Europa transforma a Grécia em neocolônia com uma política de "humilhação demencial"
Em pleno século 21, o colonialismo praticado por europeus está de volta. Mas, desta vez, não se aplica a remotos países africanos, sul-americanos, asiáticos. Vale para um país da própria Europa, a Grécia.
O termo "neocolônia" foi usado por Costas Lapavitsas, professor de Economia na Escola de Estudos Africanos e Orientais da Universidade de Londres. "Se a Grécia perseverar com as políticas atuais na eurozona, a economia vai encolher e estagnar. O país se tornará um canto empobrecido, envelhecido e profundamente desigual, uma neocolônia em tudo menos no nome".
Exagero de acadêmico sem responsabilidade de governo e, por isso, livre para usar palavras fortes? Não.
O chefe do governo italiano, Mario Monti, um tecnocrata extremamente moderado e que está impondo a seu país uma receita de austeridade parecida com a da Grécia, reconhece que "a Grécia perdeu sua soberania", o que é a mesma coisa que dizer que se tornou colônia.
Mais: Monti atribui a radicalização do eleitorado grego contra a austeridade, revelada nas eleições do dia 6 passado, à "humilhação demencial" sofrida pelo país e, por extensão, por sua sociedade.
Talvez seja um pouco tarde, mas Monti, que não é nem remotamente de esquerda, reconhece agora que a Europa errou "ao reclamar um ajuste demasiado rápido" a Atenas.
O premiê italiano afirma ainda que "introduzir a concorrência, a luta contra a evasão fiscal e a corrupção e reduzir o deficit público em dois ou três anos (...) significa uma mudança cultural e política extremamente profunda, (que) necessita de uma geração".
Puro sentido comum que, no entanto, faltou aos líderes europeus, que impuseram essa "humilhação demencial" à Grécia. Pior: como é próprio de um país colonizado, os gregos são agora convidados a decidir, na nova eleição convocada para dia 17, entre o suicídio assistido (pelos europeus), que seria prosseguir com o programa de ajuste, e o mergulho no vazio que seria deixar o euro.
Lapavitsas acha que os gregos preferirão a segunda alternativa, o que implica um segundo e definitivo calote na dívida, que se tornará impossível de pagar se o país tiver que deixar o euro. "Não há simplesmente outro caminho para tornar a dívida administrável no futuro previsível", escreve.
Azar dos gregos apenas? Não. Charles Dallara, o diretor-geral do Instituto da Finança Internacional, que congrega a grande banca global, alerta que a saída da Grécia do euro "desestabilizará a economia mundial".
Reforça Ewald Nowotny, presidente do Banco Central da Áustria e, como tal, membro do Conselho Diretor do Banco Central Europeu: "A saída da Grécia do euro criará maciças distorções, de tal forma que não se sabe que consequências poderia ter".
Essas sombras fazem a diferença entre as velhas colônias europeias em continentes distantes e a neocolônia plantada à beira do Mediterrâneo: as dores daquelas não eram sentidas na Europa. As dores desta, sim, afetarão todos os países do continente e até as antigas colônias como o Brasil, cuja economia já se ressente da instabilidade europeia.
FONTE: FOLHA DE S. PAULO
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