segunda-feira, 2 de junho de 2025

A culpabilidade de Haddad – Diogo Schelp

O Estado de S. Paulo

Na crise do IOF, o ministro da Fazenda é um saco de pancadas útil para o presidente Lula

Você sabe que a situação está feia para um ministro da Fazenda quando até as peças publicitárias de empresas privadas ajudam a espalhar a notícia de suas políticas impopulares. Os painéis digitais das avenidas de São Paulo e as redes sociais de bancos e fintechs estão cheios de anúncios prometendo soluções criativas para minimizar o impacto do aumento do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF).

“Mudou o IOF?”, ironiza uma das propagandas, que promete manter a taxa antiga, de 1,1%, sobre compras internacionais no cartão de crédito. “O governo brasileiro acabou de fazer uma mudança muito séria que vai impactar no seu bolso”, começa outra, sem rodeios. “Aqui ainda é 21 de maio”, provoca uma terceira, em referência ao dia anterior ao anúncio que acabou com o IOF reduzido para contas em dólar. Para compensar o aumento do imposto e reter os correntistas, as instituições financeiras estão oferecendo spread zero, cashback e descontos nos custos das transações, entre outras promoções. A mensagem que fica é: o governo está tirando mais dinheiro de você, mas nós vamos salvá-lo.

Em outras circunstâncias, a crise do IOF resultaria facilmente na demissão do ministro que levou a medida para a assinatura do presidente. Isso não acontece com Fernando Haddad, titular da Fazenda, porque ele é um saco de pancadas útil para o presidente Lula. Apanha da oposição, apanha até de colegas do próprio governo, mas mantémse de pé para que o chefe possa continuar gastando.

Em estudos sobre liderança ética, um dilema conhecido é o de quem deve ser responsabilizado por “problemas de muitas mãos”, ou seja, políticas públicas fracassadas que resultam de múltiplos f at ores e indivíduos atuando simultaneamente. A situação fiscal do Brasil é um desses problemas. Lula quer gastos elevados para se manter no poder, o Congresso quer mais emendas, ninguém se aventura a fazer uma reforma para diminuir despesas correntes, lobbies empresariais eternizam benefícios fiscais, Haddad só encontra saídas que penalizam a classe média, e assim por diante.

Diante de problemas de muitas mãos, sistemas políticos com normas de prestação de contas frouxas ou informais tendem a produzir culpas individuais, em um processo em que todos os envolvidos competem para evitar responsabilização até se unir contra aquele que tem maior chance de culpabilidade. Para esse posto, Haddad é o melhor candidato.

 

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