Valor Econômico
Proposta de Roberto Campos Neto subestima os
riscos de ingerência política na instituição
Roberto Campos Neto, como presidente do Banco
Central, recebe exatos R$ 18.887,14 por mês. É a menor remuneração entre os
principais cargos do governo, uma vez que os ministros de Estado têm um
contracheque de R$ 41.650,92 mensais.
Já Aloízio Mercadante, à frente do BNDES, tem
honorários de R$ 88.113,83 ao mês. Jean Paul Prates, dirigente máximo da Petrobras,
faz jus a uma remuneração básica mensal de R$ 127.269,71. Seu cargo também dá
direito a um pacote de benefícios extras que envolve até um bônus de
performance anual que distribuiu mais de R$ 1,5 milhão em 2023.
Tamanha discrepância tem a ver com a natureza das instituições. A Petrobras, com ações negociadas em bolsa, segue uma política remuneratória guiada pelas leis do mercado. O BNDES, por sua vez, é uma empresa pública, controlada 100% pela União, mas por ter natureza jurídica privada não se sujeita ao teto salarial válido para todo o funcionalismo público.
O Banco Central, conforme estabelecido na Lei
Complementar nº 179/2021, tem status de autarquia especial. Além de estar
submetida às regras do serviço público, seu dirigente máximo está um degrau
abaixo do cargo de ministro de Estado. Assim, Campos Neto recebe o mesmo que,
por exemplo, Dario Durigan, o nº 2 de Haddad no Ministério da Fazenda.
Nas últimas semanas Campos Neto lançou-se
numa campanha pela aprovação da PEC nº 65/2023, que transforma o Banco Central
em empresa pública e estende a sua autonomia também para o campo orçamentário.
A proposta tem autoria do senador Vanderlan
Cardoso (PSD-GO), mas o próprio Campos Neto reconhece que foi debatida e
aprovada pela diretoria colegiada do Bacen.
Em termos práticos, a consequência imediata
caso a PEC seja aprovada é que o Banco Central pagará suas despesas
operacionais com o “lucro” de atividades financeiras (compra e venda de títulos
públicos e operações de câmbio, além de taxas cobradas de instituições
financeiras) e seus servidores serão transformados em empregados celetistas.
Situação muito semelhante à do BNDES.
A justificativa de Campos Neto em defesa da
PEC é que a instituição está sofrendo uma sangria com a perda de servidores,
que estariam saindo em massa para o mercado ou prestando concurso para outros
órgãos em busca de melhor remuneração.
Dados divulgados pelo próprio Banco Central
não indicam que a situação é tão calamitosa assim - pelo menos não pelas razões
expostas por Campos Neto. É fato que, entre o início de 2016 e o fim de 2023, o
órgão perdeu 911 servidores, o que representa 21,8% da sua força de trabalho de
oito anos atrás.
O principal motivo para a redução, porém, não
está relacionado aos supostos baixos salários, e sim ao envelhecimento dos
trabalhadores e à reforma da previdência. No mesmo período, 615 analistas,
técnicos e procuradores se aposentaram ou faleceram.
Em termos líquidos, portanto, apenas 296
servidores ativos deixaram a instituição porque foram trabalhar no setor
privado ou migraram para outras carreiras do setor público. O tal
“derretimento” que Campos Neto afirma estar acontecendo representa menos de 1%
do total de funcionários atuais.
O principal vilão para esse encolhimento é,
na verdade, a não reposição das aposentadorias. A instituição abriu neste ano
seu primeiro concurso público desde 2013, e certamente não terá dificuldades
para preencher com bons profissionais as 100 vagas oferecidas, graças ao
salário inicial de R$ 20.924,80, que sobe gradativamente até atingir R$
29.832,94.
Outra evidência de que a perda de pessoal é
algo que não compromete tanto assim as atividades é que, mesmo diante da tal
“sangria” de pessoal, o órgão se dá ao luxo atualmente de liberar 75 de seus
melhores servidores para atuarem como assessores de parlamentares ou
trabalharem em outros órgãos.
Se a PEC se destina a resolver um problema
que não é tão grave como se alardeia, é importante analisar os seus efeitos e
se perguntar a quem interessa. É aí que mora o perigo.
Caso o Banco Central se torne uma empresa
pública com autonomia orçamentária, os salários de seus dirigentes poderão ser
ampliados significativamente, ao nível do que hoje pagam o BNDES, a Caixa ou
a Petrobras.
Isso tornará ainda mais cobiçada a indicação para a diretoria do Bacen, por
agentes do mercado e apadrinhados políticos.
A aprovação da PEC também criaria uma nova
casta de empregados públicos privilegiados, como já acontece no BNDES, cujos
empregados têm carga horária de 30 horas semanais e ganham, graças à
participação nos lucros do banco, cerca de 16 salários de até R$ 36.000 mensais
por ano.
Para piorar, Campos Neto subestima os riscos
de se transferir a supervisão do Conselho Monetário Nacional (composto pelos
ministros da Fazenda e do Planejamento, mais o próprio presidente do Bacen)
para o Congresso.
Basta imaginar o que seria um Banco Central
com autonomia orçamentária, diretores ganhando mais de R$ 100 mil por mês e
sujeito ao controle de Arthur Lira...
*Bruno Carazza é professor associado da
Fundação Dom Cabral e autor de “Dinheiro, Eleições e Poder: as engrenagens do
sistema político brasileiro” (Companhia das Letras)”.
4 comentários:
ARRASOU, CARAZZA!
Muito bom! Bruno é O CARA!
■É uma opinião, essa do Bruno Carazza, né?
=》É uma opinião bem burra, mas é uma opinião e ele tem direito a ela.
●Agora, quanto ao problema de o BC vir a estar sob a influência de Arthur Lira:: em que isso piora o problema em relação ao BC estar sob a influência de Lula ou de Bolsonaro?
■Eu preferiria o BC, e tudo, sob a responsabilidade do Congresso::
¹ 》Eles teriam que assumir compromissos;
² 》Os eleitores teriam definitivamente que refletir em quem votam para deputado e senador;
³ 》Mesmo com a péssima qualidade do Congresso, como as decisões lá teriam que ser coletivas nós correríamos muito menos risco de termos nosso destino submetido a picaretas despreparados, corruptos e apoiadores de ditadores como Lula e Bolsonaro decidindo sozinhos e causando as tragédias e destruição a que temos sido condenados há 17 anos.
O salário do Roberto Campos Neto é baixo comparado aos outros.
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