segunda-feira, 2 de junho de 2025

Espelho meu - Ana Cristina Rosa

Folha de S. Paulo

Fortalecer na TV a representatividade da maioria da população, que é negra, beneficia o país como um todo

Já parou para pensar na importância do audiovisual como instrumento de promoção da cidadania? O tema foi debatido num festival realizado em Brasília pela maior emissora de TV do Brasil. A iniciativa é da maior importância num país racista (machistamisógino homofóbico também) como é o nosso.

Não é segredo nem novidade que o que se passa nas telas da televisão brasileira e (mais recentemente) nas transmissões por streaming impacta a percepção da realidade. Por conta disso, influencia o comportamento social.

Historicamente, nossa produção audiovisual serviu para reforçar estereótipos e estigmas sobre o "lugar reservado" ao negro. É nesse contexto que o crescimento da quantidade de atrizes e atores pretos e pardos encarnando papéis de destaque e que extrapolam o estereótipo de serviçal, marginal ou "brinquedo" sexual é um indício de que estamos vivendo um momento de quebra de paradigma.

A representação de nossa diversidade étnico-racial ajuda a promover a inclusão, favorece o reconhecimento de experiências diversas, fortalece a autoestima, reforça identidades e fomenta a empatia. Como canta Zeca Pagodinho, "ninguém pode imaginar o que não viveu", o que faz do audiovisual potente aliado da luta antirracista.

E não há nada identitário nisso. Ao contrário. Fortalecer a representatividade da maioria da população brasileira (que é 56% negra, segundo o IBGE) extrapola a defesa de interesses de um grupo específico, pois beneficia o país como um todo. Quem ainda não consegue enxergar isso está cometendo um grande equívoco.

Como "não há almoço grátis", já diz o ditado, vale lembrar que a crescente escalação de pretos e pardos para dar vida a personagens educados, competentes, bonitos e bem-sucedidos nas telas da Globo é resultado de décadas de ação dos movimentos sociais.

A construção da imagem do negro como cidadão portador de direitos é uma jornada que está só começando, mas tem tudo para ser um caminho sem volta.

 

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