quarta-feira, 4 de junho de 2025

A próxima tempestade - Fábio Alves

O Estado de S. Paulo

Projeto orçamentário de Trump, com corte de impostos e alta de gastos, vai chacoalhar o mercado

Em meio às reviravoltas dos anúncios sobre as tarifas de importação dos Estados Unidos, levando os mercados globais a uma vertiginosa montanha-russa, mais uma turbulência deve chacoalhar os investidores ao longo das próximas semanas, quando tramita pelo Senado americano o projeto orçamentário do presidente Donald Trump com a proposta de cortes de impostos e aumento de gastos.

O projeto, apelidado por Trump de “big beautiful bill”, passou pela Câmara dos Deputados por um único voto de diferença. Do jeito que o texto saiu de lá, as projeções são de que o projeto vai elevar o déficit fiscal dos EUA em quase US$ 3 trilhões ao longo da próxima década e aumentar em quase US$ 4 trilhões a dívida do governo federal, atualmente ao redor de US$ 36 trilhões.

Não à toa, o calafrio dos investidores. A questão para o mercado, agora, é se os senadores americanos vão se rebelar e mexer no texto, limitando a trajetória do aumento do déficit orçamentário. O partido de Trump também controla o Senado, mas há um grupo de senadores republicanos extremamente conservadores em termos fiscais. Eles podem não endossar o plano do presidente. A expectativa é de que o voto no Senado aconteça até o fim de julho, antes do tradicional recesso parlamentar em agosto.

Se a vontade de Trump prevalecer, com a trajetória do déficit e da dívida federal dos EUA considerada explosiva demais pelos investidores, o risco é de uma tempestade nos mercados globais, afetando drasticamente o valor do dólar e o nível dos juros dos títulos públicos mundo afora.

Hoje, a dívida federal em posse do público corresponde a 100% do PIB americano. Mas esse número poderá atingir 130% em 2034 caso os cortes atuais de impostos se tornem permanentes, nos cálculos da Kínitro Capital, que fez estudo sobre o impacto fiscal do projeto orçamentário e da política tarifária de Trump. Conforme o estudo, já em 2026 o déficit deve subir 1,2 ponto porcentual, com o corte de impostos (0,6 ponto) e o aumento de despesas (0,6 ponto).

“A política fiscal pode se tornar significativamente expansionista em 2026, contribuindo com cerca de 1 ponto porcentual para o PIB”, diz o economista-chefe da Kínitro, Sávio Barbosa, para quem o crescimento da economia americana pode superar 2% em 2026.

Esse cenário dificulta o trabalho do Federal Reserve (Fed), que vinha cortando os juros nos EUA, e põe em xeque a aposta de mais dois cortes da taxa básica neste ano. Esse alívio poderia melhorar a liquidez mundial e ajudar países emergentes, como o Brasil.

 

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