- O Globo
O inesperado bem que tentou fazer uma surpresa, mas, no final, o presidente Michel Temer confirmou sua força na maioria parlamentar ao livrar-se da segunda denúncia da era Janot e parece agora pronto para terminar seu governo enfrentando apenas questões políticas, sem se preocupar no momento com as questões jurídicas, que cobrarão seu custo mais adiante se Temer não conseguir um acordo que lhe garanta o foro privilegiado a partir de 2019.
O inesperado ontem não foi a tentativa da oposição de não dar o quorum, pois, embora bem-sucedidos nos primeiros momentos, os oposicionistas sabiam que não tinham força para manter a obstrução até o final. O presidente da Câmara, deputado Rodrigo Maia, ajudou Temer claramente ao não dar por encerradas as sessões depois de várias tentativas de obter o quorum.
Poderia ter adiado a votação para hoje, ou mesmo para a semana que vem, se estivesse realmente empenhado em criar problemas para Temer. Mas manteve a sessão até que o quorum de 342 deputados fosse alcançado, mesmo depois que o verdadeiro inesperado marcou sua presença.
Quando correu a notícia de que o presidente Temer estava internado no centro cirúrgico do Hospital do Exército, parecia que acabava ali sua chance de derrotar a denúncia no plenário da Câmara ontem.
Mais uma vez, Rodrigo Maia manteve o sangue-frio e não tomou uma medida precipitada, demonstrando sua boa vontade com o presidente enfermo. Mesmo ainda com o presidente no hospital, a base aliada acabou dando o quorum mínimo necessário para abrir a votação, o que decretava a permanência de Temer à frente do governo.
Foi um espetáculo triste em todos os sentidos. A oposição, num trabalho de obstrução inerente à sua condição de minoria, jogou para deixar o presidente sangrando o mais possível, já que não tem número para derrotá-lo, o que significaria paralisar o país, causando danos à economia.
A mesma economia que serviu de pretexto para a maioria dos que votaram a favor da permanência do presidente. Além de um direito legítimo da minoria, a obstrução justificava-se também pelas negociatas que estavam acontecendo nos bastidores políticos.
Mas nada retirava da atitude oposicionista o prejuízo à economia do país, no mesmo dia em que o Banco Central reduzia mais uma vez a taxa de juros, numa demonstração de que a recuperação está a caminho.
Mas também os apoiadores de Temer deram seguidas demonstrações do baixo nível de nossa política, ora falando abobrinhas no microfone sobre o cultivo da tilápia ou as qualidades do vinho nacional, ora dando show de grosserias como aquele deputado que, horas antes, viralizara no plenário em um vídeo pornô em plena atividade sexual.
Os votos eram exemplares de hipocrisia política, com deputados do PT ou do PCdoB criticando o governo Temer por fragilizar nossas estatais e supostamente entregar nossas riquezas ao estrangeiro, como se não fossem os responsáveis pelo descalabro acontecido na Petrobras e em outras estatais.
Ou deputados governistas atacando as gestões petistas anteriores pela corrupção desavergonhada, como se não estivessem ali para discutir graves acusações justamente de corrupção do governo que apoiam.
Enfim, mais uma vez o plenário da Câmara mostrou-se ao povo brasileiro de maneira clara, para reforçar a percepção de que raros são aqueles representantes eleitos que respeitam seus mandatos e estão ali pensando nos interesses do país.
O PSDB, que já foi o representante de uma oposição programática, acabou sendo o principal responsável pela salvação de Temer com o relatório de Bonifácio de Andrada, justamente identificado por oposicionistas e governistas como tucano que é. Os elogios que recebeu dos governistas não podiam ser compartilhados com boa parte da bancada de seu partido, que votou contra Temer, e muito menos com a maioria de seus eleitores. E os ataques oposicionistas contra seu relatório eram ataques contra o partido que representava, queira ou não a direção do PSDB.
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