quinta-feira, 8 de agosto de 2024

Maria Cristina Fernandes - A chance de o governo sair das cordas

Valor Econômico

Cerco do Judiciário às emendas parlamentares cobrará um preço mas é o que há para hoje se o Executivo quiser sair das cordas

No dia seguinte ao garrote que o ministro do Supremo Tribunal FederalFlávio Dino, colocou nas emendas parlamentares pelo descumprimento dos requisitos de transparência e rastreabilidade, o Tesouro bloqueou R$ 3 bilhões que seriam destinadas às emendas de comissão e R$ 1,2 bi devido àquelas de relator. Esses R$ 4,2 bilhões excedem o contingenciamento de R$ 15 bilhões imposto pelo arcabouço fiscal.

Na tarde desta quarta, o procurador-geral da República, Paulo Gonet, fechou o cerco. Entrou com uma ação para sustar o pagamento de emendas Pix, aquelas que são da dotação individual dos parlamentares e vão direto para o caixa das prefeituras sem convênios que permitam o acompanhamento mais transparente da execução.

O cerco sobre o Congresso oferece ao presidente, que reúne hoje seu ministério, uma oportunidade de sair das cordas. O semestre anterior à eleição das mesas do Congresso sempre oferece uma chance de o Executivo ganhar governabilidade ou afundá-la de vez. Funciona mais ou menos como as eleições legislativas de meio de mandato nos EUA. No cerco em questão, operado pelos 11 votos do STF, crescem as chances de o Executivo ganhar governabilidade.

De instrumento capaz de dar eficácia ao atendimento parlamentar às demandas de seu eleitorado, as emendas transformaram o Congresso num governo paralelo. Tanto pelo volume - que aumenta com o crescimento da receita - quanto pela maneira como são executadas. Por serem, em grande parte, impositivas e independentes da ação do governo, autonomizaram os parlamentares.

Com o bônus de executar o Orçamento sem o ônus de prestar contas, senadores e deputados não poderiam desejar outra coisa senão manter tudo como está. Por isso, a decisão de Dino, neste momento em que a campanha municipal e pela sucessão das mesas esquenta, é tão crucial. Subverte por completo a ordem estabelecida no Congresso.

Se alguém tem dúvida que leia a resposta à decisão de Dino de mandar o Legislativo identificar os autores das emendas de comissão. “O Congresso não tem como colaborar”, informa a ata do encontro que sucedeu à decisão do ministro. Ou seja, o Legislativo reconhece, formalmente, que, de fato, estava descumprindo a decisão da ex-ministra Rosa Weber que Dino resgatou.

Basta ver o efeito do chamado “orçamento secreto” sobre a eleição dos parlamentares em 2022. A votação do deputado Arthur Lira (PP-AL) saltou 53% com o incremento da rubrica no governo Jair Bolsonaro. Foi a presidência da Câmara que o projetou? O que dizer então dos 69% a mais de votos de seu maior aliado, Elmar Nascimento (União-BA), entre 2018 e 2022, ou da votação 46% maior de Johnathan de Jesus no período?

O feito do parlamentar do Republicanos de Roraima foi retribuído com sua indicação, por Lira, para o Tribunal de Contas da União. Há um ano e meio no cargo, ainda não explicou suas próprias contas. Foi a conquista de mandato mais cara de 2022, se considerada a fatia do orçamento secreto que lhe foi destinada: R$ 7,7 mil por voto nas contas do jornalista Breno Pires, da “Piauí”.

A esta fartura, some-se a liberalidade de poder mandar emendas para fora do Estado que os elegeu, outro expediente proibido por Dino. Mais do que uma generosidade federativa, é uma troca de benesses cruzada, liderada pelo Amapá de Davi Alcolumbre (União), que permite o domínio dos caciques sobre as bancadas e máquinas partidárias do país que garantirão a recondução de seus grupos nas mesas.

Tão importante quanto a decisão de Dino é a movimentação no Judiciário no tema. Primeiro veio a decisão do ministro Gilmar Mendes, que era relator da ação da Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo contra as emendas Pix. Ele acabou por convergir com a Abraji no pedido para que Dino, além do orçamento secreto, assumisse mais esta.

Como Mendes não é de abrir mão de poder, especialmente em relação ao Congresso, parece claro que há uma convergência do STF em torno de Dino. Some-se a isso a ação do PGR de mesmo teor. Gonet, que chegou ao cargo com apoio de Mendes e Alexandre de Moraes, apresentou a ADI por temer o “déficit de legitimidade” daquela da Abraji

É uma situação muito distinta daquela de 2022, quando Mendes liderou a modulação da decisão da ex-ministra Rosa Weber que acabou permitindo seu descumprimento. Dino desenterra aquela ação num momento em que o Congresso se prepara para eleger os exércitos de prefeitos e vereadores dos quais se valerá para a renovação de seus mandatos em 2026.

De lá pra cá, evidenciou-se que o cerco do Judiciário ao bolsonarismo não foi capaz de asfixiá-lo. Ficou claro que, nesta tarefa, não é possível prescindir da política, desde que os instrumentos para isso lhe estejam disponíveis. Noves fora o combate às notícias falsas e o avanço do crime organizado, os resultados das eleições municipais não são ditados pelo Judiciário, mas o acesso do Centrão a recursos de poder o é.

Se o PL, como se prevê, avançar nos municípios, ao Centrão não restará alternativa senão franquear ao bolsonarismo espaços na mesa diretora e no acesso aos recursos que moldarão, em grande parte, as futuras bancadas. A configuração da Câmara e ao Senado em 2027 determinará, em grande parte, os limites do STF, seja nas decisões monocráticas (em tramitação na Câmara), seja nos pedidos de impeachment de ministros (protocolados no Senado).

É sobre esta paisagem que se abrem as janelas do Executivo a partir do cerco ao Legislativo. É mais um capítulo da aliança com o Judiciário. Haverá um preço a pagar, mas é o que há para hoje se o objetivo é sair das cordas.

5 comentários:

rodrigo disse...

Muito bom.

Daniel disse...

Maria Cristina é craque! Medalha.de ouro com este artigo!

Sergio Gonzaga de Oliveira disse...

Na verdade, está se tentando salvar um presidencialismo falido. Está na hora de mudar para o semipresidencialismo! O Congresso quer governar? Que assuma a responsabilidade perante os eleitores do sucesso ou fracasso das políticas públicas.

ADEMAR AMANCIO disse...

Vamos sair das cordas,rs.

hisayo nanami disse...

A HORA É AGORA.
OU PÕE FOGO EM LIRA, OU DÁ CORDA PRA LIRA SE ENFORCAR

DINO É GRANDE, É GORDO, MAS NÃO É SAURO!
TOMA, PAPUDOS!

QUEM É MERVAL PERTO DE MARIA CRISTINA FERNANDES...
VAMU QUERÊ A PRESIDÊNCIA DA ABL, TAMÉN, PR' ELA!!!

FORA DAS CORDAS HÁ VIDA!
HE HE HE