Correio Braziliense
O grupo é integrado por militares formados
pelo Curso de Operações Especiais do Exército Brasileiro, treinados para atuar
nas missões sigilosas
Por unanimidade, os ministros da Primeira
Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) votaram para tornar réus mais 10
acusados de tentativa de golpe de Estado. O ministro Alexandre de Moraes foi o
primeiro a votar e liberou o coronel da reserva Cleverson Ney Magalhães e o
general Nilton Diniz Rodrigues por "falta de justa causa". Todos os
outros quatro integrantes da Primeira Turma o acompanharam. Foram rejeitadas
todas as chamadas "questões preliminares" apresentadas pelas defesas
dos acusados de integrar o Núcleo 3 da suposta tentativa de golpe de Estado.
Para Moraes, a denúncia não comprovou de maneira satisfatória a participação de Nilton Diniz Rodrigues, general que assessorava o ex-comandante do Exército Freire Gomes, e Cleverson Magalhães, que auxiliava o general Estevam Cals Theophilo Gaspar de Oliveira na trama golpista. Ambos foram acusados de agir para influenciar o Alto-Comando a aderir ao golpe.
A defesa do general da reserva Estevam Cals
Theophilo Gaspar de Oliveira alegou vícios na fase de investigação, por suposta
tentativa de desestabilizar psiquicamente o militar antes de seu depoimento à
Polícia Federal (PF). Moraes afirmou que a alegação não se sustenta: "Não
parece crível que um general de quatro estrelas do Exército Brasileiro, que
serviu no exterior, que foi feito refém das forças contrárias às forças de paz
da ONU, se sentiria desestabilizado com o comentário ou fala de algum delegado
da Polícia Federal", afirmou o ministro.
Como na análise das denúncias anteriores,
contra os acusados dos Núcleo 1, 2 e 4, o ministro Luiz Fux foi voto vencido na
preliminar sobre a competência. Para ele, como os investigados não ocupam mais
funções com prerrogativa de foro, o caso deveria ir para a Justiça de primeira
instância. E, uma vez reconhecida a competência do STF, Fux entende que a
análise deveria ficar sob responsabilidade do plenário.
Nove militares, a maioria "kid
pretos", e um policial federal agora são réus: Bernardo Romão Correa Netto
(coronel), Estevam Cals Theophilo Gaspar de Oliveira (general da reserva),
Fabrício Moreira de Bastos (coronel), Hélio Ferreira Lima (tenente-coronel),
Márcio Nunes de Resende Júnior (coronel), Rafael Martins de Oliveira
(tenente-coronel), Rodrigo Bezerra de Azevedo (tenente-coronel), Ronald
Ferreira de Araújo Júnior (tenente-coronel), Sérgio Ricardo Cavaliere de
Medeiros (tenente-coronel) e Wladimir Matos Soares (agente da Polícia Federal).
"Kids pretos" é o nome dado aos
militares formados pelo Curso de Operações Especiais do Exército Brasileiro,
treinados para atuar nas missões sigilosas, com ambientes hostis e
politicamente sensíveis. Eles integram a chamada "elite" do Exército.
Os militares recebem esse apelido por utilizarem gorros pretos em operações —
eles são caracterizados como especialistas em guerra não convencional,
reconhecimento especial, operações contra forças irregulares e
contraterrorismo.
Verde e Amarelo
Passam por treinamentos intensivos no Comando
de Operações Especiais, em Goiânia; no Centro de Instrução de Operações
Especiais, em Niterói, no Rio de Janeiro; e podem completar a formação em
Manaus, na 3ª Companhia de Forças Especiais. O programa existe desde 1957 e foi
inspirado no curso "Ranger", com destaque para o Batalhão de
"Special Forces", a principal unidade de infantaria leve e força de
operações especiais dentro do Comando de Operações Especiais do Exército dos
Estados Unidos.
Entre as ações elaboradas pelos indiciados
nesse grupo, segundo a Polícia Federal, havia um "detalhado planejamento
operacional, denominado "Punhal Verde e Amarelo", que seria executado
no dia 15 de dezembro de 2022 para assassinar os já eleitos presidente Lula e
vice-presidente Geraldo Alckmin. Conversas do policial federal Wladimir Matos
Soares com o advogado Luciano Diniz revelam que estava tudo planejado, mas o
projeto golpista não contou com o apoio do Alto-Comando do Exército.
"Bastava tão somente, para dar um susto,
dissolver o STF… Puf, acabou meu irmão. Como faz falta um Figueiredo. O Médici,
o Médici", diz o advogado. Matos responde que o plano estava pronto, mas
Bolsonaro fora "traído" pelo Exército. "A gente ia empurrar meio
mundo de gente, pô. Matar meio mundo. Estava nem aí cara." E acrescenta:
"O Alexandre de Moraes realmente tinha que ter tido a cabeça
cortada".
Wladimir Matos guardava todas as mensagens
escritas e em áudio, provas de crime, no notebook da Polícia Federal. Foi preso
com o computador, em novembro de 2024, no Rio. Matos havia sido deslocado para
a cidade porque 80% do efetivo da PF participava da segurança do G20, mas foi
deixado em uma posição periférica. Fazia parte da segurança do presidente Lula,
porém, já estava sendo monitorado pela PF.
Moraes destacou em seu voto que, assim como
aconteceu em outros países europeus e nos EUA, a tentativa de ruptura
institucional se baseia em ataque a instituições democráticas e não à
democracia diretamente. "Não só no Brasil, mas no resto do mundo, a
história mostra que a subversão hierárquica é característica de golpes."
O julgamento dos militares pelo STF tem como
questão subjacente o papel das Forças Armadas, um assunto que o Congresso evita
debater, sobretudo a doutrina de Defesa e a formação dos militares, na qual o
adestramento se sobrepõe à doutrina democrática.
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