Correio Braziliense
Débora do batom serve de biombo para o
objetivo de anistiar os oito acusados de liderarem a tentativa de golpe de
estado, entre os quais Bolsonaro, três generais e um almirante
O líder do PL, deputado federal Sóstenes
Cavalcante (PL-RJ), protocolou na Câmara dos Deputados o pedido de urgência
para o projeto de lei que anistia os presos pelo 8 de Janeiro de 2023. O
documento, com 264 assinaturas, foi enviado à Mesa na tarde desta
segunda-feira. A decisão de protocolar a proposta foi antecipada para pôr uma
saia-justa no presidente da Casa, Hugo Motta (Republicanos-PB), e constranger
parlamentares que haviam assinado o texto e pretendiam retirar seus nomes, após
analisar o teor constitucional da proposta.
A eventual aprovação deste projeto deixaria o país à beira de uma crise institucional. O Congresso não é uma instância revisora das decisões do Supremo Tribunal Federal (STF). É disso que se trata, pois as sentenças que estão sendo adotadas contra os envolvidos na tentativa de golpe de 8 de janeiro estão dentro dos limites estabelecidos pela legislação penal. A discussão sobre os rigores da dosimetria das punições está se dando no âmbito da própria Corte. É o caso, por exemplo, do julgamento da cabeleireira Débora Rodrigues Santos, que ficou conhecida por pichar com um batom a estátua da Justiça, em frente ao STF.
Ela se tornou uma espécie de símbolo da
proposta de anistia, principalmente, após o ministro do Supremo Alexandre de
Moraes, ex-presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), pedir sua
condenação a 14 anos de prisão. A pena está dentro dos limites previstos na
lei, porém, Débora não passaria todo esse tempo encarcerada. Mesmo que venha a
ser condenada, por ter permanecido em prisão preventiva por mais de dois anos,
terá direito à progressão da pena e ficará em prisão semiaberta ou domiciliar
no prazo de um a dois anos.
Além disso, o julgamento foi suspenso pelo
ministro Luiz Fux, que pediu vista (mais tempo de análise) do processo e
anunciou que pretende examinar cuidadosamente a dosimetria da pena que está
sendo proposta. O mesmo tipo de questionamento o magistrado reiterou durante o
julgamento de admissibilidade da denúncia contra o ex-presidente Jair
Bolsonaro, em contraponto à posição de Moraes.
Na verdade, o caso de Débora serve de biombo
para a proposta de anistia para os oito acusados de liderarem a tentativa de
golpe, entre os quais Bolsonaro, três generais do Exército e um almirante de
esquadra. Nesta segunda-feira, o ministro aposentado do STF Celso de Mello,
emérito constitucionalista, foi às redes sociais para tratar do caso, por meio
de mensagem intitulada “O caso do batom da golpista”, na qual afirma que é
“totalmente falaciosa a afirmação de que a punição se deveu unicamente ao fato da
ré haver passado batom em uma estátua”.
Mello enfatiza o rol de crimes cometidos por
Débora, entre eles, o de golpe de Estado. “Não, a pichação, no caso, foi apenas
um dos inúmeros elementos das múltiplas imputações penais formuladas contra
referida condenada”, descreve o ministro sobre a soma das penas. “É sempre
importante relembrar que não há perdão para quem atenta contra o regime
democrático”, completou.
Maioria é contra
Uma pesquisa divulgada pela Genial/Quaest no
fim de semana revelou que 56% dos entrevistados são a favor dos presos seguirem
detidos por mais tempo e que devem cumprir suas penas. Por outro lado, 34% são
favoráveis à soltura. Dentro do percentual dos que defendem a liberdade, 18%
acreditam que os presos devem ser soltos porque nem deveriam ter sido detidos,
enquanto outros 16% acham que as prisões já duraram tempo demais. Outros 10%
não sabem ou não quiseram responder ao tema.
O líder do PL, Sóstenes Cavalcante, disse que
deu entrada no requerimento devido às notícias recebidas de que o governo
estava pressionando os deputados para retirar assinaturas: “Mudei a estratégia
e agora está protocolado o documento, é público todos que assinaram”, disse em
nota. O êxito do deputado tem muito a ver com o engajamento pessoal de
Bolsonaro, antes de ser hospitalizado.
O ex-presidente está internado no Hospital DF
Star, onde foi operado de emergência, após sentir-se mal em Natal (RN). A
cirurgia abdominal foi bem-sucedida, mas durou 12 horas devido à complexidade
do caso. Jair Bolsonaro passa bem, porém não tem previsão de alta. Foi a sétima
operação que sofreu em consequência da facada que levou na barriga, durante a
campanha eleitoral de 2018.
Os governadores de oposição ao governo, que
pressionaram suas respectivas bancadas, entre os quais Tarcísio de Freitas
(Republicanos), de São Paulo, foram decisivos para alcançar as assinaturas,
além do lobby concentrado dos parlamentares bolsonaristas e dos ligados ao
agronegócio, aos evangélicos e à chamada “bancada da bala”. Esse poder de
pressão focado nos deputados, isoladamente, é muito mais eficiente e forte do
que o sentimento difuso da opinião pública contra a anistia.
Mesmo com o pedido de urgência apresentado,
no entanto, a votação dependerá do presidente da Câmara, Hugo Motta
(Republicanos-PB), que tem se mostrado resistente à ideia de colocar o tema em
pauta. O protocolo, na avaliação de Sóstenes, dificulta desistências dos
signatários. O PL, que tem 92 deputados, foi a sigla com mais adesões: 90. Em
seguida, estão o União Brasil (40); o PP (35); o Republicanos (28); o PSD (23)
e o MDB (20). Assinaram, ainda, deputados do Avante, Cidadania, Novo, Podemos,
PRD e PSDB. Desses, União Brasil, PP, Republicanos, PSD e MDB têm ministros no
governo Lula.
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