quinta-feira, 4 de outubro de 2012

Joaquim culpa Dirceu. Revisor deve absolver

Relator do processo do mensalão, Joaquim Barbosa foi implacável. Rebateu ponto a ponto a defesa do ex-ministro, descreveu de forma minuciosa e didática como seria a atuação dele na organização criminosa e então pediu a condenação de José Dirceu por corrupção ativa. Ele também julgou culpados os petistas Genoino e Delúbio. O revisor , Ricardo Lewandowski, condenou Delúbio, e abriu a primeira divergência ao defender a absolvição de Genoino. Hoje, ele julga Dirceu. Não se sabe se os outros oito ministros conseguirão votar ainda nesta quinta-feira

Dirceu, o mandante

Relator condena o ex-ministro da Casa Civil e mais sete pessoas por corrupção ativa. Já Lewandowski absolve José Genoino de qualquer participação no esquema de compra de apoio parlamentar

Helena Mader, Diego Abreu e Ana Maria Campos
 
O julgamento do homem que já foi apontado como o segundo mais poderoso da República começou com um voto pela condenação por corrupção ativa. O relator, Joaquim Barbosa, considerou o ex-ministro-chefe da Casa Civil José Dirceu o mandante do esquema de desvio de recursos públicos e pagamento à base aliada do governo Lula.
 
Joaquim Barbosa ocupou quase todo o tempo ontem em seu voto para descrever minuciosamente a atuação de Dirceu na organização criminosa. Para o relator, o ex-ministro mantinha uma relação direta com o empresário Marcos Valério, operador do mensalão, e agia para direcionar os votos e apoios dos partidos aliados em benefício do governo liderado pelo PT. “Marcos Valério era o broker (corretor) de José Dirceu”, disse o relator.

Barbosa condenou também o ex-presidente do PT José Genoino e o ex-tesoureiro do partido Delúbio Soares, além de Marcos Valério, três ex-sócios e a ex-diretora financeira da SMP&B Simone Vasconcelos. Absolveu o ex-ministro dos Transportes Anderson Adauto e a ex-gerente financeira da agência Geiza Dias.

O aguardado julgamento dos petistas no processo do mensalão começou com divergências sobre a atuação dos réus no esquema de pagamento de propina a políticos. O revisor, Ricardo Lewandowski, surpreendeu o plenário ao anunciar, depois das 19h, que queria começar a leitura de seu voto ainda na sessão de ontem. Em pouco mais de uma hora, ele condenou Delúbio, mas absolveu Genoino, de quem fez uma arraigada defesa. O voto de Lewandowksi sobre Dirceu, entretanto, ficou para hoje.

Depois de ficar vazio durante algumas semanas, o plenário do Supremo estava movimentado ontem. Era grande a expectativa dos advogados para o início do julgamento dos acusados do crime de corrupção ativa.

Joaquim Barbosa acolheu na íntegra as acusações contra Dirceu. Descreveu a atuação do ex-ministro como chefe da quadrilha do mensalão, conforme aponta a denúncia. O relator refutou uma a uma as alegações da defesa de que ele teria se afastado das atividades partidárias depois de assumir a Casa Civil. “O responsável pela articulação da base aliada era o réu José Dirceu. Com ele se reuniam cotidianamente os líderes parlamentares que receberam dinheiro em espécie. O papel de Dirceu na condução dos rumos das votações da base é mais que conhecido”, afirmou o relator.

O ministro acrescentou que Dirceu se reunia com os cabeças do esquema e tinha relação próxima com Marcos Valério, apesar das negativas do ex-ministro. Joaquim observou que a própria mulher de Valério, Renilda Santiago, relatou que Dirceu se reuniu com dirigentes das instituições financeiras que emprestaram ao PT os recursos usados para alimentar o mensalão. “No meu sentir está comprovado que José Dirceu controlava os destinos da empreitada criminosa, especialmente mediante seus braços executores mais diretos, isto é, Marcos Valério e Delúbio Soares”, disse Barbosa.

Acelerado

Com um tom de voz mais alto, muito diferente do usado em votos anteriores, Lewandowski não levou mais que 10 minutos para condenar o empresário Marcos Valério, dois ex-sócios e a ex-diretora financeira da SMP&B Simone Vasconcelos. Também absolveu Geiza Dias e Rogério Tolentino, sob a alegação de falta de provas.
 
Também de forma resumida, o ministro revisor condenou o ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares, a quem chamou de “onipresente” no escândalo do mensalão. “Ele agia com plena desenvoltura ao lado de Marcos Valério. Ao longo dessas 30 sessões, este nome Delúbio Soares sempre foi uma constante”, afirmou Lewandowski.

O voto do revisor começou a se estender quando ele se pronunciou sobre as condutas apontadas contra o ex-presidente do PT José Genoino. O ministro foi enfático ao rejeitar qualquer participação do petista no esquema de compra de apoio parlamentar ao governo Lula, citando que a Procuradoria Geral da República não apontou, em momento algum, conduta individualizada em relação a Genoino. “Não se pode condenar alguém pelo simples fato de ocupar um cargo. Mesmo depois de encerrada a instrução criminal, o Ministério Público não conseguiu apontar nem de longe os ilícitos que teriam sido praticados por José Genoino”, destacou Lewandowski. “

Ao fim da sessão de ontem, o advogado de José Dirceu, José Luiz de Oliveira Lima, afirmou que irá entregar um memorial até amanhã aos ministros do STF, contestando alguns pontos do voto de Barbosa. Ele preferiu não criticar o relator, mas voltou a alegar que não há provas contra o petista. “Quero ratificar mais uma vez que tenho confiança na absolvição do meu cliente, uma vez que as provas produzidas na Ação Penal 470 demonstram a total improcedência das acusações do Ministério Público”, disse o defensor.

Principais pontos

Confira trechos dos votos proferidos ontem pelo relator, Joaquim Barbosa, e pelo revisor, Ricardo Lewandowski.
 
Joaquim Barbosa, o relator

Condenou por corrupção ativa José Dirceu, José Genoino, Delúbio Soares, Marcos Valério, Cristiano Paz, Ramon Hollerbach, Rogério Tolentino e Simone Vasconcelos. Absolveu Anderson Adauto e Geiza Dias.

Delúbio confessou ter determinado a Marcos Valério o repasse de R$ 8 milhões para o PP; R$ 4 milhões para o PTB; R$ 2 milhões para o PMDB; e entre R$ 10 milhões e R$ 12 milhões para o PL. Apontou Dirceu como o coordenador político da base aliada que se reunia cotidianamente com os líderes parlamentares dos partidos que receberam dinheiro. Tinha papel importante na condução dos rumos das votações da base. Era o mentor.

Em depoimento, a mulher de Marcos Valério, Renilda Santiago, afirmou que o empresário se reuniu com José Dirceu no hotel Ouro Minas, em Belo Horizonte, para tratar dos financiamento e dos empréstimos. O petista teve também “duas reuniões capitais” com a direção das duas instituições financeiras que forneceram empréstimos, o BMG e o Banco Rural.

Marcos Valério falava em nome de Dirceu quando participava de reuniões em Portugal. Era um “broker”, ou seja, o corretor do então chefe da Casa Civil.

Não há provas suficientes de envolvimento de Anderson Adauto, ex-ministro dos Transportes, acusado de intermediar repasses para o PTB. Como o STF já a absolveu de outras imputações, como lavagem de dinheiro, não há como condená-la por corrupção ativa.

Ricardo Lewandowski, o revisor

Condenou por corrupção ativa Delúbio Soares, Marcos Valério, Cristiano Paz, Ramon Hollerbach e Simone Vasconcelos. Absolveu José Genoino, Anderson Adauto e Geiza Dias. Falta julgar José Dirceu.

Marcos Valério e seus sócios operacionalizaram o repasse de recursos para os partidos da base aliada do governo. Não ficou provado o dolo e nem a conduta criminosa do ex-ministro dos Transportes Anderson Adauto. E, assim, o absolveu por falta de provas.

Delúbio Soares era uma “figura onipresente”. “Agia com plena desenvoltura” e sempre associado a Marcos Valério. Ao longo de 30 sessões do julgamento o nome Delúbio Soares “foi uma constante”.

A denúncia não aponta nenhuma conduta individualizada em relação ao ex-presidente do PT José Genoino. Não se pode condenar alguém pelo simples fato de essa pessoa ocupar um cargo. Genoino agia apenas na articulação dos caminhos políticos do PT. É um político que não fez fortuna. Tem apenas um apartamento de classe média, sustenta os pais no Ceará e vive do salário.

Fonte: Correio Braziliense

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