quinta-feira, 29 de maio de 2025

Moraes e a tempestade perfeita - William Waack

O Estado de S. Paulo

As sanções americanas vêm de longe, são amplas e muito perigosas

As sanções que o governo americano está anunciando contra quem considere “cúmplice de censura a americanos” são muito mais abrangentes e precedem a volta de Trump à Casa Branca. O nome de Alexandre de Moraes monopoliza o noticiário brasileiro a respeito de sanções, mas ele não está no centro delas.

Há dois componentes que sustentam essa política, e o que se acentuou com Trump foi o ideológico. A ideia de que é necessário atacar por meios financeiros quem o governo americano identifique como “adversário” já vem desde a época de Obama. É um sistema de ferramentas que se poderia abrigar sob o título “defesa de interesses nacionais”.

Sucessivos governos americanos fizeram uso extensivo da centralidade desse país no mundo digital e financeiro. Formouse uma espécie de “império subterrâneo” (título, aliás, de livro de grande sucesso), que estabeleceu controles eficazes de monitoramento de informações e análise de dados por meio dos “hubs” da internet – os principais deles nos Estados Unidos.

Também a centralidade dos Estados Unidos no sistema financeiro internacional virou arma poderosa tanto no sentido comercial quanto de segurança nacional (ou o que seja entendido como tal). Uma de suas origens está no combate às redes financeiras informais de grupos terroristas iniciado após o 11 de Setembro, mas se ampliou para sufocar países como Rússia, Irã e a própria China.

Para se entender melhor o componente ideológico é necessário ler com atenção o discurso que o vice-presidente americano pronunciou em Munique no começo do ano. Na compreensão dessa vertente política, as elites tecnocráticas e “globalistas” que tomaram o controle das democracias liberais, especialmente na Europa, passaram a perseguir e censurar grupos políticos contrários.

Juntando-se a esses fatores a também velhíssima disputa entre as big techs e autoridades regulatórias em vários países, com ênfase na União Europeia, temos uma tempestade perfeita. Alexandre de Moraes, o STF e o inquérito das Fake News se encaixam milimetricamente na forma como o atual governo americano enxerga a questão do ponto de vista ideológico, comercial, regulatório e, a partir da visão da Casa Branca, de “Make America Great Again”.

No caso específico de Eduardo Bolsonaro o governo brasileiro escolheu uma resposta via instituições, e elas foram envolvidas no turbilhão político. Não há uma saída estritamente “jurídica” para tudo o que está envolvido, e o que seria uma saída “política” se tornou imprevisível dado o que se conhece do modus operandi de Donald Trump.

É melhor se preparar para o impacto.

 

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