EDITORIAIS:
Anvisa dá exemplo de coragem
O Estado de S. Paulo.
Bolsonaro já deixou claro que não aceita os limites de seu poder. Que as instituições tenham a bravura da Anvisa e recordem ao presidente que ele não pode tudo
A Agência Nacional de Vigilância Sanitária
(Anvisa) aprovou o uso da vacina da Pfizer contra a covid-19 em crianças de 5 a
11 anos de idade. Foi o que bastou para que o presidente Jair Bolsonaro,
inimigo declarado da vacinação para qualquer idade, partisse para a intimidação
explícita dos responsáveis pela decisão da Anvisa.
Em transmissão pela internet, Bolsonaro,
depois de admitir que não tem poder para interferir na agência, exigiu saber os
nomes de quem participou do processo para, então, “divulgar os nomes dessas
pessoas para que todo mundo tome conhecimento quem são essas pessoas e
obviamente forme o seu juízo”.
Não é preciso ser especialista em
bolsonarismo para deduzir que o objetivo de Bolsonaro, usando seu poder e sua
visibilidade como presidente, é atiçar os cães das redes sociais a destruir a
reputação profissional e arruinar a vida privada dos funcionários da Anvisa.
Tal comportamento, obviamente incompatível
com o exercício da Presidência da República, é ademais a reiteração da confusão
deliberada que Bolsonaro faz entre seus desejos pessoais e decisões de Estado.
Felizmente, a Anvisa não se deixou intimidar. Em atitude corajosa, num notável contraste com a pusilanimidade de Bolsonaro, a agência emitiu uma nota oficial em que, referindo-se explicitamente às declarações do presidente, informou que “repudia e repele com veemência qualquer ameaça, explícita ou velada, que venha constranger, intimidar ou comprometer o livre exercício das atividades regulatórias e o sustento de nossas vidas e famílias: o nosso trabalho, que é proteger a saúde do cidadão”.
A nota ainda revela que desde outubro os
funcionários da Anvisa vêm sofrendo ameaças de morte “por parte de agentes
antivacina” e que se tornaram “alvo de ativismo político violento” –
estimulado, como todos sabem, pelo presidente da República em pessoa. É
gravíssimo.
A decisão da Anvisa não é vinculante, ou
seja, o governo pode decidir não segui-la. O ministro da Saúde, Marcelo
Queiroga, bolsonarista exemplar, já disse que, a despeito da avaliação da
Anvisa, a vacinação de crianças “não é um assunto consensual”. Para Bolsonaro,
contudo, era preciso intimidar a Anvisa, pois essa é e sempre será sua natureza
e porque esse comportamento irresponsável lhe rende votos entre os que têm
dificuldade em viver numa sociedade democrática.
Esse tenebroso episódio serve para reiterar
a importância do arcabouço legal que garante a independência e autonomia das
agências reguladoras. A Anvisa, em particular, é composta por cinco diretores
com mandato fixo. Não podem, portanto, ser demitidos quando tomam decisões
técnicas que desagradam ao governo de turno. A agência é, conforme diz a própria
nota da Anvisa, um “órgão do Estado brasileiro”.
Criada por lei em 1999, a Anvisa tem por
finalidade institucional “promover a proteção da saúde da população, por
intermédio do controle sanitário da produção e da comercialização de produtos e
serviços submetidos à vigilância sanitária, inclusive dos ambientes, dos
processos, dos insumos e das tecnologias a eles relacionados, bem como o
controle de portos, aeroportos e de fronteiras”. Aprovar o uso de imunizantes
que ajudem a conter os efeitos de uma pandemia que já dura quase dois anos faz
parte dessas atribuições, assim como recomendar às autoridades que cobrem
certificado de vacinação de estrangeiros para evitar que o País se transforme
no paraíso internacional dos negacionistas.
Há três anos, a sociedade assiste aos
surtos diários do presidente, que faz de tudo, menos governar em nome do melhor
interesse do País. Bolsonaro se empenha com denodo em submeter as instituições
de Estado a seus propósitos particulares, sendo bem-sucedido em muitos casos,
como mostram episódios recentes na Polícia Federal, no Ibama e no Iphan. O
ataque explícito à Anvisa e a seus funcionários certamente não será o último,
pois Bolsonaro já deixou claro que não aceita os limites constitucionais de seu
poder. Que as demais instituições demonstrem a bravura da Anvisa e, como ela,
recordem a Bolsonaro que ele não pode tudo.
PF descobre o que todos já sabem
O Estado de S. Paulo.
Polícia Federal concluiu aquilo que o
Brasil inteiro viu: Bolsonaro mentiu ao afirmar que as urnas eletrônicas não
são confiáveis. Indigno de confiança é o presidente
O presidente Jair Bolsonaro teve “atuação
direta e relevante” na divulgação de desinformação sobre a segurança do sistema
eleitoral, razão pela qual deve ser investigado e, eventualmente, processado
pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Essa é a dura conclusão do inquérito
aberto pela Polícia Federal (PF) a fim de investigar o grau de responsabilidade
de Bolsonaro na difusão da ideia de que as urnas eletrônicas são suscetíveis a
fraudes. O relatório final da PF foi encaminhado ao STF no dia 16 passado pela
delegada Denisse Dias Rocha. A autoridade policial sugeriu que Bolsonaro seja
investigado no âmbito do Inquérito 4.874, conduzido pelo ministro Alexandre de
Moraes, que apura a ação das chamadas milícias digitais.
No dia 29 de julho, Bolsonaro transmitiu
uma live pelas redes sociais e pela TV Brasil – uma imoralidade por si só – a
pretexto de “apresentar provas de fraudes” havidas em eleições passadas, em
especial na eleição presidencial de 2014, vencida por Dilma Rousseff.
Evidentemente, o presidente não apresentou prova alguma, até por
impossibilidade fática. Auditorias realizadas pela própria PF, pelo Tribunal
Superior Eleitoral (TSE), pelo Tribunal de Contas da União (TCU) e pelos partidos
políticos jamais conseguiram demonstrar uma falha de segurança relevante nas
urnas eletrônicas a ponto de pôr em dúvida a credibilidade de um sistema que há
25 anos traduz fidedignamente a soberana vontade dos eleitores.
A rigor, portanto, nem sequer havia o que a
PF investigar ao longo desses cinco meses desde a vergonhosa live. O Brasil
inteiro assistiu àquele espetáculo de imposturas e desinformação, o ápice da
cruzada de Bolsonaro contra o mesmo sistema eleitoral por meio do qual
construiu sua longa e improdutiva carreira no Poder Legislativo antes de chegar
à Presidência da República, além de transformar sua prole em holding política.
O trabalho que teve a delegada Denisse
Rocha, sem desmerecê-lo, naturalmente, foi ver e rever a transmissão em que
Bolsonaro disse o que disse em alto e bom som, além de ouvir os envolvidos na
sua organização, entre os quais o ministro da Justiça e da Segurança Pública,
Anderson Torres; o ministro-chefe da Secretaria-geral da Presidência da
República, Luiz Eduardo Ramos; e o diretor da Agência Brasileira de
Inteligência (Abin), Alexandre Ramagem. Todos, concluiu o relatório da PF,
agiram “de maneira enviesada para promover uma teoria conspiratória”.
A conclusão do inquérito da PF é de
estarrecer todo e qualquer cidadão que nutre apreço pela ideia de República
neste país. Ninguém menos que o presidente, dois ministros de Estado e o chefe
da Abin agiram “por vontade livre e consciente de promover, apoiar ou subsidiar
o processo de construção de narrativas sabidamente não verídicas, baseadas em
premissas falsas ou em dados descontextualizados”, apontou o relatório da PF.
Ao fim da investigação, a autoridade policial concluiu que “restou
caracterizado pelas narrativas das pessoas envolvidas que a chamada ‘live
presidencial’ foi um evento previamente estruturado com o escopo de defender
uma teoria conspiratória que os participantes já sabiam inconsistente”.
Este seria um relatório devastador para a
moral de um presidente da República minimamente digno do cargo. Para Bolsonaro,
ele mesmo uma fraude como chefe do Poder Executivo, o documento nada deve
dizer. O presidente já atingiu o objetivo de suscitar dúvidas sobre as urnas
eletrônicas na cabeça de muitos eleitores. É com base nessa nuvem de suspeição
que ele pretende sustentar a ideia de que foi vítima de “fraude” caso não seja
reeleito em 2022, como indicam todas as pesquisas de intenção de voto no
momento.
A PF fez seu trabalho e concluiu um inquérito que, a despeito da facilidade para apuração de provas, está bem abastecido de elementos que, em tese, podem levar à condenação do presidente pelas mentiras que disse à Nação sobre a segurança do sistema eleitoral. Cabe agora ao Ministério Público Federal também fazer o seu trabalho e defender, como determina a Constituição, a ordem jurídica, o regime democrático e os interesses sociais e individuais indisponíveis.
Realidade paralela
Folha de S. Paulo
Refratário à crítica e refugiado nos fiéis,
Bolsonaro atinge descrédito recorde
A esta altura tornou-se difícil dizer se é
mais espantoso que 60% dos
brasileiros declarem não acreditar em nada do que diz o
presidente da República, como mostra a nova pesquisa Datafolha, ou que ainda
restem 22% a
considerar sua administração boa ou ótima.
Fato é que Jair Bolsonaro, como nenhum
outro de seus antecessores, mostra-se incapaz de governar para a maioria —e até
desinteressado em fazê-lo. Mantém-se refugiado na parcela minoritária, mas
expressiva, do eleitorado que se dispõe a compartilhar de sua realidade
paralela, ou a tolerá-la em nome de preferências ideológicas.
São 26% os que dizem confiar às vezes no
que diz o presidente, e 13% os que confiam sempre. Estes acreditam, pois, que
vacinas conta a Covid-19 estão associadas ao desenvolvimento da Aids; que
eleições no país têm sido fraudadas sistematicamente; que os fracassos do
governo decorrem de sabotagem dos opositores.
Decorridos quase três anos de mandato, é
evidente a indisposição de conviver, que dirá dialogar, com forças políticas,
setores da sociedade e instituições que não estejam associadas a seu projeto de
poder.
Mesmo tendo deixado de lado a pregação
abertamente golpista, Bolsonaro e seu governo continuam hostis à crítica, à
divergência e ao mero cotejo dos fatos. A truculência contra a imprensa, que dá
exemplo a seguidores e a profissionais que cuidam da segurança presidencial, é
apenas a manifestação mais comum dessa intolerância.
Nesta semana até o formalíssimo Fundo
Monetário Internacional (FMI) anunciou o fechamento de seu escritório no
Brasil, em meio a grosserias do ministro da Economia, Paulo Guedes.
O auxiliar de Bolsonaro —que, entre outras
proezas, prometeu zerar o déficit público em apenas um ano e acabou por elevar
o teto de gastos— renega as previsões pouco lisonjeiras do Fundo e do próprio
mercado doméstico para a atividade econômica do país.
A reprovação ao mandatário, que se expandiu
durante a tragédia da pandemia, mantém-se no patamar mais elevado, de 53%, num
contexto de desemprego elevado, escalada da inflação e queda da confiança de
empresários e consumidores.
A aposta derradeira para o ano eleitoral de
2022 será buscar os estratos carentes, justamente os mais refratários ao
presidente —na parcela com renda até dois salários mínimos, 55% consideram seu
governo ruim ou péssimo e 66% nunca confiam no que ele diz.
O recém-criado e necessário Auxílio Brasil
é uma versão ampliada do Bolsa Família, outrora chamado por Bolsonaro de
instrumento de compra de votos. Trata-se, pois, de um caso que testa as
fronteiras da sinceridade do presidente.
Professor valorizado
Folha de S. Paulo
É meritório atrelar salário a desempenho,
que deve privilegiar o aprendizado
Não é novo o diagnóstico de que melhorar a
educação pública exige remuneração competitiva para atrair os melhores
profissionais, embora isso não seja suficiente para assegurar o salto
imprescindível. Chega em boa hora, assim, a notícia de que o estado de São
Paulo planeja valorizar mais os professores do ensino básico.
Com a proposta
apresentada pelo governador João Doria (PSDB),
o piso de entrada na rede subiria para R$ 5.000 mensais em 2022. Um valor 73%
maior que o de hoje, limitado por restrições orçamentárias ao mínimo fixado
pelo governo federal, R$ 2.866,24.
Doria já havia anunciado abono salarial de
R$ 3.000 para a jornada básica de 12 horas. Fez isso para cumprir a norma de
destinar à remuneração de professores 70% das verbas do Fundeb.
O bônus não implica incorporação no
salário-base nem no cálculo de aposentadorias. O aumento proposto envolve
reestruturação de carreira em que os professores optantes terão de submeter-se
a avaliações de dois em dois anos para fazer jus aos incrementos.
O secretário de Educação, Rossieli Soares,
diz que será modificado o perfil de avaliações para progressão salarial, de
modo a simplificá-lo. Haverá 15 faixas de referência na carreira, e docentes
poderão alcançar até R$ 13 mil mensais.
Está certo o governo de manter algum
vínculo entre remuneração e resultados, como estímulo e reconhecimento de
mérito. Mas de fato é recomendável adotar sistema descomplicado e objetivo, sem
dar margem para simulações de desempenho profissional que não reflitam ganho
real de aprendizado.
Este, afinal, deveria ser o objetivo
primário de todos os envolvidos, do governador aos diretores, docentes e demais
funcionários de cada escola. São Paulo tem cumprido metas de melhora pelo
Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb), mas só nos anos iniciais
do ensino fundamental.
Do primeiro ao quinto ano, a nota da rede
estadual ficou em 6,6, acima do pretendido (6,3). Do sexto ao oitavo ano,
contudo, ficou em 5,2, aquém da meta de 5,5. Alguma coisa está funcionando mal.
Há longo histórico de disputas entre o
Bandeirantes e o sindicato, que se apressou a qualificar o novo sistema como
"excludente e ilegal". Passou da hora de poder público e dirigentes
se elevarem acima das rusgas para dar educação de primeira linha para os jovens
do estado mais rico do país.
O favoritismo de Lula nas pesquisas
O Globo
É óbvia a principal conclusão das pesquisas
Ipec e Datafolha divulgadas nesta semana: o ex-presidente Luiz Inácio Lula da
Silva larga como favoritíssimo a vencer a eleição presidencial do ano que vem.
Na sondagem espontânea, a mais relevante a esta altura da corrida, Lula soma
40% das preferências na primeira e 32% na segunda, ante 20% e 18% para o
segundo colocado, o presidente Jair Bolsonaro. São números suficientes para, se
não liquidar a eleição no primeiro turno, no mínimo entrar no segundo contra um
candidato com rejeição bem maior.
Claro que é cedo para fazer prognósticos,
mas um fato se destaca nas pesquisas: apenas um terço do eleitorado não
manifesta preferência espontânea, nível historicamente baixíssimo para dez
meses antes da eleição, quando a campanha nem começou. O principal desafio dos
marqueteiros políticos — em particular os associados a candidatos da terceira
via entre Lula e Bolsonaro — não será, portanto, conquistar eleitores
indefinidos, mas desfazer preferências aparentemente consolidadas, seja por um,
seja pelo outro. Não será nada trivial.
Se o favoritismo de Lula é óbvio, menos
óbvio é outro enigma: qual Lula? O ex-presidente sempre se comportou como um
camaleão político. Adota coloração cinzenta quando discute as pedras no caminho
da economia, esverdeada quando fala nas florestas a líderes internacionais ou
avermelhada quando discursa diante das bases petistas. Nas últimas eleições,
tinha de derrotar o antipetismo, agora terá de aglutinar os vários tons de
antibolsonarismo. Pode não ser tão simples.
O primeiro obstáculo são os escândalos de
corrupção que pesam contra o PT. Se Lula se livrou dos empecilhos jurídicos,
jamais se livrará dos fatos que serão relembrados na campanha, em especial pelo
ex-juiz Sergio Moro, outrora seu algoz e hoje rival na urna. Até agora, nem
Lula nem o partido deram resposta convincente à questão. Acusar uma fantasiosa
conspiração política pode funcionar para a plateia avermelhada, não para os
votos que se aproximam dele por falta de opção contra Bolsonaro — e que podem
abandoná-lo se aparecer alternativa melhor.
O segundo obstáculo é mais importante: qual
o programa de Lula? Em seu governo, ele foi beneficiado por uma maré favorável:
quadro monetário e fiscal estável em razão do Plano Real, alta nos produtos
exportados pelo Brasil, descoberta do petróleo do pré-sal e abundância de
capital em busca de oportunidades no planeta. Desta vez, a economia global
emerge da pandemia num cenário plúmbeo, a credibilidade brasileira foi lançada
na sarjeta por Bolsonaro e pelo Centrão, o descontrole fiscal é profundo, a inflação
despertou, e não há mágica capaz de pôr o país em ordem sem medidas dolorosas.
A aproximação do ex-tucano Geraldo Alckmin
pouco significa em termos de programa. Alckmin se tornou inexpressivo, rifado
pelo PSDB no reduto que dominava. Diante do risco de perder a eleição para
governador, natural que prefira entrar numa campanha com chance de vitória.
Para Lula, é inofensivo, já que a Vice-Presidência tem influência mínima e
nenhum poder.
O talento camaleônico de Lula sempre
funcionou para que se adaptasse a cenários diversos. Desta vez, ele tenta
usá-lo para atrair públicos de colorações distintas. O maior risco para ele é a
soberba diante dos números favoráveis — errar no disfarce pode ser fatal. Para
o país, a dúvida é: qual será sua cor real?
Investigação sobre desinformação eleitoral
de Bolsonaro deve ir até o fim
O Globo
São contundentes as conclusões do relatório
da Polícia Federal (PF) sobre as declarações do presidente Jair Bolsonaro numa
transmissão ao vivo em que faz acusações infundadas sobre as urnas eletrônicas.
Segundo a PF, a preparação da “live” foi enviesada, por apresentar informações
de vulnerabilidades e fraudes inexistentes, ignorando dados que mostravam o
oposto.
Não que seja novidade, mas os fatos ganham
maior peso — até jurídico — com a chancela da PF. O relatório afirma que o
inquérito permitiu identificar “a atuação direta e relevante” de Bolsonaro “na
promoção da ação de desinformação”, aderindo a um padrão de governos de outros
países.
O documento sustenta que a transmissão foi
feita “com o nítido propósito de desinformar e levar parcelas da população a
erro quanto à lisura do sistema de votação”. E que os envolvidos atuam com
“dolo, consciência e livre vontade” na produção e divulgação “de narrativas
sabidamente não verídicas ou sem qualquer lastro concreto”.
As conclusões da PF se aplicariam a inúmeras
declarações de Bolsonaro sobre os mais diversos assuntos, pois trata-se de
comportamento-padrão. No auge da pandemia de Covid-19, ele invocou estudo
inexistente para dizer que o número de mortes estava superdimensionado.
Recentemente chegou a dizer, sem nenhuma base científica, que as vacinas contra
a Covid-19 poderiam transmitir aids, um descalabro (ele é investigado por isso
no Supremo Tribunal Federal). Até ser desmentidas, essas declarações já se
espalharam pelas redes, cumprindo seu objetivo.
Bolsonaro tem direito de expor suas
opiniões. O problema é usar o púlpito da Presidência para desinformar e querer
que o Estado se dobre a seus devaneios. Mais uma vez isso ficou claro no
episódio do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). Em
discurso na Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), ele
confessou ter interferido no órgão após embargo a uma obra da Havan, do
empresário Luciano Hang, amigo do presidente e um dos expoentes do
bolsonarismo. “Ripei todo mundo do Iphan. Botei outro cara lá. O Iphan não dá
mais dor de cabeça pra gente”.
O presidente, que é investigado por tentar
interferir na PF, age como se ele fosse o próprio Estado, confundindo o público
com o privado. Não é crível que vá mudar de comportamento. Mas suas atitudes
precisam ter consequência, pois não são irrelevantes. A investigação da PF
sobre as mentiras propagadas em relação às urnas eletrônicas deve ir até o fim.
Da mesma forma, é necessário apurar as interferências no Iphan confessadas pelo
próprio presidente. É única forma de impor limites a quem não conhece limites.
Correção
O ministro Luiz Fux suspendeu o habeas corpus em favor dos condenados pelo incêndio na boate Kiss por meio de uma liminar, atendendo a uma medida cautelar do Ministério Público gaúcho, e não a um mandado de segurança como informou incorretamente o editorial publicado ontem.
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