sábado, 2 de agosto de 2008

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO


MOCINHOS BANDIDOS OU VICE-VERSA
Dora Kramer


Olhar os fatos à distância, sem a obrigação de formar sobre eles um juízo imediato, tem suas vantagens e desvantagens.

A vantagem é poder pensar com mais vagar. A desvantagem é que, ao pensar com mais vagar, nada parece fazer sentido. Os esforços da Justiça Eleitoral para restringir o acesso de gente “fichada” a cargos eletivos soam ingênuos diante da facilidade e eficiência com que os fora-da-lei impõem limites ao acesso a seus “currais” para fins de reserva de mercado eleitoral.

Se chamados de “bocas de voto” daria no mesmo.

Essa, porém, é a deformação mais recente, já vista sob a ótica da interpretação obrigatória. A anterior teve a Polícia Federal em seu papel mais espetacular desde a prisão da dona da Daslu, ao recolher o banqueiro Daniel Dantas, o especulador Naji Nahas e o ex-prefeito Celso Pitta aos costumes.

Até aí, nada de novo. Mais ou menos um mês antes a PF havia enquadrado numa operação no Rio de Janeiro o ex-governador Anthony Garotinho e levado o deputado e ex-chefe de Polícia Civil Álvaro Lins para uma (curta) experiência do lado menos nobre das delegacias.

Houve celebração, mas o ato não deixou seqüelas. Lins permanece deputado e o Rio - para ele - continua lindo visto dos bastidores da Assembléia Legislativa fluminense, literalmente paralisada ante o poder paralelo do ex-chefe da polícia.
Mas foi o barulho que se seguiu à prisão de Daniel Dantas o que proporcionou ao espectador temporariamente desengajado uma visão surreal do cenário.
O presidente do Supremo Tribunal Federal, Gilmar Mendes, protestou contra os métodos da polícia, envolveu-se em bate-boca com juiz de primeira instância, se estranhou com o ministro da Justiça, mandou soltar Dantas duas vezes e, com isso, nas rodas de cidades como Rio, São Paulo e Belo Horizonte, foi posto no papel de vilão.

Nas duas semanas de julho em que o caso esteve em destaque no noticiário, era comum ouvir gente levantando pesadas suspeições a respeito do presidente do STF, como se fosse a encarnação do malfeitor universal e o tribunal um ambiente permeável a cooptações.

Ao chamado cidadão comum, e ao incomum também, com acesso ao manejo de algum meio de comunicação, não ocorreu que o presidente do Supremo não se exporia daquela maneira sem uma boa razão.
A ninguém pareceu lógico que a decisão estivesse baseada na interpretação da lei. Daniel Dantas saiu bem da história e o presidente do STF caiu na boca do povo.

As decisões avançadas tomadas pela Corte nos últimos tempos perderam a validade. O Supremo foi de mocinho a bandido com a mesma falta de cerimônia com que amanhã pode fazer o caminho inverso.

O episódio ilustra bem a confusão mental em que se encontra o Brasil. Como os escândalos são bem aceitos (qualquer dia serão obrigatórios), a qualificação de corrupto perdeu a gravidade.

Para acusados e acusadores.
Em tempos normais, a simples insinuação de que o STF pudesse condicionar suas decisões à melhor oferta abriria uma crise de ruptura a justificar até a dissolução do tribunal.

Mas agora não, fala-se qualquer coisa e dali a pouco as autoridades aparecem sorridentes numa fotografia e fica o dito pelo não dito.
Tudo desaparece, menos a sensação de que o País abriu mão do discernimento e se entregou ao tanto faz como tanto fez.

Cada qual


No primeiro debate entre os candidatos a prefeito, apresentado pela Bandeirantes, na quinta-feira, ninguém saiu um milímetro do figurino. Marta Suplicy comparou sua gestão com a atual e saiu-se bem no esforço para transmitir serenidade e controlar a tendência ao sarcasmo que, em outros tempos, a fez massacrar Paulo Maluf em debates e ganhar a eleição. Mas, depois do advento do “relaxa” e todo mundo sabe mais o quê, o terreno da galhofa tornou-se intransitável para ela.

Geraldo Alckmin fez o que sabe - invocou Mário Covas, ressaltou feitos no governo do Estado - e o que pôde: falou de futuro, na impossibilidade de criticar a gestão municipal presente, cujo titular é, em tese, um aliado.

Gilberto Kassab ateve-se à lista de realizações e, quando teve chance, deu um jeito de falar sobre uma parceria com o “governo federal”. Assim como quem não quer nada, muito menos briga com o Lula.

Paulo Maluf, o artista de sempre. Reapresentou suas credenciais de realizador, acrescidas do atributo da contenção financeira. Segundo ele, fez mais com menos dinheiro que os outros. A respeito da invencionice sobre um engenheiro (ele) estar muito mais apto que uma psicóloga (Marta) ou um anestesista (Alckmin) para administrar São Paulo, não deu para entender: se fez piada, faltou graça. Se falou sério, faltou lógica.

Ivan Valente, do PSOL, concorre para divulgar o partido e Soninha Francine é animada, espontânea e bem intencionada demais para prosperar na política na forma como é hoje exercida.

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