Dirigentes se revezarão no Paraná junto ao ex-presidente, que designou Gleisi como sua ‘porta-voz política’
Gustavo Schmitt e Sérgio Roxo | O Globo
CURITIBA - Com a prisão do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva em Curitiba, o PT decidiu ontem transferir simbolicamente a sede do partido de São Paulo para a capital paranaense. A ideia é manter um bunker na cidade, com revezamento das principais lideranças, enquanto os advogados avaliam medidas que possam ser adotadas para tentar tirar Lula da cadeia. Mesmo diante da situação, os dirigentes aproveitaram ontem a reunião da Executiva Nacional, já realizada em Curitiba, para reafirmar mais uma vez a pré-candidatura de Lula à Presidência da República.
— Reafirmamos a candidatura de Lula. É o nosso candidato em qualquer circunstância — anunciou a presidente do partido, senadora Gleisi Hoffmann (PR).
A mudança da sede para a capital paraense terá um caráter mais simbólico. Gleisi, os líderes do partido na Câmara, Paulo Pimenta (RS), e no Senado, Lindbergh Farias (RJ), se comprometeram a estar na capital do Paraná pelo menos uma vez por semana. Em resolução divulgada após a reunião, o partido também anunciou que a presidente da legenda foi “designada por Lula como sua porta-voz política até que ele recupere a liberdade”.
Numa tentativa de evitar divergências internas, o PT também afirmou que caberá a Gleisi conduzir as “as articulações com outros partidos”. Nos últimos meses, o ex-prefeito de São Paulo Fernando Haddad, principal nome cotado para ser o plano B do partido na disputa presidencial se Lula não puder ser candidato, vinha exercendo de forma informal esse papel de conversar com outras legendas.
POUCA GENTE NO ACAMPAMENTO
Dirigentes partidários reconhecem que o PT está encontrando dificuldades para mobilizar simpatizantes para irem a Curitiba apoiar Lula. O acampamento montado na frente do prédio da Polícia Federal, onde o ex-presidente cumpre pena, reúne muito menos pessoas do que, por exemplo, os atos em Porto Alegre, em janeiro, quando o líder petista foi condenado em julgamento na segunda instância.
Numa tentativa de criar um fato político favorável ao ex-presidente, o partido organizou para hoje uma visita de dez governadores a Curitiba. A ideia é que eles possam conversar com Lula na cadeia. Mas ainda há dúvida se haverá autorização para que eles entrem na sede da PF.
Pela norma da PF, as visitas podem ser feitas às quartas-feiras, somente por advogados e familiares. No entanto, o preso recém-chegado costuma ter que cumprir um período de adaptação por dez dias, quando as visitas ficam limitadas somente aos advogados. Ainda não há definição, porém, se, por se tratar de um ex-presidente, a PF adotará algum procedimento diferente, assim como o fez ao não colocar o petista na carceragem, mas numa sala reservada e com banheiro privativo.
Segundo o PT, confirmaram presença os governadores do Maranhão, Flávio Dino (PCdoB); da Bahia, Rui Costa (PT); do Ceará, Camilo Santana (PT); de Pernambuco, Paulo Câmara (PSB); de Minas Gerais, Fernando Pimentel (PT); do Piauí, Welington Dias (PT-PI); da Paraíba, Ricardo Coutinho (PT); do Acre, Tião Viana (PT); e de Alagoas, Renan Filho (PMDB). Completa a lista Jackson Barreto (PMDB), que deixou o governo do Sergipe há três dias para disputar eleição ao Senado. Um dos governadores consultados pelo GLOBO disse ontem que só irá para Curitiba se tiver a garantia de que poderá estar com Lula.
Em discurso à militância, Gleisi voltou a citar o Supremo Tribunal Federal (STF), que amanhã deve voltar a apreciar a possibilidade de prisão para réus que são condenados em segunda instância. O ministro Marco Aurélio Mello deve colocar em votação um pedido de liminar feito por um grupo de advogados sobre a suspensão da prisão de todos os presos condenados em segunda instância até que a Corte julgue as Ações Declaratórias de Constitucionalidade sobre o tema.
TOUR INTERNACIONAL
Gleisi disse que espera que Lula deixe a prisão até amanhã. No entanto, se o petista seguir preso, a senadora afirmou que o partido vai intensificar os atos na capital paranaense. Ela acrescentou ainda que o PT vai pedir apoio de personalidades internacionais e líderes políticos, como Pepe Mujica, ex-presidente do Uruguai.
— Esperamos que seja só até quarta-feira (a prisão). Se não for, teremos muitas atividades lá no acampamento. Tem muita gente querendo vir pra cá. Acreditam que as mobilizações, tanto no Brasil como no exterior, precisam se intensificar — diz Gleisi.
Reservadamente, lideranças do partido admitem que não contam muito com a possibilidade de Lula ser solto nesta semana. Dirigentes reconhecem também que a candidatura do ex-presidente dificilmente vai se concretizar depois da prisão. A grande questão agora é saber qual o momento ideal para fazer a mudança na cabeça da chapa.
O partido pretende incentivar petistas e até aliados de outras legendas para viajarem a outros países. A pré-candidata do PCdoB a presidente, Manuela D’Ávila, vai nesta semana a Montevidéu e Buenos Aires. Já o pré-candidato do PSOL, Guilherme Boulos, deve ir a Lisboa. A ex-presidente Dilma Rousseff ficou encarregada de visitar a Espanha para denunciar a prisão de Lula, que eles classificam como “política”.
A forma de cobrar publicamente o STF é um tema que tem dividido o PT. Um grupo de parlamentares é favorável ao diálogo para evitar que a pressão afaste os aliados na Corte. Já a ala liderada por Gleisi e Lindbergh defende uma pressão mais intensa.
Na carceragem, Lula não tomou banho de sol e optou por ficar na cela lendo “A elite do atraso, da escravidão à Lava-Jato”, de Jessé Souza. Ao sair do prédio da PF, o advogado do petista, Cristiano Zanin, contou que o ex-presidente assistiu à final do campeonato paulista, no domingo, já que a televisão aberta local não pôde transmitir a final do campeonato paranaense.
— Naturalmente, ele ficou contente com o título — diz ele, sobre a vitória no Campeonato Paulista.
Zanin relatou que o petista permanece bem, “embora indignado por estar preso sem ter cometido crimes”. Ainda não há informações sobre visitas de familiares e nem se ele ouve as manifestações que acontece, ao lado de fora do prédio da PF. Colaborou Luiza Dalmazo, especial para O GLOBO
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