A sua imagem e o seu nome, Maria, deram equilíbrio para os meus primeiros passos; choros de insegurança; e as minhas péssimas notas no colégio. Seu olhar atento passava o recado: “Estou aqui para ajudar, siga, vai dar certo!”.
Suas mãos, quando necessário, me puniam severamente.
Hoje, adulto, tenho noção de que muito do seu lado rígido, vem da secura das terras da caatinga nordestina, de sua infância analfabeta e feita de fome. Vem da perseguição policial e dos espaçamentos que o vovô, seu pai, sofreu por ser comunista.
Vida tensa, esta sua vida, mamãe!
Desde o meu nascimento e o de todos os meus oito irmãos, você nunca pode perder de vista que um pequeno descuido colocaria em risco a vida de dezenas de companheiros. Então, a disciplina e as poucas palavras passaram a ser a sua marca.
Destacada para garantir a segurança do secretário geral do Partido Comunista Brasileiro (PCB), Luiz Carlos Prestes, em 1951, na cidade de São Paulo, você se apaixonou por ele. E ele por você. Namoro eterno, interrompido pela morte de papai, em 1990, que já faz 28 anos!
Lembro de você de pé, firme, ao lado dele, nos últimos dias da despedida. Sempre com um vidrinho de remédio da homeopatia nas mãos, como se nele estivesse aquela gota que poderia salvar o papai da morte.
Morte - como esta senhora - rondou a sua casa, durante os anos de clandestinidade (1951/1959) e os anos após o golpe militar (1964/1979). Até mesmo no exílio, não havia tranquilidade para você. A vigilância tinha que ser permanente, para que o seu “Pedro” (este era o nome clandestino pelo qual você chamou o papai, toda a vida) pudesse viajar pelo mundo, denunciando os crimes dos generais fascistas que se apossaram do poder no Brasil. Homens que, sem escrúpulos, assassinaram e desapareceram com centenas de patriotas nas masmorras, através da tortura.
Quantas viagens você fez ao seu lado: por todas as 15 repúblicas da União Soviética; pela República Democrática Alemã; Bulgária; Romênia; Checoslováquia; Hungria; Iugoslávia; Cuba; Portugal; França; Grécia; Moçambique; Angola; Argentina; Uruguai; e pela Nicarágua. Será que me esqueci de algum país?
Por outro lado, não existe estado brasileiro que não conheceu o seu jeito discreto e invisível de cuidar do grande amor de sua vida!
Quanta ingratidão com você, mamãe, da parte de minha irmã Anita Leocádia Prestes, filha da Olga Benário, primeira esposa do papai. Imagine que, ao realizar a exposição do Memorial Luiz Carlos Prestes, em Porto Alegre, ela sequer citou o seu nome: Maria. Pior, abaixo da única foto onde você aparece linda, nos seus trinta e tantos anos, a legenda é a seguinte: “Prestes com a esposa e filhos”.
Primeiro, fiquei intranquilo e emocionalmente abalado. Depois pensei: tudo bem! O nome do seu “Pedro” não está lá. Então, deixa como está! Serve de registro da indiferença, do descaso e da maldade que foi capaz de cometer uma historiadora que diz que aplica a ciência marxista nos seus estudos científicos.
Depois, já que não está lá o nome do seu “Pedro”, que fique sem o nome da Maria que pertenceu e pertence a Prestes, até os dias de hoje.
(Porto Alegre, 13/05/2018 - Dia das Mães)
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