Valor Econômico
Além das reformas para melhorar a segurança jurídica, facilitando a recuperação de créditos em atraso, é necessário incentivar a competição no setor bancário e vigilância contra possíveis conluios
A atividade bancária e o setor financeiro são
fundamentais para o progresso econômico e social de uma sociedade. Em
particular, não há economia desenvolvida sem um setor financeiro eficiente e
uma elevada proporção de crédito em relação à renda.
Apesar de correlação não implicar
necessariamente em causalidade, a teoria econômica ajuda a entender o papel dos
intermediários financeiros no desenvolvimento econômico.
O progresso das nações depende de inovações e investimentos, os quais têm retornos incertos. A capacidade de uma economia de financiar tais investimentos depende de como os intermediários financeiros transferem recursos de agentes econômicos que poupam seus recursos, não têm ideias inovadoras ou não desejam correr riscos, para os indivíduos e empresas que, no seu "espírito animal", produzem inovação e investem, aumentando a capacidade produtiva, gerando emprego e renda.
É impressionante como os bancos criam
diversos produtos por meio da intermediação financeira, transformando inúmeros
depósitos de baixo valor, que podem ser sacados no curto prazo, em empréstimos
de alto valor que serão pagos, de forma incerta, apenas no longo prazo. Nesta
importante transformação de tamanho, risco e maturidade dos passivos e ativos,
está exatamente a vulnerabilidade dos bancos, os quais precisam ser regulados
para evitar riscos sistêmicos à economia.
A regulação e a supervisão bancária
determinam o escopo dos intermediários financeiros, o capital próprio requerido
no balanço e as reservas compulsórias para cada depósito. Entre 1933 e 1999,
sob o Glass-Steagall Banking Act de 1933, os bancos nos Estados Unidos que
recebiam depósitos estavam limitados em seu escopo, podendo atuar apenas no
empréstimo direto a consumidores e empresas, sem permissão para operar na
compra e venda de ações e outros instrumentos financeiros.
A regulação limita a alavancagem e a
atividade dos bancos e, portanto, pelo menos no curto prazo, a lucratividade do
setor. Consequentemente, os bancos fazem constantemente lobby para relaxar a
regulação. Afirmam que é custosa e eleva o preço de seus serviços, como o
spread bancário, que mede a diferença entre as taxas de juros de empréstimos e
de depósitos, prejudicando os produtores e consumidores, afetando negativamente
a atividade econômica.
Por outro lado, quando sujeitos ao risco de
falência, geralmente devido à má gestão de seus ativos, os bancos em geral
recebem suporte estatal para evitar o contágio para outros bancos e uma crise
financeira mais profunda. Quanto maior for o banco, maior é o risco de contágio
e, portanto, mais elevada é a chance de suporte com recursos do contribuinte em
tempos de crises.
Há várias barreiras à entrada na atividade
bancária, a qual, em geral, é relativamente concentrada. De 2000 até 2021, a
concentração bancária no Brasil aumentou consideravelmente, conforme indicado
no gráfico abaixo. A fração total de empréstimos dos cinco maiores bancos do
país passou de 50% em 2000 para cerca de 80% em 2021. Tanto o setor privado
bancário ficou mais concentrado com as fusões do HSBC com o Bradesco e
do Unibanco com o Itaú, quanto houve o aumento da participação no total de
empréstimos da Caixa Econômica e do Banco do
Brasil. A concentração bancária, medida por este indicador de
participação dos cinco maiores bancos no total de empréstimos, é 10 e 30 pontos
percentuais mais elevada no Brasil do que no México e nos Estados Unidos,
respectivamente.
Em alguns tipos de empréstimos, como no
cartão de crédito, a concentração bancária tem diminuído com a emergência de
novos bancos e fintechs, como o Nubank, que em aproximadamente uma década teve
um impacto significativo no mercado de cartões de crédito do país, oferecendo
serviços bancários com baixo custo de entrada.
Apesar do nível de spread bancário no Brasil
ainda ser um ponto fora da curva quando comparado com países de desenvolvimento
semelhante ao nosso, como mostrado no gráfico abaixo, o spread bancário médio
no país tem diminuído e caiu quase 10 pontos percentuais nas últimas duas
décadas.
A insegurança jurídica e a baixa recuperação
de créditos em atraso são fatores essenciais para explicar os elevados spreads
bancários no país, mas não são tão diferentes no Brasil em comparação com o
México, como ilustrado no gráfico abaixo. No entanto, mesmo em linhas de
crédito com taxas de inadimplência muito baixas, como de empréstimos
consignados, o spread bancário no país é elevado em comparação com os padrões
internacionais.
Parece-me que a questão do risco sistêmico em
nosso setor bancário é de segunda ordem quando comparada com a questão do alto
custo financeiro de nossos empréstimos.
Não parece haver soluções imediatas e
sustentáveis para o elevado preço do crédito em nosso país. Além das reformas
para melhorar a segurança jurídica, facilitando a recuperação de créditos em
atraso, é necessário incentivar a competição no setor e sermos vigilantes com
possíveis conluio entre os bancos. O Banco Central introduziu várias inovações
e mudanças importantes, que tendem a aumentar a competição bancária, como o
Pix, o crédito positivo e a portabilidade de crédito. É importante avançar
nesta direção, aprofundando e melhorando efetivamente algumas medidas, como a
portabilidade da conta salário e o aumento da oferta de crédito livre.
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