- O Estado de S. Paulo
Paulo Guedes colocou sua cabeça a prêmio ao insistir na medida do congelamento
O embaraço político e econômico que marcou a votação do congelamento de salários dos servidores públicos pelo Congresso mostra que a pressão pelo gasto não tem limites no País.
Muitos senadores e deputados defenderam a exclusão de várias categorias do congelamento de salários com a justificativa de que a medida é inócua porque não haverá dinheiro para os aumentos por conta do impacto da covid-19 na economia e nos cofres públicos.
É má-fé dos parlamentares ou mesmo ignorância sobre o que tem acontecido nas últimas décadas no Brasil. Faltou também sensibilidade dos parlamentares para a opinião pública. Sim, o outro lado: trabalhadores da iniciativa privada, que tiveram cortes de salários ou perderam o emprego para a pandemia da covid-19. Esse lado também pode fazer a diferença.
Mesmo com o Estado quebrado em todas as esferas de governo (União, Estados e municípios), podemos ver que a opção que tem prevalecido é pelo mau uso do dinheiro público.
O Rio, integrante do chamado “grupo dos três” Estados mais quebrados do País, ao lado de Minas Gerais e Rio Grande do Sul, aprovou lei que autoriza o Executivo a promover alterações no orçamento de 2020 para permitir a revisão das remunerações dos servidores estaduais. O governador disse que não vai aumentar, mas sancionou a lei. Tudo isso em plena pandemia.
Foi também com espanto e assombro que vimos esta semana a decisão do procurador-geral de Justiça do Estado de Mato Grosso, José Antônio Borges Pereira, de criar uma “ajuda de custo” para procuradores, promotores e servidores desembolsarem gastos com a própria saúde. Apelidado de “bônus covid”, o benefício terá um valor de R$ 500 para servidores efetivos e comissionados. Os procuradores e promotores ganharão o dobro: R$ 1 mil. O MP de Mato Grosso diz que os recursos já estavam previstos no orçamento deste ano. “Não se trata de um dispêndio financeiro sem lastro orçamentário.”
Se havia sobra no caixa, por que não direcionar os recursos para o combate da pandemia voltado aos mais vulneráveis?
Mas garantir esse repasse para ajudar no enfrentamento da doença, o Congresso não quis aprovar. A proposta de destinar a sobra no caixa dos demais Poderes para o enfrentamento da covid-19 não vingou.
Se o projeto tivesse sido aprovado antes, o “bônus covid” de Mato Grosso não teria sido adotado. O projeto aprovado pelo Congresso proíbe a criação ou aumento de auxílios, vantagens, bônus, abonos, benefício de cunho indenizatório, para servidores de todos os Poderes e seus dependentes, inclusive militares. Medida muito importante.
Alguém duvida que, se tiverem oportunidade, governadores, prefeitos e representantes de outros Poderes não reajustam os salários ou arrumam algum tipo de bônus?
Quem mais se apropria desses ganhos é a elite da burocracia do funcionalismo como se viu no “bônus covid” dos procuradores.
Se esse risco não existisse, por que tanta pressão para deixar várias categorias de fora do congelamento? A mobilização se intensificou para que Bolsonaro vetasse a proibição até dezembro de 2021 da contagem do tempo para o período aquisitivo necessário para a concessão de anuênios, triênios, quinquênios e licenças-prêmio. Esse tipo de bônus não existe mais no governo federal mas tem peso grande no crescimento da folha de Estados, principalmente na área de segurança.
De acordo com fontes da área econômica, o alívio total é de cerca de R$ 40 bilhões. Nos Estados do Sul, Sudeste e Centro-Oeste, esses benefícios correspondem a um terço do crescimento da folha. Nos do Nordeste, chegam até 50%. É, portanto, gasto na veia cortado e não apenas “promessa” de reajuste salarial, como querem taxar aqueles que não acreditam na importância do congelamento. Não é verdade que a medida não gera economia.
O ministro da Economia, Paulo Guedes, colocou sua cabeça a prêmio ao insistir na medida do congelamento. Com transmissão ao vivo, Guedes, ao lado do presidente, defendeu o veto das categorias que ficaram de fora do congelamento e ganhou a promessa de Bolsonaro. Fica desmoralizado sem o veto. Por isso, a tensão do momento. O Congresso terá a palavra final, mas que nenhuma liderança venha depois com o papo furado de sempre de que todos têm responsabilidade fiscal se o cenário piorar pós-covid-19.
Deputados e senadores, tenham coragem: não derrubem o veto.
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