quinta-feira, 18 de julho de 2024

Bruno Boghossian - Haddad perdeu o debate

Folha de S. Paulo

Mau humor com impostos ficou na praça por 40 dias até acordar o governo com uma máquina de memes

Fernando Haddad não olhou por onde andava quando o governo começou a discutir a taxação de encomendas internacionais de até US$ 50. "Vocês falam da Shein como se eu conhecesse. Eu não conheço a Shein", disse o ministro sobre a gigante das comprinhas em abril de 2023.

Em seguida, o governo protagonizou uma sequência constrangedora de avanços e recuos. Anunciou a cobrança do imposto e mudou de ideia depois que a primeira-dama se viu soterrada por críticas à medida. Só foi até o fim quando o Congresso topou contrabandear a taxa numa proposta sobre outro tema.

Em nenhum momento Haddad esteve em posição vantajosa no debate sobre a taxação. O ministro tentou se segurar na justificativa razoável de que a entrada indiscriminada de produtos importados era prejudicial à produção nacional. Ganhou apoio de varejistas e da indústria, mas não fabricou um único eleitor feliz por pagar mais por suas encomendas.

O ministro e o governo erraram na gestão política. Menosprezaram o impacto de uma medida que havia sido esconjurada pelo presidente anterior e foram incapazes de produzir argumentos suficientes para blindar a proposta. Entregaram um presente para a oposição e, com o estrago feito, não souberam reagir.

A associação de Haddad a um mau humor com a cobrança de impostos estava na praça havia cerca de 40 dias. Para piorar, o ministro ainda subiu no palco como opositor da inclusão da carne na nova cesta básica da reforma tributária. A turma da Fazenda só acordou quando ele se tornou alvo de uma máquina de memes na internet. O ministério apontou que a carga tributária está em queda e deu o jogo por resolvido.

O problema do governo é que esta é uma campanha com potencial de chegar a ricos e pobres, que conhecem ou não a Shein. Ela ocorre num território em que a direita liberal se esbalda, jogando lenha numa insatisfação generalizada com a ineficiência de um Estado que precisa dar conta de um país enorme, mas sempre pode parecer gordo demais.

 

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