quarta-feira, 18 de setembro de 2024

Igor Gielow - Debate mostra dilema da política após Marçal e a cadeirada

Folha de S. Paulo

Baixaria do influenciador e rivais é vitoriosa na campanha; calmos, candidatos têm pouco a dizer

Após o paroxismo atingido com a cadeirada de José Luiz Datena (PSDB) em Pablo Marçal (PRTB) no domingo (15), os espectadores do novo encontro entre os candidatos à Prefeitura de São Paulo dificilmente veriam algo pior.

debate RedeTV!/UOL não chegou lá, mas permitiu algumas conclusões sobre o atual estado da política brasileira. A principal, a contaminação da política tradicional pelo fenômeno Marçal, que é uma mutação ainda mais agressiva e desassombrada do populismo trazido ao poder em 2018 por Jair Bolsonaro (PL).

Basta ver as inserções de todos os candidatos no rádio e TV, para não falar na terminologia de delegacia que domina a retórica de todos. Algo especialmente lamentável em uma campanha em que a "quebrada" e a periferia, marcadas por estigmas preconceituosos associados à violência, são o campo quase único de disputa de votos na propaganda.

Enquanto Guilherme Boulos (PSOL) fazia uma dobradinha com Datena para isolar Marçal, dando ao tucano oportunidade para falar sobre o infame espetáculo no debate de domingo na TV Cultura, Nunes e Marçal foram ao ringue da lama proposto pelo nome do PRTB.

Ambos abraçaram a apoplexia, só para serem contidos pela mediadora. Nunes precisa atacar Marçal, que lhe rouba votos, mas arrisca ver sua baixa rejeição (19%) subir ao fazer o jogo do rival.

Melhor para Boulos, que também foi objeto de altercação com o prefeito do MDB, que mira o segundo turno já com uma rejeição alta (37%). Mas quando até Tabata Amaral (PSB) entra na discussão, ainda que de forma civilizada, o sinal é outro: o marçalismo, se há tal coisa, já levou toda a campanha de roldão no que diz respeito ao tom.

A deputada, inclusive, foi levada ao ringue por Marina Helena, negando uma acusação sobre uso de avião particular. A monocórdica candidata do Novo estreou no mundo das denúncias, sem grande efeito —embora a questão obrigue escrutínio desagradável para quem se vende como vestal, como Tabata.

De resto, as pesquisas diárias por telefone das campanhas, o chamado tracking, apontaram na segunda (16) que Marçal perdeu pontos com a confusão do domingo, o que explica as táticas empregadas, restando ver o que levantamentos propriamente científicos dirão.

Boulos buscou ignorar o influenciador, deixando ele se engalfinhar com Nunes, na esperança do tal aumento de rejeição do prefeito ou, num mundo teoricamente ideal para o psolista, encarar Marçal no segundo turno. O emedebista percebeu isso, ao estocar Boulos com mais intensidade.

A dura realidade é que o cenário não melhorou quando o debate acalmou. Pesquisa da semana passada do Datafolha mostrou que 54% dos paulistanos dão alta relevância a esses encontros para decidir seu voto.

Pois bem, quando a baixaria explícita é deixada de lado, os candidatos acabam por demonstrar certa pasteurização moldada por décadas de poder do marketing político. Nunes falou genericamente de projetos, Tabata até encaixou uma boa resposta sobre por que votar numa lanterninha da disputa.

Até Marçal, abandonando por um momento a vitimização, conseguiu articular algo sobre Bolsa Família, assunto exógeno a este pleito de todo modo, retomando a sua bem-sucedida retórica motivacional. O que fica é a ciclotimia: sem a confusão, há platitudes soníferas. Não deixa de ser uma outra face da moeda da crise da política tradicional.

Ao fim, pelo menos os parafusos das cadeiras permaneceram em seu lugar no estúdio.

 

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