade do chefe do Poder Executivo é indelegável", disse Aécio aos empresários.

A gestão política é a viga mestre do discurso "pós Lula" que Aécio desenhou há mais de seis meses, mas só agora tenta dar substância. Basicamente, a formação de consensos no governo. "Só a partir deles conseguiremos avançar"

Nessa lógica, Aécio limita-se ao lugar comum segundo o qual o atual governo não fez mudanças em matéria econômica e financeira e perdeu "oportunidades num ciclo expansivo da economia mundial". O discurso é bem coordenado. Aécio reconhece que na gestão petista "ocorreu uma distensão à medida que os movimentos sociais e sindicais praticamente se incorporaram ao governo ou foram por ele cooptados".

Acompanhe-se o raciocínio de Aécio: "Esta incorporação gerou faixas de forte interesse corporativo dentro do Estado".

Em outras palavras, as relações do governo Lula com ONGs e outros tipos de associações, por meio de financiamentos distintos, tornaram muitas dessas entidades economicamente dependentes do governo. Seria lícito, portanto, pensar que a derrota da candidata do governo nas eleições de 2010 provocaria uma "reação de todo este conjunto corporativo". E isso teria como efeito imediato um "estressamento" das relações com um novo governo de oposição.

É o que Aécio chama de "inconformismo no primeiro momento". Isso porque o governador de Minas, em vez de desmamar ONGs e outros movimentos sociais cooptados pelo governo, prega a gestão política como instrumento de conciliação.

"Ela (a gestão política) não poderá ser uma gestão vertical e tecnocrática, pois isso intensificaria os conflitos de partida, produzindo um quadro de imobilismo e de radicalização", explicou aos empresários. "A importância da gestão política na próxima administração se manifestará na relação com setores da sociedade organizada, com o poder legislativo e com os Estados federados."

Não deixa de ser uma mudança do discurso de fundo, nesse período de seis meses de tentativas para se colocar no páreo da convenção que escolherá o candidato do PSDB. Dias antes, Aécio esgrimia um discurso menos tolerante.

"Temos hoje quase 40 ministérios. Eu falo isso com a autoridade de quem assumiu o governo com 22 secretarias e hoje tem 15. O governo funciona muito melhor", dizia. "O PT tem essa característica do aparelhamento, a meu ver, excessivo da máquina pública em troca de apoios no Congresso. Eu acho que é possível governar o Brasil com um governo mais enxuto e com mais eficiência. Até porque o tamanho do Estado não significa ganho de eficiência e de resultados".

Aécio disse várias vezes que o PSDB deveria primeiro discutir seu projeto para aí sim definir o candidato. O mínimo que ele deve aos tucanos é dizer qual de seus projetos é o que vale .

Raymundo Costa é repórter especial de Política, em Brasília. Escreve às terças-feiras

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