sábado, 24 de dezembro de 2022

João Gabriel de Lima* - Hora de dar um baile no racismo

O Estado de S. Paulo

Que o combate ao racismo seja realmente prioridade no próximo governo

A esplêndida série com as melhores fotos da Copa do Catar, publicada pelo jornal britânico The Guardian, destaca, entre outras imagens, a dança de Vinícius Júnior depois do golaço que marcou contra a Coreia do Sul. Ao seu lado estão Raphinha, Paquetá e Neymar. Na legenda, o jornal estampa a frase que se tornou um slogan: “Dance, Vini, dance”.

A celebração tem um histórico. Em setembro deste ano, após dançar na comemoração de um gol de seu time, o Real Madrid, Vinícius Júnior foi vítima de um comentário racista na televisão espanhola. Na partida seguinte, os jogadores do Real Madrid, em solidariedade ao craque, deram um baile no racismo e dançaram junto com ele. Do gesto político surgiu a hashtag #Bailavinijr.

Perdemos a Copa por uma razão simples: havia vários times melhores e mais experientes que o nosso. Não faltou, no entanto, quem jogasse a culpa na dança dos jogadores. Comentários racistas como os que Vinícius Júnior ouviu na Espanha pipocaram, tristemente, nas redes sociais brasileiras.

“O Brasil é o que é no futebol por causa dos atletas negros. Quando vencemos, temos orgulho de ser uma sociedade multirracial. Mas o racismo volta sempre que o Brasil é derrotado”, diz Marcelo Carvalho, fundador do Observatório da Discriminação Racial no Futebol. Ele é o entrevistado no minipodcast da semana.

Mais que pentacampeões, somos também o País com maior número de vencedores da Bola de Ouro – o prêmio para melhor jogador numa Copa do Mundo. Foram sete: Leônidas (1938), Zizinho (1950), Didi (1958), Garrincha (1962), Pelé (1970), Romário (1994) e Ronaldo (1998). Todos negros. Aliás, os únicos jogadores negros contemplados com o prêmio – até os anos 1970, as Copas eram reduto branco e europeu, e o Brasil era a honrosa exceção multirracial.

A vítima mais dramática do racismo que acompanha as derrotas é o goleiro Barbosa, culpabilizado pelo revés frente ao Uruguai em 1950. Nos anos 1960, Lourival de Almeida Filho, goleiro negro do Corinthians, recebeu o apelido de Barbosinha. Foi igualmente vítima de racismo após uma derrota para o arquirrival Palmeiras.

O filho de Barbosinha, Silvio Almeida, é hoje um dos maiores intelectuais brasileiros e acaba de ser nomeado ministro dos Direitos Humanos. Vinícius Júnior criou uma fundação voltada para crianças carentes em sua cidade natal, São Gonçalo. Que o combate ao racismo seja realmente prioridade no próximo governo. E que Vinícius Júnior, maior estrela de uma geração talentosa que promete brilhar na próxima Copa do Mundo, siga jogando seu futebol maravilhoso. Todos bailaremos com ele.

*Escritor, professor da Faap e doutorando em ciência política na Universidade de Lisboa

2 comentários:

Anônimo disse...

Oxalá!

ADEMAR AMANCIO disse...

Também vi gente séria criticando,se o Brasil tivesse ganho a copa os dançarinos estariam sendo elogiados.