Prende e solta é incentivo aos criminosos
O Globo
Acusado de assassinar turista em Copacabana
havia sido libertado da prisão horas antes do crime
O assassinato do sul-mato-grossense Gabriel
Mongenot Milhomem Santos, de 25 anos, durante assalto na Praia de Copacabana na
madrugada de domingo embute várias tragédias numa só. Estudante de engenharia
aeroespacial, Gabriel era um dos milhares de fãs que vieram ao Rio assistir ao
show da cantora Taylor Swift.
Foi executado com uma facada no peito quando estava com quatro amigos na praia
mais famosa do Brasil, onde imaginava estar em segurança.
Tragicamente, não há acaso no crime. Os suspeitos são velhos conhecidos da polícia. Jonathan Batista Barbosa, de 37 anos, soma sete anotações criminais. Outro acusado, Anderson Henriques Brandão, de 43 anos, cinco. Roubos e furtos eram parte de suas rotinas. Às vésperas do assassinato, Jonathan havia sido preso com outro suspeito, sob acusação de furtar 80 barras de chocolate de uma loja em Copacabana. Mais um crime numa extensa folha corrida em que já constavam um duplo homicídio, tráfico de drogas, violência doméstica, flagrantes por roubo, furto e posse ilegal de arma de fogo.
No sábado, a Justiça havia lhe concedido
liberdade, determinando que não se aproximasse da loja onde praticara o furto.
Em vão. Depois do assassinato, foi preso a 250 metros dela. Na audiência de
custódia no sábado, quando ganhou liberdade provisória, a Justiça determinou
que comparecesse em juízo todo mês. Havia também uma ordem para que não se
ausentasse de casa por longo período sem autorização. Era impossível cumprir a
medida: ele vive na rua. Na explicação do Tribunal de Justiça, Jonathan e o
outro suspeito foram soltos porque o delito (furto dos chocolates) fora
cometido sem o emprego de violência ou grave ameaça, e o produto fora
recuperado e devolvido. Nenhuma menção a uma ficha policial suficiente para
justificar mais rigor.
A história do assassinato de Gabriel diz
muito sobre o claudicante sistema que deveria punir autores de crimes graves e
afastá-los do convívio em sociedade. A periculosidade de Jonathan é considerada
alta (como constava na Guia de Recolhimento de Presos). Embora suas sentenças
somem mais de 13 anos, nunca foi condenado a cumprir pena em regime fechado. O
outro acusado do assassinato, Anderson, coleciona anotações criminais por porte
de arma de fogo, posse de drogas, uso de identidade falsa, dirigir sem habilitação
e embriagado, entre outros delitos. Também nunca cumpriu pena.
Compreende-se que as polícias nem sempre
reúnem provas suficientes — ou consistentes — para a Justiça condenar os
acusados. As leis também oferecem brechas de que os criminosos se aproveitam.
Evidentemente, é preciso agir dentro desses limites. Mas o constante prende e
solta é sinal eloquente de que muitas vezes o crime compensa. Assaltantes sabem
que dificilmente serão punidos. Quando muito, receberão penas brandas. A
realidade tem mostrado isso. Policiais executam um trabalho de Sísifo, fazendo
força para empurrar morro acima a rocha que em segundos rolará morro abaixo.
Os três Poderes precisam refletir sobre isso.
A crise na segurança que fustiga o país também é resultado da leniência que
envolve legislação, Justiça e forças policiais. Não era improvável que Jonathan
e Anderson, uma vez em liberdade, voltassem a cometer crimes. Foi o exatamente
que aconteceu. O Estado precisa dispor de meios mais eficazes contra o crime.
Linchamento virtual de jornalista não combina
com governo democrático
O Globo
ANJ repudiou ataques contra profissional que
revelou encontros da ‘dama do tráfico’ em Brasília
A Associação Nacional de Jornais (ANJ) emitiu
nesta segunda-feira uma nota oportuna e necessária repudiando as tentativas de
intimidação contra o jornal O Estado de S. Paulo e sua editora de Política, a
jornalista Andreza Matais. Depois de ter revelado em reportagem o encontro da
mulher de um líder de facção criminosa com secretários do Ministério da Justiça
e parlamentares, Andreza foi submetida a ataques virulentos nas redes sociais,
promovidos por influenciadores e contas simpáticos ao governo, depois repercutidos
por autoridades.
“O uso de métodos de intimidação contra
veículos e jornalistas não se coaduna com valores democráticos e demonstra um
flagrante desrespeito à liberdade de imprensa”, afirma a ANJ. “Também evidencia
uma prática característica de regimes autocráticos de, com o apoio de
dirigentes políticos, sites e influenciadores governistas, tentar desviar o
foco de reportagens incômodas por meio de ataques contra quem as apura e
divulga.”
A presidente do PT, Gleisi
Hoffmann, e deputados governistas como Ivan Valente, Nilto Tatto e
Rubens Pereira Jr. endossaram conteúdo de uma publicação de inclinação petista
acusando Andreza de ter submetido jornalistas a assédio moral durante a
confecção da reportagem sobre a “dama do tráfico”. A única “prova” apresentada
para embasar acusação tão grave eram reproduções de telas do site do Ministério
Público do Trabalho que qualquer um pode preencher anonimamente.
Não foi a primeira vez que Andreza foi alvo
de perseguição por reportagens que desagradaram ao governo. Em outubro, sua
conta no portal gov.br foi invadida, e ela recebeu ameaças de que seus dados
pessoais seriam revelados em represália a notícias sobre o governo federal. Os
ataques começaram depois de outra reportagem, atribuindo à atuação do
presidente Luiz Inácio Lula da
Silva a liberação de recursos para a Argentina pagar dívidas com o FMI.
O uso do linchamento virtual para intimidar
jornalistas combina mais com autocracias do que com um governo eleito
empunhando o estandarte da democracia. Na corrida cotidiana para levar notícias
ao público, mesmo os melhores jornalistas erram. Publicações sérias como o
Estadão costumam retificar informações incorretas. Além disso, o Judiciário
dispõe de mecanismos eficazes para partes atingidas por reportagens
reivindicarem seus direitos. Nada — nem o fato de eventualmente errarem —
justifica ataques coordenados a jornalistas, muito menos a mulheres, situação
frequentemente contaminada pelo machismo.
Se há algo de positivo em todo esse episódio
lamentável, é a certeza de que a imprensa continua a cumprir seu papel de
fiscalizar os poderosos. Como afirmou Eurípedes Alcântara, diretor de
jornalismo do Grupo Estado: “A reação furiosa orquestrada nas redes sociais
contra jornalistas doEstadãoem nada diminui a qualidade da apuração da
reportagem sobre as intimidades da dama do tráfico com altos funcionários
públicos. Ela mostra apenas a incapacidade de certos setores de conviver com o
jornalismo independente”.
Recuperação judicial pode superar marca da
pandemia
Valor Econômico
Vencem neste ano muitas linhas especiais
liberadas pelo governo quando o país parou por causa da covid-19
Se for mantido o ritmo atual de mais de 100
pedidos de recuperação judicial por mês, este ano vai superar a marca da
pandemia. De janeiro a outubro, a Serasa Experian contou 1.128 pedidos no país,
mais do que os 833 registrados em todo o ano passado. No auge da pandemia, em
2020, foram contabilizadas 1.179 recuperações judiciais.
O recorde ainda pertence ao ano de 2016, na
esteira da crise que culminou no impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff,
quando as recuperações judiciais somaram 1.863. Mas não deixa de ser
preocupante. Um dos motivos é que geralmente há um efeito cascata: quando uma
empresa pede recuperação extrajudicial, em especial se tiver grande porte,
outras enfrentam problemas. Foi o que aconteceu com a crise da Americanas, que
colocou em dificuldade outras varejistas e uma série de companhias que operavam
no seu marketplace e provocou ondas de turbulência no mercado financeiro,
reduzindo a oferta de crédito e elevando os juros para todas.
O cenário macroeconômico contribuiu para o
grande número de pedidos de recuperação judicial neste ano. Um dos fatores foi
a alta dos juros. O juro básico tinha caído a 2% durante a pandemia. Mas foi
subindo depois e atingiu o pico de 13,75% em agosto de 2022, nível em que
permaneceu por um ano. Somente em agosto de 2024 é que começou a ser reduzido.
Mas ainda está em nível elevado, de 12,25%.
A taxa de juros do crédito para empresas
lastreado em recursos livres, de 11,6% ao ano em dezembro de 2020, chegou a
24,9% em janeiro deste ano, influenciada pelo estouro do caso Americanas e pela
expectativa com a mudança de governo. Apesar do recuo da Selic, o juro do
crédito diminuiu pouco, para 22,9% em setembro, dado mais recente do Banco
Central (BC).
Já a inadimplência entre as pessoas jurídicas saltou de 1,4% em dezembro de 2020 para 3,4% em setembro, o pico desse período. Desenvolveu-se até o negócio de gestoras de situações especiais, as “special sits”, focadas em comprar créditos de empresas em dificuldades, que devem irrigar o mercado com R$ 10 bilhões a R$ 15 bilhões neste ano (Valor, 6/11).
O número de recuperações judiciais também
cresce com o vencimento neste ano de muitas linhas especiais liberadas pelo
governo na pandemia. Muitas empresas que tomaram crédito em condições especiais
na época não conseguem saldar os compromissos agora. Em um dos escritórios
especializados nesse tipo de causa, 70% das dívidas dos clientes estão
relacionadas à linha do Fundo Garantidor para Investimentos.
As empresas contavam com a recuperação da
economia na saída da pandemia para pagar seus compromissos. No entanto, a
expansão ocorrida não foi suficiente. Depois de crescer 5% em 2021, o PIB
aumentou 2,9% em 2022 e deve repetir a dose neste ano. Já para 2024 a previsão
é de expansão de 1,5%.
A desaceleração da economia e a manutenção
dos juros em patamares ainda elevados são dois motivos que sustentam a previsão
de que as recuperações judiciais podem piorar e ainda crescer até meados do ano
que vem, antes de melhorar.
Nem todos os casos de recuperação judicial
anunciados neste ano se assemelham ao da Americanas, que reconheceu fraudes
bilionárias no balanço publicado há poucos dias, com atraso de 11 meses. O
prejuízo líquido de 2022 foi de R$ 12,9 bilhões; e o resultado corrigido de
2021 passou de lucro de R$ 731 milhões para prejuízo líquido de R$ 6,23
bilhões. O patrimônio líquido ficou negativo em R$ 26,6 bilhões ao fim de 2022,
com os ajustes extraordinários no balanço. O auditor independente BDO RCS se
negou a opinar sobre as demonstrações financeiras da Americanas, o que pode
atrapalhar a conclusão do plano de recuperação judicial da rede de varejo.
Apenas a Samarco Mineração, envolvida na tragédia do rompimento da Barragem do
Fundão, em Mariana (MG), em 2015, tem um passivo a descoberto maior do que a
Americanas, de R$ 71,95 bilhões.
De acordo com os dados da Serasa Experian, as
empresas de menor porte são as que mais buscam a recuperação judicial - 65% dos
pedidos feitos de janeiro a outubro. As médias fizeram 25%; e as grandes, 10%.
Há concentração em serviços e comércio (72,5%), e menor proporção de indústrias
(18,6%) e setor primário (8,9%).
A revisão da Lei da Recuperação Judicial, que
entrou em vigor em 2021, trouxe melhorias. Uma das mais citadas em pesquisa
feita pela Deloitte - por 57% das empresas e 38% dos especialistas consultados
- é a prioridade de pagamento dada a quem empresta à pessoa jurídica em
recuperação judicial pelo mecanismo de “dip financing”.
Mas o processo segue muito longo, o que reduz
as chances de sobrevivência empresarial. Segundo o Banco Mundial, uma
recuperação judicial leva em média quatro anos no Brasil, em comparação com 2,5
anos na média mundial. De toda forma, pedir recuperação judicial nem sempre é
boa saída. O Monitor RGF de Recuperação Judicial, desenvolvido pela RGF &
Associados, mostrou que pouco mais da metade das empresas que saíram da
recuperação no terceiro trimestre voltou a operar. Um pouco menos da metade
faliu ou fechou as portas.
Petrobras em disputa
Folha de S. Paulo
Pedido de ministro por redução de preços
escancara intervencionismo petista
O controle da Petrobras foi um item
importante da campanha eleitoral de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e ainda é
uma tentativa de política do presidente da República, da maioria de seus
ministros e assessores relevantes na área econômica e de seu partido.
Dado que a petroleira é uma empresa mista com
maioria estatal, o debate sobre o que o governo pode ou não fazer de suas
diretrizes tem cabimento —em tese.
No mundo real, entretanto, o programa petista
se baseia em intervenções nos preços, em diminuir ou acabar com as normas que
restringem as nomeações para a direção e, no limite, definir o projeto de
prioridades e investimentos de acordo com os interesses mais imediatistas do
Planalto.
Lula nomeou para o comando da companhia um
ex-senador do seu partido com uma carreira política dedicada a assuntos do
petróleo, Jean Paul Prates. Não obteve do companheiro, porém, as medidas que
julga adequadas, ao menos na velocidade desejada.
Embora de fato pareça inclinado a facilitar
nomeações políticas para a diretoria, o presidente da Petrobras se rendeu a
alguma racionalidade, às restrições da Lei das Estatais e às pressões de uma
diretoria mais técnica.
A insatisfação governista se tornou pública
de modo vexatório desde o final da semana passada, com um bate-boca entre o
chefe da pasta de Minas e Energia, Alexandre Silveira (PSD), e Prates. O ministro
quer mais redução de preços. De fato, quer intervir no plano de
investimentos da companhia, que seria divulgado nesta semana.
Para isso conta com o apoio de Rui Costa
(Casa Civil), que almeja o "abrasileiramento" dos preços da
petroleira e investimentos que colaborem com o programa econômico de Lula
—Costa também é apontado como o principal adversário no governo da política
econômica de Fernando Haddad.
Em resposta, Prates argumentou, com base na
Lei das Estatais e no estatuto da empresa, que intervenções em preços, ou
outras que desviem a Petrobras do objetivo da rentabilidade, demandam
contratos com o governo que estipulem também o eventual pagamento de futuras
perdas.
Como resultado, foi chamado ao Palácio por
Lula para uma reunião com outros ministros. Sua cabeça parece a prêmio, por não
se adequar à linha justa do partido.
Depois de desastres, em especial na Petrobras
sob Dilma Rousseff, aprovou-se a Lei das Estatais, com o propósito de evitar
interferências políticas ineptas em empresas públicas. Lula e o PT querem
derrubar essa limitação a seu poder, em nome do bolso popular e do
"desenvolvimento nacional".
Não aprenderam nada, esqueceram tudo e querem
reinventar a roda do fracasso.
Privilégio adquirido
Folha de S. Paulo
Pensões para ex-governadores, examinadas pelo
STF, são iniquidade escandalosa
Além de dispendioso e deficitário, o sistema
previdenciário brasileiro é repleto de injustiças que agravam nossa vergonhosa
desigualdade de renda. Reformas recentes, sobretudo a aprovada em 2019,
buscaram a duras penas uma correção das regras, mas velhas distorções ainda
teimam em vir à tona.
Um exemplo quase caricato, não fosse
escandaloso, é o das generosas pensões vitalícias concedidas a ex-governadores
e seus dependentes —pagas com dinheiro da sociedade, com base em legislações
estaduais, sem nenhuma sustentação financeira ou sentido social.
Segundo levantamento da Folha, ao menos 15
estados concedem a ex-dirigentes tal prebenda, que pode chegar a R$
37,6 mil mensais. Já um trabalhador comum costuma contribuir para a Previdência
por décadas para receber algo entre R$ 1.320, o salário mínimo, e R$ 7.507, o
teto do INSS.
No final da década passada, decisões do
Supremo Tribunal Federal derrubaram alguns desses privilégios inaceitáveis.
Entretanto só agora a corte firmou um entendimento a esse respeito.
Concluiu-se na segunda (20) julgamento de
ação impetrada em 2020 pelo então procurador-geral da República, Augusto Aras,
com o objetivo de extinguir os pagamentos. Depois de idas e vindas, houve ampla
maioria entre os magistrados para manter parte deles.
Pelo entendimento do ministro Gilmar Mendes,
seguido por 8 de seus hoje 9 colegas, as pensões concedidas antes de decisões
em contrário do STF devem ser mantidas, em nome da segurança jurídica. As
demais, não.
O argumento não chega a ser disparatado, mas
isso não torna menos acintosa a transferência de renda da sociedade para uma
elite que aprova leis em benefício próprio, afrontando os princípios
republicanos da igualdade, da moralidade e da impessoalidade.
Isoladamente, essas benesses parecem
significar pouco no universo de despesas previdenciárias do país. No entanto as
iniquidades do sistema têm alcance muito mais amplo, disseminadas entre
corporações estatais civis e militares.
A compreensão de que as regras gerais devem ser iguais para todos avança de forma acidentada no país —e num Judiciário acostumado a regalias. Que ao menos se firme a convicção de que direitos como os que o STF examinou não podem ser novamente concedidos.
A ‘democracia’ do PT é com aspas
O Estado de S. Paulo
Ao compartilhar acusação infundada contra
este jornal, o PT mostra que a prometida defesa da democracia não passava de
patranha. Os petistas sempre hostilizaram a imprensa livre
Não durou muito a farsa segundo a qual Lula
da Silva precisava ser eleito para, segundo suas palavras, “recuperar a
democracia neste país”. Bastou que a imprensa começasse a publicar notícias
desfavoráveis ao governo para que esses campeões da democracia voltassem a ser
o que sempre foram – a vanguarda da truculência. Para a seita petista, vale
tudo, até mentir e distorcer, para desmoralizar aqueles que ousam revelar os
malfeitos do governo de Lula.
No domingo passado, a presidente do PT,
Gleisi Hoffmann, usou suas redes sociais para atacar o Estadão, compartilhando
– como se fosse digna de crédito – uma suposta denúncia anônima contra o jornal
que teria sido apresentada no site do Ministério Público do Trabalho (MPT).
“Gravíssima denúncia feita ao MPT sobre a fabricação do ‘escândalo da dama do
tráfico’ pelo Estadão para fazer parecer que (o ministro da Justiça) Flávio
Dino é simpático ao crime organizado”, escreveu a presidente do PT. Ato contínuo,
todo o exército de militantes petistas na internet passou as horas e dias
seguintes a repercutir a patranha, sem qualquer cuidado a respeito da
veracidade do que ali se expunha.
Esse é o padrão de atuação dos petistas. Para
eles, nem é preciso que a informação seja verdadeira para que seja usada em
favor de seus propósitos autoritários, isto é, difamar o jornal que revelou que
a mulher de uma das lideranças do Comando Vermelho (CV) participou de reuniões
no Ministério da Justiça e Segurança Pública.
Ora, o Estadão nunca afirmou que Flávio Dino
era simpático ao crime organizado. Trouxe apenas fatos: Luciane Barbosa Farias,
mulher de Clemilson dos Santos Farias, conhecido como “Tio Patinhas” e um dos
líderes do CV no Amazonas, esteve no Ministério da Justiça, em março, para
reunião com o sr. Elias Vaz, secretário Nacional de Assuntos Legislativos, e em
maio, para reunião com o sr. Rafael Velasco Brandani, titular da Secretaria
Nacional de Políticas Penais (Senappen). Na reportagem que revelou o caso, publicada
no dia 13 de novembro, o próprio Ministério confirmou a presença de Luciane na
comitiva para as duas reuniões.
A atestar que o jornal fez apenas o seu
trabalho – trouxe fatos relevantes ao conhecimento do leitor –, o Ministério da
Justiça, no mesmo dia da publicação da reportagem, elaborou uma portaria
alterando as regras de acesso ao prédio. No entanto, o PT não gosta de
jornalismo independente. Diante da natural repercussão do caso, o partido de
Lula passou a atacar o jornal, como se a reportagem sobre as reuniões no
Ministério da Justiça fosse fake news.
Esse episódio serve para recordar que, por
trás da fachada de defensores da democracia, os petistas são e sempre foram
raivosos inimigos da imprensa livre. Desde os tempos da trevosa era petista no
poder, jornalistas são ameaçados de agressão por militantes do partido. Há toda
uma rede de veículos de comunicação a serviço do lulopetismo que se dedicam a
destruir a reputação de jornalistas e de veículos independentes. O bolsonarismo
certamente se inspirou nesse método do PT para, por sua vez, hostilizar a imprensa
e os jornalistas. O “gabinete do ódio” bolsonarista é filhote dos “blogs sujos”
– que recebiam generoso financiamento público dos governos petistas para atacar
desafetos do partido.
“O uso de métodos de intimidação contra
veículos e jornalistas não se coaduna com valores democráticos e demonstra um
flagrante desrespeito à liberdade de imprensa”, afirmou em nota a Associação
Nacional de Jornais (ANJ) sobre o vergonhoso ataque petista a este jornal.
“Também evidencia uma prática característica de regimes autocráticos de, com o
apoio de dirigentes políticos, sites e influenciadores governistas, tentar
desviar o foco de reportagens incômodas por meio de ataques contra quem as
apura e divulga”, disse a entidade.
Mas os petistas perdem tempo e energia. Desde
sua fundação, há quase 150 anos, este jornal nunca vergou diante da força bruta
dos inimigos da democracia, e não serão os arreganhos dos sabujos de Lula da
Silva que o intimidarão. Continuaremos a publicar tudo o que nosso jornalismo
apurar, a respeito deste ou de qualquer outro governo, pois a função da
imprensa responsável e livre é revelar aos cidadãos o que os poderosos querem
esconder. Isso sim é democracia – sem aspas.
A gramática do privilégio
O Estado de S. Paulo
Em nenhum lugar do mundo juízes têm tantos
privilégios como no Brasil. Além de férias de dois meses, terão a cada três
dias de trabalho um de folga, que pode se converter em dinheiro
A partir de agora, os juízes federais de 1.º
e 2.º graus que acumularem funções administrativas e processuais terão, para
cada três dias de trabalho, direito a um dia de folga. Ou, se eles preferirem,
poderão converter esse direito em mais dinheiro no contracheque no fim do mês.
O mais novo privilégio foi aprovado pelo Conselho da Justiça Federal (CJF),
cujo colegiado é formado por seis ministros do Superior Tribunal de Justiça
(STJ) e pelos presidentes dos seis Tribunais Regionais Federais (TRFs).
Eis a realidade do Judiciário brasileiro. Sua
alta cúpula, preocupada com a plena efetividade dos direitos no País e com a
crise social e econômica de tantas famílias brasileiras, decidiu que os
magistrados federais devem ter uma vida ainda mais distante da realidade dos
pobres mortais. Nada de trabalhar todos os dias da semana. Se um juiz exercer
juntamente com a atividade jurisdicional alguma função administrativa, a cada
três dias de trabalho ele pode tirar um dia de folga.
O mais novo privilégio tem nome pomposo:
instituto da licença compensatória pela cumulação de atividade jurisdicional
com o exercício de função administrativa. Segundo a conselheira Marisa Ferreira
dos Santos, presidente do TRF-3, o reconhecimento da licença é constitucional e
imperioso. Em que mundo vivem essas pessoas para afirmarem, sem ruborizar, que
o direito à folga de um dia para cada três dias de trabalho é uma necessidade,
“no interesse e na salvaguarda” de uma “das mais importantes instituições da
República brasileira”?
A escancarar a mentalidade de insatisfação
com os privilégios já adquiridos – sempre há disposição por mais um –, a
resolução do CJF determina que a nova folga não deve ultrapassar dez dias por
mês. Talvez o colegiado intua que, com a resolução aprovada, algum tribunal no
País seja capaz de elaborar alguma contabilidade criativa e atribuir mais de
dez dias de licença por mês a seus juízes. O céu é o limite para a casta dos
magistrados federais.
Escandalosamente antirrepublicana, toda essa
jogada foi feita sob o argumento da “equivalência” entre magistratura e
Ministério Público. No caso, em janeiro deste ano, o Conselho Nacional do
Ministério Público (CNMP), o órgão que deveria fiscalizar o Ministério Público,
estabeleceu para seus membros o direito à licença de um dia para cada três dias
de trabalho com acúmulo de funções. Agora, o CJF estendeu o privilégio aos
juízes federais. Na manobra, alegou que estava apenas cumprindo a Constituição
de 1988. Para eles, o artigo 129, § 4.º, segundo o qual se aplicam ao
Ministério Público, no que couber, os princípios e prerrogativas da
magistratura, significa equivalência de regalias.
Nas palavras da presidente do STJ e do CJF,
ministra Maria Thereza de Assis Moura, “para os integrantes da magistratura, a
importância do tratamento igualitário entre as carreiras (do Ministério Público
e do Judiciário)é de fácil percepção, além de estruturante para o fim de se
resguardar os postulados do Estado Democrático de Direito, (...) bem como para
atuar na defesa das instituições e dos direitos garantidos pela Constituição”.
Ninguém duvida de que os juízes facilmente percebem a importância da equivalência
de privilégios. A toda a hora recorrem a ela para angariar mais uma vantagem.
Difícil mesmo é a população entender a razão de tamanha diferença de tratamento
entre cidadãos brasileiros. Difícil mesmo é compreender por que, para o bom
funcionamento do Estado Democrático de Direito, juízes e membros do Ministério
Público devem ter o dobro de férias de todo o restante dos brasileiros. Para
piorar, tudo isso é feito sob anuência do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).
Além da injustiça em si e do aumento de
gastos públicos que a medida produz, é muito grave que uma evidente situação de
privilégio seja vista, por quem deve aplicar o Direito no País, como algo
correto e adequado. Isso significa que a bússola moral, cívica e legal da
cúpula do sistema de Justiça está avariada. Consideram-se, de fato, superiores
ao restante da população.
A desoneração da folha
O Estado de S. Paulo
Até que haja proposta de reforma tributária
sobre a renda, manter tal política é imperativo
O presidente Lula da Silva tem até amanhã
para tomar uma decisão sobre o projeto de lei que estende a desoneração da
folha de pagamento dos setores que mais empregam no País até 2027. Sem o
benefício, estarão ameaçados 9 milhões de empregos nas indústrias de confecção
e vestuário, calçados, couro, têxtil, construção civil, infraestrutura,
comunicação, tecnologia da informação, máquinas e equipamentos, call center e
transportes, entre outros.
Tal política tem sido um instrumento
fundamental para preservar os cada vez menos numerosos empregos formais que
ainda existem no País. Por meio da medida, as empresas podem substituir a
contribuição previdenciária de 20% sobre a folha de salários pelo recolhimento
de alíquotas de 1% a 4,5% da receita bruta, a depender do setor.
Adotada em 2011, a proposta nasceu para ser
uma ajuda temporária aos setores que não conseguiram se recuperar das
consequências da crise mundial de 2008. Mas, como se sabe, este não foi o único
percalço a que estes segmentos estiveram sujeitos nos últimos 12 anos, entre os
quais se incluem uma longa recessão e a pandemia de covid-19.
Passado o pior momento da emergência
sanitária, o País ainda precisa lidar com suas sequelas econômicas. A inflação
desacelerou, mas continua acima dos objetivos definidos pelo Conselho Monetário
Nacional (CMN). Para trazer a inflação de volta à meta, o remédio é a política
monetária conduzida pelo Banco Central (BC). Juros altos, no entanto, são
fatais para a maioria dos setores econômicos, sobretudo os que mais empregam
mão de obra.
No mundo ideal, o custo para contratação de
trabalhadores seria bem mais baixo. O governo, por sua vez, adotaria uma
política fiscal mais austera e condizente com a realidade das contas públicas.
O alinhamento das políticas fiscal e monetária reduziria a necessidade de o BC
manter a Selic tão elevada e proporcionaria condições mais favoráveis para o
setor privado atuar.
O Legislativo compreende esse contexto, tanto
que, em 2020, derrubou o veto do então presidente Jair Bolsonaro à prorrogação
da folha de pagamento, por 430 votos na Câmara e 64 no Senado. No ano seguinte,
o próprio governo firmou um acordo com os parlamentares para estender a
vigência da medida até 31 de dezembro de 2023.
A pouco mais de um mês do fim desse prazo, as
empresas aguardam uma sinalização por parte do governo para que possam manter
seus planos e orçamentos para o ano que vem. Politicamente, vetar a proposta
seria comprar uma briga desnecessária com o Congresso, que derrubaria o veto
sem qualquer dificuldade. Não convém testar a força da combalida articulação
política.
O governo preferia que o tema fosse tratado de forma ampla em uma segunda etapa da reforma tributária, que tratará dos impostos que incidem sobre a renda – proposta cuja necessidade este jornal defende. Mas até que esse debate esteja amadurecido e pronto para ser submetido à votação, tais setores não podem ficar desassistidos, sob pena de deixar milhões de trabalhadores à mercê da informalidade e do desemprego.
Democratização do ensino e a importância da
EaD
Correio Braziliense
Para muitos estudantes, a educação a
distância — especialmente em municípios longínquos do Brasil — pode ser a única
porta de entrada ao ensino superior, além de promover a inclusão social
Um cabo de guerra entre quem defende e quem é
contra o ensino a distância tem sido travado desde o ano passado. Mais
recentemente, a Secretaria de Regulação e Supervisão da Educação Superior
(Seres), órgão pertencente ao Ministério da Educação, abriu uma consulta
pública com o objetivo de debater alterações na Portaria Normativa nº 11/2017,
do MEC, que trata da oferta de cursos de graduação na modalidade de educação a
distância.
No entanto, entre as propostas apresentadas
pelo MEC diante da consulta pública, findada no último dia 20, está a
divulgação do relatório apresentado pelo GT EaD, instituído pelo ministério
para avaliar essa modalidade de ensino para cursos de graduação em odontologia,
direito, enfermagem e psicologia. A análise aponta a inviabilidade da EaD
nessas áreas, o que contribuiu para a decisão do ministro da Educação, Camilo
Santana, de suspender a autorização de cursos a distância em diversas áreas do
conhecimento, como biomedicina, terapia ocupacional, educação física e
farmácia, entre outros.
Por outro lado, a Associação Nacional de
Universidades Particulares (Anup) mapeou dados sobre a distribuição e o acesso
a esse modo de ensino e, ao comparar as modalidades de EaD e presenciais nos
3.009 municípios brasileiros onde há disponibilidade do ensino superior, a
associação identificou que, em 1.904 dessas cidades, os cidadãos dependem,
exclusivamente, da oferta de cursos a distância para que tenham formação
educacional em nível superior.
Além disso, dados publicados pelo Enade 2022
apontam que o modelo EaD será a primeira graduação para 80% dos estudantes. No
formato presencial, essa taxa cai para 60%. Desse grupo, 76% têm renda média de
4,5 salários mínimos. Já as faixas etárias no EaD são divididas da seguinte
forma: até 24 anos, 19%; entre 25 e 30 anos, 25,6%; de 31 a 40 anos, 33,7%; e
acima de 41 anos, 21,6%. No presencial, 52% têm idade até 24 anos; e os maiores
de 41 anos correspondem a 8,7%.
Outro apontamento importante é sobre a carga
de trabalho: 67% dos estudantes matriculados no EaD trabalham 40 horas ou mais
semanais, o que reforça que a modalidade de ensino a distância é uma
alternativa de estudo para quem precisa conciliar diferentes atividades.
Para muitos estudantes, a educação a distância — especialmente em municípios longínquos do Brasil — pode ser a única porta de entrada ao ensino superior, além de promover a inclusão social. O mais plausível, neste momento, seria um monitoramento maior, por parte do Ministério da Educação e dos organismos competentes, no sentido de ouvir diretores, professores e a comunidade estudantil para saber quais pontos precisam ser aperfeiçoados, o que deve ser substituído ou reforçado, mesmo porque os diplomas obtidos em cursos EaD têm o mesmo valor acadêmico que o documento decorrente de aulas presenciais. O que não pode ocorrer é que instituições sérias e de qualidade comprovada paguem por aquelas que não entregam o que oferecem.
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