Thais Bilenky – Folha de S. Paulo
SÃO PAULO - Ao criar precedentes no combate à corrupção no país, o mensalão pavimentou o caminho para a Operação Lava Jato, apontam os cientistas políticos Carlos Pereira e Gregory Michener.
Em artigo publicado em revista da Universidade Cambridge, os autores sustentam que o escândalo que estourou em 2005 com a denúncia do então deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ) abalou a certeza da impunidade no país do "jeitinho".
"Os avanços legais do mensalão forçam os cidadãos brasileiros a questionar a presunção frequente de que investigações corrupção 'acabam em pizza', com ricos e poderosos sempre dando um 'jeitinho' de contornar a lei", concluem os autores.
Com a Lava Jato ainda em curso, já é possível observar na operação efeitos do julgamento do mensalão. A cooperação entre instituições como Ministério Público e Polícia Federal é um exemplo de amadurecimento, escreveram os professores da Fundação Getúlio Vargas do Rio.
"A coordenação entre entre investigação independente e instituições de repressão tende a ser o motivo do desmoronamento de tantos casos. Interferência política e dilemas nascidos em obstáculos coletivos impedem a justiça de ser feita", afirmam.
"A importância do mensalão reside, em parte, na coordenação bem-sucedida [entre órgãos], o que evidencia o aprendizado institucional."
COBRANÇAS
A gravidade dos crimes cometidos —compra de voto parlamentar em favor do governo Lula (2003-2010)— também motivou outro tipo de amadurecimento, na análise dos pesquisadores: o da cobrança por transparência.
O interesse público pelo caso e cobertura jornalística intensa, incluindo transmissões ao vivo de sessões no Congresso e no Supremo Tribunal Federal, geraram cobranças.
Como consequência, o país construiu um arsenal composto, por exemplo, pela Lei de Acesso à Informação, sancionada pela ex-presidente Dilma Rousseff, e a Ficha Limpa, assinada por Lula.
"Mesmo os críticos ao PT hão de reconhecer o papel que os presidentes [petistas] desempenharam no fortalecimento do tecido legal de 'accountability' [responsabilização] e transparência, assegurando a independência das instituições", escrevem Pereira e Michener.
"Parece claro que, na esteira do mensalão, líderes do PT procuraram alguma redenção, por meio do preenchimento de lacunas na estrutura legal do Brasil."
Outro efeito observável na Lava Jato é a propensão de investigados em aderir a delações premiadas.
Depois de ver réus como o empresário Marcos Valério Fernandes de Souza, condenado a 37 anos de prisão, o estímulo para os envolvidos negociarem com as autoridades é maior, argumentaram os pesquisadores.
De fato, já foram firmados pela força-tarefa em Curitiba 70 acordos de delação, instituto que tem tido papel importante no desenvolvimento e extensão da operação.
Outro paralelo traçado é entre as faces públicas da Justiça. Os autores compararam a atuação –heroica, para alguns setores– do ex-ministro do Supremo Joaquim Barbosa à do juiz Sergio Moro, responsável pela primeira instância da Lava Jato.
Relator da ação penal 470 (o mensalão), Barbosa protagonizou embates com seus colegas de tribunal, contrariou interesses de Lula, que o indicou para o cargo, e deixou o posto 11 anos antes da aposentadoria compulsória.
"De fato, o legado de Barbosa pode já ter inspirado juízes como Moro, que tem tocado com zelo os processos do escândalo do petrolão.
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