Não existe mais dúvida: o crescimento de 2012 será muito modesto. A MB Associados reduziu sua projeção para uma expansão do PIB de apenas 2,5%. Essa redução não parece ser passageira, nem decorre apenas da expectativa da piora recente no quadro internacional, mas sim da letargia da demanda doméstica e de dificuldades de certos setores produtivos, apesar de todos os incentivos introduzidos pela política econômica. Um aprofundamento da crise europeia exigiria uma revisão dos dados ainda mais forte. Todos os componentes da demanda agregada (exportações, investimento e consumo) estão andando mais devagar, sem perspectivas de grande melhora nos próximos meses.
As exportações vêm sendo negativamente afetadas pela redução do crescimento global. Em abril deste ano, frente ao mesmo período de 2011, a quantidade exportada de bens intermediários caiu 5,7%, enquanto a de bens de consumo duráveis 22,2% e a de bens de consumo não duráveis 10,2%. Além do crescimento mais modesto no mundo todo, a menor competitividade do produto nacional vem implicando em recorrente perda de participação nos mercados, especialmente frente à competição asiática em outros países emergentes.
Finalmente, o protecionismo mais elevado também tem um papel, visível mais que tudo no caso argentino (entre janeiro e abril deste ano as exportações de manufaturados caíram 9%). Após uma ameaça de uma posição mais altiva, a política externa brasileira volta a já tradicional submissão dos últimos anos. Lamentável.
Todos os indicadores de investimento continuam mostrando um forte enfraquecimento. Isto é verdade para a importação de bens de capital, que mostrou um crescimento de apenas 4,3% no primeiro trimestre do ano (contra 28% há um ano), para a produção local de equipamentos, que caiu 11,4% no mesmo período e nos insumos típicos da construção civil, que mostrou crescimento de apenas 3,3%.
O investimento público está enfrentando neste ano dificuldades maiores que as usuais e seus valores vêm apresentando apreciável redução. Segundo estimativa de Mansueto Almeida, o investimento público no primeiro quadrimestre deste ano apresentou uma queda nominal de 10,2% em relação ao mesmo período do ano passado, quando se excluem as transferências do Tesouro ao Fundo de Arrendamento Residencial, (FAR), que é uma despesa de custeio e não de investimento. Um crescente número de greves tem afetado a construção de inúmeros projetos, como as usinas de Santo Antonio, Jirau e Belo Monte, as refinarias Abreu de Lima e Comperj e estádios como o Maracanã. Ao mesmo tempo, o rapa que afetou o DNIT reduziu a quase zero a velocidade dos projetos. Finalmente, os episódios em torno da Delta Engenharia contribuem para as dificuldades.
A construção civil residencial também anda muito devagar. Neste caso, o problema básico não é a falta de demanda ou de financiamento, mas sim, um problema na oferta. De fato, as construtoras depois de venderem muito bem em 2009 e 2010 passaram a encontrar grandes dificuldades para construir as edificações. Essas dificuldades são essencialmente ligadas à grande escassez de mão de obra com qualificação, que resultam num crescimento persistente de elevação de custos e de atrasos na entrega dos apartamentos. Ainda vai levar alguns trimestres antes da normalização do fluxo de produção.
Ainda na área de investimento, é cada vez mais reconhecida a dificuldade da Petrobrás em manter o cronograma dos novos projetos, pela enorme dificuldade de conciliar preço, grau de nacionalização e prazos de entrega de grande parte dos equipamentos encomendados. Com isto, praticamente todos os projetos estão atrasados.
Em outros setores, vários projetos de expansão estão sendo revisados e postergados. É o caso da indústria siderúrgica, afetada pela gigantesca capacidade ociosa no mundo, da ordem de 500 milhões de toneladas. No setor de açúcar e álcool ocorre a mesma coisa, uma vez que a manutenção do preço da gasolina fixo por vários anos destruiu a rentabilidade na produção de etanol; além das empresas já em dificuldades financeiras, há notícias no mercado de vários "players", colocando à venda suas empresas. Os balanços ruins que temos visto, resultado direto das grandes elevações de custos dos últimos tempos, também têm levado à postergação de novas inversões.
Os estrangeiros estão perdendo o entusiasmo para investir no Brasil, inclusive pela excessiva interferência na economia e frequente mudança de regras. Os animais dos espíritos estão voltando para as jaulas e vai demorar algum tempo para retirá-los de lá, mesmo com a queda de juros e a desvalorização do real.
Finalmente, devemos considerar a questão do consumo. Os dados mostram certo arrefecimento nas compras, concentradas no setor automotivo. Este desempenho tem muito a ver com o excesso de endividamento de parcela expressiva dos consumidores.
De fato, pesquisa da MB mostra que nas classes C e D/E 20% das famílias assumiram compromissos mensais acima de 30% de sua renda, dificultando o pagamento em dia de suas prestações. É frequente o caso em famílias com prestações acima de 40% da renda mensal. Devemos lembrar que nestas faixas de renda a manutenção básica (alimentos, transporte, etc.) compromete entre 65% e 75% da renda familiar. Quando se atinge essa situação, é inevitável que o consumo se retraia.
No caso dos automóveis, a situação é ainda pior, pois a partir de 2008 os carros usados se desvalorizaram pesadamente, implicando uma perda de capital para os proprietários e tornando mais difícil a tradicional troca de um carro velho por um mais novo. Vai, portanto, levar algum tempo antes de uma volta à normalidade e é por isso, que os pacotes de auxílio ao consumo tem tido cada vez menor eficácia.
Passado esse ajuste, que deve levar ainda alguns trimestres, o crescimento da demanda voltará a ocorrer, com taxas mais modestas que as do passado recente. Em primeiro lugar, porque uma boa parte do efeito inclusão dos mercados de consumo já ocorreu (não existem mais 12,5 milhões de domicílios para serem incluídos no Bolsa Família, por exemplo), pela dificuldade de se manter taxas tão elevadas de aumento do salário mínimo como no passado recente, e pela dificuldade de se manter o crescimento dos salários muito acima da produtividade como nestes últimos anos.
Da mesma forma, a expansão do crédito ao consumidor não dará mais saltos como no passado, pois uma boa parte dos consumidores já está no circuito de crédito. Fabio Ramos da Quest calculou que a relação crédito ao consumidor (exceto imobiliário) sobre o PIB já está muito próxima daquela observada nos EUA, da ordem de 16%. O consumo continuará a crescer, mas de forma mais moderada, e mais dependente da elevação da produtividade do trabalho do que de transferências e inclusão.
A lentidão do crescimento deste ano tem, portanto, tudo a ver com dificuldades reais, e de difícil superação, nas exportações, nos investimentos e no consumo. A crise na Europa soma-se aos fatores acima apontados, resultando num crescimento modesto para 2012, que estimamos ser da ordem de 2,5%, como já contamos no início deste artigo.
FONTE: O ESTADO DE S. PAULO
Nenhum comentário:
Postar um comentário