O Estado de S. Paulo
O sucesso do governo Lula está intrinsecamente ligado ao sucesso do arcabouço fiscal
Com a vitória de Javier Milei e o fracasso
dos peronistas na Argentina, eis a lição que o governo Lula e o PT precisam
tirar: não podem mirar só nas eleições municipais de 2024, esquecendo o pleito
presidencial de 2026, o que requer inexoravelmente manter a credibilidade do
arcabouço fiscal nos próximos anos.
A vitória de Milei foi resultado da inflação
elevada, do desabastecimento de produtos (devido a congelamento de preços) e da
retração da economia. Tudo isso tem origem no descontrole fiscal argentino,
respingando na forte desvalorização cambial.
No Brasil, a credibilidade do arcabouço fiscal nos próximos quatro anos será decisiva para um impacto positivo nos preços dos ativos, especialmente para manter baixa a cotação do dólar. Isso será fundamental no controle das expectativas inflacionárias e na capacidade de o Banco Central reduzir a taxa Selic para um nível mais baixo possível.
Ou seja, o desempenho da economia brasileira
em 2026, ano da eleição presidencial, dependerá em grande parte do que
acontecer com o arcabouço fiscal, salvo, obviamente, algum choque no cenário
externo ou grave acontecimento inesperado no ambiente econômico ou político
brasileiro.
É bom lembrar que todo o ruído político no
mercado financeiro começou quando o presidente Lula disse que “dificilmente” o
governo cumprirá a meta de déficit zero no ano que vem. A explicação de
analistas é que isso exigiria um contingenciamento de cerca de R$ 53 bilhões do
Orçamento, em março de 2024: um valor politicamente inviável para Lula e o PT
em ano de eleição municipal. Diante da repercussão negativa, o governo recuou.
Agora, começa a prevalecer a interpretação do
ministro da Fazenda, Fernando Haddad, de que não se pode levar em conta apenas
a regra de bloqueio de até 25% das despesas discricionárias, mas que é preciso
seguir também o limite mínimo de crescimento das despesas, de 0,6% em termos
reais, como está previsto nas regras. Obedecendo aos dois parâmetros, Haddad
diz que o contingenciamento seria ao redor de R$ 23 bilhões. Um meio-termo
entre ele e o PT.
Manter a meta fiscal de déficit zero em 2024
– ou um rombo de 0,25% do PIB, conforme a banda prevista nas regras – é
importante, mas isso só não garantirá que o arcabouço ficará de pé até 2026.
O governo precisa também fazer ajustes pelo
lado das despesas, como rever as regras de crescimento dos gastos com saúde e
educação, sem depender só do aumento de receitas. O sucesso de Lula está
intrinsecamente ligado ao sucesso do arcabouço e, por tabela, ao de Haddad.
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