segunda-feira, 2 de junho de 2025

O pós-Janja nas especulações para 2026 - Miguel de Almeida

O Globo

Com as datas ainda em aberto, os peões já se movimentam no tabuleiro

Depois da convocação feita pelo ex-ministro José Dirceu por uma revolução social — a ser empreendida pelo PT! —, mais o aconselhamento buscado por Janja da Silva junto a Xi Jinping para banir a extrema direita do TikTok, começaram de imediato a ser discutidas as possibilidades políticas e humorísticas do pós-Lula. Com as datas ainda em aberto, os peões já se movimentam no tabuleiro. Daí que se fala também num hipotético cenário pós-Janja.

Antes dos nomes, as especulações ocorrem em torno dos temas de campanha, as tais propostas nunca cumpridas em caso de vitória, e das cláusulas consideradas pétreas na administração — no caso, a ocupação desesperada de cargos por militantes sem currículo ou expertise.

À boca grande já se avalia ser o caso de repetir o módulo instagramável de ministério que subiu a rampa em 2023. Com vagas ocupadas por identidades, e não por qualidades. Haja vista o deficitário resultado, discute-se a razão de por que a coisa deu ruim. Há divergências. Nos bastidores, os adversários cantam uma trova existencial: a identidade estragou a qualidade ou a qualidade estragou a identidade? Num ato de fé e penitência, buscam rememorar as performances de Anielle Franco e Daniela do Waguinho, espécies de anátemas do Lula 3. Para ganhar um caráter doutrinário, carecem ainda de resolução a ser votada no próximo congresso do partido. O identitarismo indígena, no modelo turístico adotado por Sonia Guajajara, sob a chave do pensamento mágico de produtividade, deve experienciar vivências e troca de energias em água corrente.

Junto às teses a merecer foco pelo partido, está a desconfiança das ministras Simone Tebet e Marina Silva vis-à-vis as emolduradas como cotistas. Há significativa distância de produtividade e empenho administrativo. Só nestes dias, com pontos ganhos na avaliação de eficiência, percebe-se como Tebet não tem digitais na barafunda (mais uma) da dupla Haddad/Durigan, e Marina já diminuiu desmatamento e queimadas na Amazônia. E ainda deu sova nos senadores com nome de dupla caipira — Plínio Valério e Marcos Rogério.

Como estratégia política, não se coloca em discussão a prática vitoriosa de chamar uma coisa como se fosse outra. Não engana, mas irrita. Foi assim com a quase taxação do Pix, anunciada como medida de segurança. E é agora com o risca-faca do IOF de 1,1% para 3,5%. Basta abrir o nome — Imposto sobre Operações Financeiras — para descobrir (eureca!) se tratar de aumento de imposto (me parece ser o nono do Lula 3).

O meio ambiente volta a ser usado como ferramenta de voto sustentável com a proximidade da COP30, onde Lula da Silva pretende ser visto no papel de estadista e amigo dos povos da floresta e dos sindicatos. A exploração de petróleo exigida pelo senador Alcolumbre — do Amapá (580 mil eleitores; só Copacabana tem cerca de 140 mil) — antes vinha identificada como na Foz do Amazonas, o que poderia ser grave, já que a maioria dos eleitores sabe o que são Foz e Amazonas. Consegue até identificar no mapa. Numa mágica petista, a localização passou a ser nomeada Margem Equatorial. Lula tem a reconhecida tradição, assim como os militares, de enfiar obras peçonhentas na Amazônia sob disfarce do desenvolvimento.

Se assim passa a boiada, os candidatos petistas ao pós-Lula poderiam perceber como repetem o passado. “Machado”, belo livro de Silviano Santiago (com Francisco Dantas, os dois nomes seminais da atual literatura brasileira), ao recontar os anos finais de Machado de Assis, traz a melancolia de mostrar a sociedade como vítima dos oportunistas. À beira de 1906, quando o prefeito Pereira Passos demolia as construções coloniais do centro do Rio, sob o pretexto do tal progresso, os dois presidentes militares (Deodoro e Floriano) da jovem República distribuíam sinecuras (boquinhas) e condecorações aos apaniguados e enviavam ao exílio interno os adversários monarquistas. Pobre Olavo Bilac, acabou em São João Del-Rei. Então, em 2025, a medalha da Grã-Cruz da Ordem do Mérito Cultural, dada a Janja, parece já ser a revolução social de Zé Dirceu.

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