Há um caso acontecendo na troca de ministros e no engasgo das relações do governo com o PMDB em que vale a pena prestar atenção.
Envolve o senador Eunício Oliveira e é emblemático de como o temperamento da presidente Dilma Rousseff e o comportamento do PT em relação aos aliados criam dificuldades para o governo.
Há coisas que Dilma não sabe fazer. Não tem familiaridade alguma com a política, por exemplo. Não ouve quem tem esse atributo e toca o barco como acha que deve, insistindo no erro e na ilusão de que uma hora ele leve ao acerto.
O caso é o seguinte: a presidente quer porque quer entregar a Eunício Oliveira, líder do PMDB no Senado, o Ministério da Integração Nacional. Ela já ofereceu de tudo, inclusive a pasta de "porteiras abertas", com liberdade para ocupação de cima abaixo.
Ele não quer, prefere disputar o governo do Ceará, onde está em primeiro lugar nas pesquisas. Isso foi dito diretamente a Dilma umas duas ou três vezes. Em uma delas, a conversa durou seis horas em Palácio e resultou em recusa.
Não se tem notícia de presidente da República que tenha levado tantos "não" repetidos e diretos. Em geral convites são precedidos de sondagens por intermédio de interlocutores abalizados. Há mediação, tentativa de convencimento, tudo para evitar que a autoridade maior passe pelo constrangimento de ouvir uma negativa assim frente a frente.
Pois Dilma Rousseff ouviu e ao que consta ainda não desistiu de oferecer o Ministério da Integração a Eunício. Não ao PMDB, que aceitaria o cargo de bom grado para o senador Vital do Rego, mas para Eunício Oliveira.
E por que essa obsessão da presidente pelo nome do líder do partido no Senado? Por que ele é um especialista na área? Por que nos dez meses que teria à frente da pasta o Rio São Francisco teriam finalmente suas águas transpostas?
Nada disso. Dilma quer resolver um problema dela no Ceará. Eleitoral, evidentemente. O PT local está fechado com os irmãos Cid e Ciro Gomes. Tirando o PMDB da disputa e entregando o ministério a Eunício, Dilma forçaria o partido a entrar na aliança e montar um palanque governista único para ela no Estado.
Se o senador cearense, ao contrário, insistir na candidatura a governador, para se viabilizar necessariamente terá de fazer alianças com a oposição. Vale dizer, PSDB e PSB. A hipótese do palanque duplo está fora de cogitação.
O PMDB está vacinado com o que ocorreu na Bahia em 2010. Foi feito um acordo redigido pelo hoje ministro Moreira Franco e assinado pelos então coordenadores da campanha de Dilma, José Eduardo Cardozo, José Eduardo Dutra e Antonio Palocci, pelo qual o governo federal daria apoio às candidaturas de Jaques Wagner, do PT, e Geddel Vieira Lima, do PMDB.
A candidata inclusive esteve na convenção que lançou Vieira Lima ao governo do Estado. No meio do caminho mudou de ideia. Deixou o aliado a ver navios e anunciou que na Bahia o candidato do Planalto era o petista Wagner. Com esse exemplo em tela o PMDB não confia mais em promessas de apoio compartilhado.
Esse tipo de comportamento tem dificultado alianças regionais entre os dois partidos. O esforço em relação ao Ceará em boa medida se deve ao fato de que o PT sabe que não dá para brincar com o Nordeste, onde a dianteira não será a mesma. As coisas não andam bem no Maranhão, em Pernambuco há Eduardo Campos para tirar votos e na Bahia o PMDB será oposição.
Do lado do senador Eunício, o ministério não seria o melhor negócio. Primeiro, nesta altura ficaria mal no eleitorado cearense, pois trocaria a chance de governar o Estado por um cargo de ministro. Posição que já ocupou no governo Lula.
Em segundo lugar, a disputa eleitoral não representa risco para ele, cujo mandato de senador vai até 2018. Ou seja, se for derrotado tem margem de segurança.
Se Dilma fizer o convite de novo, no PMDB a aposta é que ouvirá um não mais uma vez. E fica a dúvida: se o risco é grande de perder, o que ganha em insistir? Coisa de quem não é do ramo.
Fonte: O Estado de S. Paulo
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