É dura a vida dos deputados que ousam desafiar a onipotência de Eduardo Cunha. Além de terem o microfone cortado quando contestam seus desmandos em plenário, eles sabem que as vitórias são raras e duram pouco. Se perde uma votação à tarde, o peemedebista passa a noite em negociações para virar a mesa no dia seguinte.
Nesta quinta-feira, os independentes da Câmara mostraram que também andam sem sorte. Eles recorreram ao Supremo Tribunal Federal para anular a manobra que aprovou a redução da maioridade penal. Entre os 11 integrantes da corte, o sorteado para relatar o caso foi o ministro Gilmar Mendes.
"Vou comprar um pacote de sal grosso para espalhar no gabinete", murmurou um deputado petista. O mandado de segurança contra a manobra de Cunha foi assinado por 102 parlamentares de 14 partidos, incluindo dissidentes do PMDB.
Ex-assessor de Collor e FHC, Mendes tem exibido sintonia fina com o presidente da Câmara. Em fevereiro, foi o único ministro do Supremo a participar do jantar que selou a aprovação da PEC da Bengala, na residência oficial de Cunha. Há um ano e três meses, impede o julgamento que poderia proibir o financiamento empresarial das campanhas.
Mendes travou o processo com um pedido de vista, quando a maioria dos colegas já havia votado a favor da proibição das doações privadas. Ele antecipou que é contrário à ação, mas se recusa a devolvê-la, em desrespeito às normas do STF. Enquanto segura a causa, Cunha ganha tempo para incluir as contribuições empresariais na Constituição.
Pressionado, o ministro disse que entregaria seu voto até o fim de junho. O mês terminou, e a corte entrou em férias sem que ele cumprisse a palavra. Em entrevista recente, Mendes afirmou que "não houve combinação" com Cunha para retardar o julgamento. A declaração parece tão verdadeira quanto a sua promessa de devolver o processo.
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