quarta-feira, 23 de junho de 2021

Bernardo Mello Franco - Terrivelmente bolsonarista

O Globo

O pastor está mais próximo de vestir a toga de juiz. Na sexta passada, Jair Bolsonaro levou André Mendonça a um templo da Assembleia de Deus. No púlpito, sugeriu que ele ocupará a próxima vaga no Supremo Tribunal Federal.

 “Nós indicaremos um evangélico para que o Senado aceite o seu nome e encaminhe para o Supremo um irmão nosso em Cristo”, disse o presidente. A plateia explodiu em “aleluias”, e o advogado-geral da União deu um novo passo rumo ao olimpo do Judiciário.

A nomeação de um ministro “terrivelmente evangélico” é música para os ouvidos da bancada da Bíblia. O presidente já mantém três pastores no primeiro escalão do governo. Agora promete transferir um deles para a cadeira do decano Marco Aurélio Mello, que se aposenta em julho.

O lobby religioso sempre quis ter um porta-voz no Supremo. Na última década, a Corte reconheceu o direito à união homoafetiva, permitiu o aborto de anencéfalos e criminalizou a homofobia. Um “irmão nosso” assumiria com o compromisso de travar outras pautas progressistas.

Entre muitos juristas evangélicos, Bolsonaro tem um motivo para indicar Mendonça. O ministro é um servo fiel à agenda autoritária. Sua passagem pelo Ministério da Justiça ficou marcada pelo uso da Lei de Segurança Nacional para perseguir opositores.

De volta à AGU, o pastor continuou a dar provas de subserviência. Há duas semanas, tentou convencer o Supremo a autorizar a convocação de governadores à CPI da Covid. A ideia é ilegal, mas ajudaria o Planalto a desviar o foco das investigações.

Agora o ministro defende que civis acusados de ofender as Forças Armadas sejam processados e julgados pela Justiça Militar. A proposta remete aos inquéritos da ditadura para sufocar a liberdade de imprensa.

Entre o capitão e a Constituição, Mendonça costuma escolher o lado do chefe. Mais que um ministro “terrivelmente evangélico”, o Supremo corre o risco de ganhar um ministro terrivelmente bolsonarista.

 

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