- O Estado de S. Paulo
A desistência de Luciano Huck de
concorrer à Presidência da República, já esperada há pelo menos dois meses,
reforça que a política não é para amadores
A desistência de Luciano
Huck de concorrer à Presidência da República, já esperada há
pelo menos dois meses, reforça que a política não é para amadores, a construção
de uma forte opção de centro vai ficando cada vez mais difícil e a eleição de
2022 embica para uma polarização – certamente sangrenta – entre o
presidente Jair Bolsonaro e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Apesar disso,
ainda é cedo para certezas.
Ao jogar a toalha, Huck seguiu os passos do
ex-juiz e ex-ministro Sérgio
Moro, que quer distância da política e do Brasil, e do
meteórico João Amoêdo, que não deu para o gasto em
2018 e não consegue nem unir o próprio partido, o Novo, para uma nova
empreitada tão ambiciosa.
A fila de presidenciáveis do centro vai, assim, enxugando. Ex-candidato à Presidência por duas vezes e ex-governador do Ceará, Ciro Gomes segue firme em campanha, sem deslanchar e sem atrair nem centro, nem esquerda e nem direita. Apesar do recall de 2018, ainda não atingiu dois dígitos nas pesquisas.
Quanto menos nomes, mais sobressaem-se os
do PSDB, um partido em crise de identidade e sem rumo, mas ainda assim uma
das principais siglas do País, depois das duas vitórias de Fernando Henrique Cardoso em primeiro
turno (1994 e 1998) e de ter disputado o segundo nas quatro eleições seguintes,
contra o PT, até ser substituído pelo bolsonarismo em 2018.
Com prévias marcadas para 21 de novembro,
os tucanos listam quatro pré-candidatos. Arthur Virgílio, ex-prefeito de Manaus, não
é levado a sério; Eduardo Leite, governador do Rio Grande do
Sul, considerado muito verde; Tasso Jereissatti, senador e ex-governador
do Ceará, tido como muito maduro, e João
Doria, governador de São Paulo, faz o gênero “tudo ou nada”.
A “junioridade” de Leite tem desvantagens
óbvias num País em que as variadas crises exigem experência, mas tem vantagens
no eleitorado mais jovem, cevado pela internet e de olho no futuro, não no
passado. Na outra ponta, a “senioridade” de Jereissatti também é uma faca de
dois gumes: ele tem biografia limpa, credibilidade e serviços prestados no
Executivo e no Legislativo, mas o eleitorado digere um “Biden brasileiro”?
Assim, Doria vai, devagar e sempre,
carregando o fardo de uma rejeição resiliente no seu próprio Estado e o trunfo
– que ninguém tira dele – de ter liderado o início da vacinação contra a
covid-19 no Brasil. Ser de São Paulo ajuda, pela força política, econômica e
social, mas também atrapalha, porque gera inveja e a acusação de sempre na
política: “Paulista acha que São Paulo é o Brasil”. Os ex-governadores e
ex-candidatos à Presidência José Serra e Geraldo Alckmin sentiram
na pele...
Correndo por fora, mas ainda praticamente
invisível, o ex-ministro da Saúde Luiz Henrique Mandetta tem como
cartão de visita os 76% de aprovação que chegou a atingir no combate à
pandemia, mas ainda é um ilustre desconhecido para a grande maioria e tem um
problema prático: o seu partido, o DEM, decidiu pela implosão justamente na
decolagem.
Ao atingir seu auge de credibilidade e
cacife, quando seria naturalmente disputado por todos os demais partidos e
candidatos da centro-esquerda à direita, o DEM acaba de expulsar o
ex-presidente da Câmara Rodrigo Maia e de perder Rodrigo Garcia em
São Paulo e o prefeito Eduardo Paes no Rio. Logo, rachou nos dois
pólos fundamentais da eleição.
Sobra ao DEM o nome do presidente do
Senado, Rodrigo Pacheco, de Minas, que é, hoje, quase uma miragem na
paisagem presidencial, além de estar em conversas abertas com outras siglas,
como o PSD, em ascensão em Minas. Logo, seu futuro no DEM, tanto quanto seu
futuro eleitoral, são incertos e não sabidos.
Como, aliás, continua incerto o cenário de
2022, aberto inclusive para novidades e surpresas, como seria o nome do
governador Flávio Dino. Ele, porém, é de um Estado
pequeno e de um partido, o PCdoB, menor ainda. Logo, o mais provável é que Dino
consolide sua capacidade e sua imagem de conciliador e articulador, tão
essenciais em momentos nebulosos e preocupantes como o que o Brasil vive.
O certo é que Bolsonaro será candidato à
reeleição, tanto que está afrontando a Justiça Eleitoral com sua campanha
flagrantemente antecipada, e que Lula não abrirá mão da cabeça de chapa pelo
PT, do alto de sua mágoa, de sua condição de principal líder popular brasileiro
e dos resultados dos seus dois governos.
O resultado dessa conta, Bolsonaro mais Lula, é que será uma campanha sangrenta, com acusações de corrupção, ameaças à democracia e risco de um grande fuzuê depois da abertura das urnas. O que, obviamente, aumenta ainda mais a ansiedade por opções de centro e a responsabilidade dos que mereçam ser chamados de líderes.
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