Folha de S. Paulo
No mundo encantado de Brasília, se falava de
'surpresa', uma fofoca sobre assunto grave
Foi um dia típico do mundo encantado de
Brasília. Um dia depois do São João, nas férias juninas, causou sensação que o
presidente da Câmara, Hugo Mota, tenha botado para quebrar. O
aumento do IOF caiu com 75% dos votos do total dos deputados (80% dos
presentes). O Senado enterrou o cadáver.
Houve conversinha sobre governo e deputados
terem sido pegos de "surpresa". E daí? Isso é espuma ou sintoma de
coisa pior e sabida. É fofoca, "bastidor", sobre interesses da
política politiqueira, de escassa relação com problemas reais do país.
A redução de despesa e os superávits fiscais a partir de 2027, que constam do projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias de 2026, são um cenário "fictício", diz a Instituição Fiscal Independente (IFI, ligada ao Senado, mas autônoma, responsável por analisar as contas públicas).
É
o que está no Relatório de Acompanhamento Fiscal de junho. Se a
política fiscal precisava ainda de obituário, ali está.
Essa
situação política deriva do fato de que o plano fiscal (gasto, impostos) de Lula 3 estava
marcado para morrer desde 2023, pois autodestrutivo. Deriva do desespero do
governo para cobrir o buraco e evitar pindaíba terminal, pois perdeu a chance
de propor mudança em 2024.
Quase ninguém mais liga para o cumprimento da
meta oficial, nem "o mercado". A lei permite a exclusão de despesas,
outras o governo faz por fora do Orçamento. O déficit real é maior e se empilha
na dívida, que cresce sem limite.
Quase ninguém mais acredita que haverá
providência séria até o final de Lula 3 (por causa de Lula, do Congresso e do
poder econômico). O risco é o governo dar outro tiro na cabeça, mudando a meta
outra vez. No mais, acabou. O governo vai ficar estrangulado em uns dois anos.
A vida será dura a partir de 2027 —ou vamos à breca.
O Congresso quis dar lição no governo. Quer
fazer Lula pedinchar. Quis mostrar a ministros qual é o "lugar
deles", como dizem de Rui Costa (Casa
Civil) e Fernando
Haddad (Fazenda).
O Congresso quer dinheiro das emendas. O
comando do Congresso está nervosinho também porque, acredita, o
governo jogou na conta do direitão e do centrão as mudanças ruinosas no setor
elétrico, entre elas o aumento da conta de luz. Dizia que tinham um
acordo com Lula para dourar essa pílula. Tanto faz. Quem fez mais essa
porqueira no setor elétrico foi o Congresso, um desastre para o planejamento e
o mercado de energia.
O Congresso está incomodado que o governo
alardeie defender o "andar de baixo" e que medidas fiscais rejeitadas
pelos parlamentares atingem apenas "os
moradores da cobertura", como diz Haddad.
Além das queixinhas, a campanha eleitoral começa. Muita gente na Câmara e no
Senado quer ver a caveira do governo, levando o país na cambulhada destrutiva.
Pode vir pauta-bomba. Pode cair o grande projeto eleitoral de Lula, a isenção
do IR.
No cenário da IFI, o déficit cresce de 0,4%
do PIB até 2,7% em 2035. A dívida pública será equivalente a 77,6% do PIB no
fim de 2025. De 82,4% ao final de Lula 3 (era de 71,7% no final de 2022). Caso
nada seja feito, vai a 100% do PIB no final do governo do próximo presidente,
em 2030. É isso que importa.
Mais: "...conforme as projeções da IFI e
mantidas as metas fiscais das diretrizes orçamentárias, para se evitar o
shutdown [paralisia] da máquina pública já em 2026, o Executivo deverá buscar
outras medidas de aumento das receitas e de contenção de despesas".
Fim.
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