STF não deve abrir exceção ao julgar artigo do Marco Civil
O Globo
Excluir crimes contra honra da regra que
responsabiliza plataformas por conteúdo favorecerá os criminosos
O julgamento sobre o artigo 19 do Marco Civil
da Internet, retomado pelo Supremo Tribunal Federal (STF)
nesta quarta-feira, já resultou em avanço considerável. A Corte formou maioria
para tornar as plataformas digitais corresponsáveis pelo conteúdo que veiculam
a partir do momento em que notificadas de violações à lei — e não apenas depois
de a Justiça determinar a exclusão desse conteúdo. Sete dos 11 ministros
votaram para considerar o artigo inconstitucional no todo ou em parte. Falta,
porém, estabelecer de modo objetivo as regras que passarão a vigorar.
Em meio à regulação deficiente — resultado da omissão do Congresso, onde o PL das Redes Sociais não avançou —, as redes sociais se tornaram campo propício ao florescimento de ódio e crimes. Não se pode achar normal que sejam usadas para incentivar automutilação ou suicídio de crianças, articular massacres em escolas, disseminar extremismo ou organizar golpes contra a democracia, entre tantas outras aberrações. É preciso chamar as plataformas à responsabilidade.
No lugar do artigo 19, deverá entrar em vigor
o mecanismo descrito no artigo 21 do Marco Civil (hoje aplicado nos casos de
violação de intimidade): a responsabilidade das redes valerá a partir do
momento em que notificadas pelas partes atingidas, sistema conhecido como notice
and take down. Era o que previa o texto original da lei, depois modificado no
Congresso.
A regra já está em vigor na União Europeia e
tem se revelado factível. As evidências colhidas por lá mostram que a medida é
necessária, mas ainda insuficiente para coibir totalmente as violações
perpetradas nas redes, que continuam ocorrendo. Não se trata de censura, como
alegam defensores do sistema atual. As redes terão liberdade para manter o que
julgam ser legal — e certamente manterão (como tem ocorrido na Europa), pois
disso depende seu modelo de negócios.
Os relatores dos casos em julgamento,
ministros Luiz Fux e Dias Toffoli, votaram acertadamente pela
inconstitucionalidade total do artigo 19. Mas o presidente de Corte, Luís
Roberto Barroso, propôs abrir uma exceção: preservar o mecanismo do artigo
19 para crimes contra honra, como injúria, calúnia ou difamação. Sob o
argumento de que a mudança comprometeria a liberdade de expressão, ele sugeriu
que as plataformas continuem a ser corresponsáveis por tais crimes apenas
depois de ignorar ordem judicial para remover conteúdos. A proposta foi
endossada pelos ministros Gilmar Mendes e Flávio Dino e rejeitada por Alexandre
de Moraes e Cristiano Zanin, que acompanharam os relatores. O placar está, portanto,
em 4 x 3 a favor da plena responsabilização das plataformas.
Barroso, Gilmar e Dino estão errados. Não faz
sentido resolver apenas parte do problema. Redes sociais são hoje terreno
fértil para injúrias, calúnias e difamações de toda sorte. A despeito dos danos
graves às vítimas, tais conteúdos criminosos costumam gerar engajamento e lucro
para as plataformas. Na prática, o mecanismo do artigo 19 incentiva a
prorrogação das ofensas, já que não há responsabilidade jurídica das
plataformas, mesmo quando o conteúdo é flagrantemente ilegal. Quando a sentença
chega, o estrago está mais que consumado, e de pouco adianta posterior
reparação. Depois da vida, a honra é o valor maior da dignidade humana. Por que
protegê-la menos que outros direitos?
Faltam os votos dos ministros Edson Fachin,
Cármen Lúcia e Nunes Marques. Barroso tem dito que pretende buscar uma decisão
consensual. É positivo que tente aparar as arestas, mas deve perseguir uma
regulação adequada à gravidade do problema e à altura dos desafios atuais, e
não tentar convencer os colegas que ainda não votaram a endossar uma regra
frouxa, que continuará permitindo a criminosos cometer barbaridades atrás do
biombo da liberdade de expressão, em benefício do modelo de negócios das
plataformas digitais.
Trump é essencial para que cessar-fogo entre
Irã e Israel seja duradouro
O Globo
Apesar de a trégua ter se revelado instável
no início, todos os lados do conflito teriam a ganhar com ela
É fundamental o esforço do presidente
americano, Donald Trump,
para manter o cessar-fogo entre Israel e Irã anunciado na
segunda-feira. A trégua foi testada nas primeiras horas por hostilidades de
lado a lado. Apesar desses reveses, é preciso que o cessar-fogo tenha chances
de pavimentar o caminho a um acordo duradouro.
Israel conseguiu, se não destruir, pelo menos
retardar significativamente o programa nuclear e danificar o poderio militar
iraniano. Trump comprovou a eficácia de suas bombas subterrâneas, demonstrou
arrojo e ousadia ao tomar uma decisão que paralisou vários presidentes
americanos e faturará politicamente se o ataque tiver bastado para interromper
um conflito intratável. Por fim, os iranianos, ainda que derrotados, podem
reivindicar a retaliação contra a principal base militar dos Estados Unidos na
região, no Catar.
Quem tem mais a perder com o prolongamento da
guerra é o próprio Irã. O país investiu anos e recursos para montar uma rede de
aliados com capacidade de destruir Israel. Desde a barbárie terrorista do Hamas
em 7 de outubro de 2023, porém, ela vem sendo desmantelada pelos israelenses.
O Hamas foi reduzido a ruínas em Gaza. O
Hezbollah perdeu lideranças, suas bases e o poder que tinha no Líbano. O regime
de Bashar al-Assad foi derrubado na Síria. Os houthis iemenitas têm sofrido
bombardeios regulares. Para completar, Israel dizimou proteções antiaéreas,
mísseis balísticos e lideranças iranianas, deixando o próprio Irã vulnerável.
Rússia e China não demonstram o menor interesse em ajudar seu aliado na região.
Para Israel, o temor de um Irã nuclear é hoje
muito menor. As principais instalações foram atingidas e, ainda que o programa
iraniano não tenha sido “obliterado” como disse Trump, a bomba atômica se
tornou uma fantasia bem mais distante para os aiatolás. Há ainda o fator de
dissuasão. Eles sabem que, a qualquer indício de produção de armas nucleares,
estarão sob a mira não apenas dos aviões israelenses, mas também da artilharia
americana.
Para Trump, uma guerra prolongada seria um
estorvo. É certo que ele faria de tudo para evitar o envio de tropas
terrestres. A ala isolacionista do trumpismo é veementemente contrária a
intervenções militares no exterior. Outro risco seria a explosão da inflação.
Num conflito mais longo, o Irã poderia tentar fechar acesso ao Golfo Pérsico,
levando o petróleo para as alturas.
Embora todos os lados tenham razões para
encerrar o conflito, as primeiras horas do cessar-fogo mostram que não será
tarefa fácil. Cabe a Trump usar seu poder de persuasão de modo mais eficaz para
que a trégua vingue.
País melhora competitividade, mas terá que se
esforçar mais
Valor Econômico
A trajetória da posição brasileira no Ranking
Mundial de Competitividade desde 2011 sugere uma estagnação, sempre entre os
últimos lugares
O Brasil recuperou sua melhor posição em
cinco anos no tradicional ranking de competitividade elaborado pelo
International Institute for Management Development (IMD), da Suíça, em
colaboração com o Núcleo de Inovação e Tecnologias Digitais da Fundação Dom
Cabral (FDC), do Brasil. Mas nada indica que conseguirá avançar mais ou até
mesmo manter a posição na próxima avaliação. Os pontos fortes que garantiram a
escalada, como o crescimento da economia, devem perder impulso. Além disso, os
problemas estruturais já crônicos, como o custo do crédito e a educação, não
estão sendo enfrentados com eficiência.
A posição brasileira no Ranking Mundial de
Competitividade passou da 62 colocação para a 58 entre 2024 e 2025. Mas já teve
melhor classificação. Em 2021, ocupou o 57 lugar e, há dez anos, em 2011, o 56.
Ou seja, a trajetória do país nesse período sugere uma estagnação, sempre entre
os últimos lugares. No ano passado, 69 países foram analisados. Na América
Latina, o Brasil ficou atrás do Chile (42 lugar), Colômbia (54) e México (55) e
à frente apenas da Argentina (62) e da Venezuela (69), o que não mostra grande
mérito.
O ranking do IMD é baseado na análise de
quatro fatores: performance econômica, eficiência governamental, eficiência
empresarial e infraestrutura. Dentro de cada fator, são examinados subfatores
totalizando 336 indicadores que determinam a classificação.
Entre os quatro fatores, a melhor posição
brasileira no novo ranking é em performance econômica, na qual aparece em 30
lugar, favorecido pelo aumento de 3,4% do Produto Interno Bruto (PIB). O fluxo
de investimento direto estrangeiro e o crescimento de emprego no longo prazo
pesaram positivamente na classificação. A taxa de desemprego foi de 6,6% em
2024, a menor da série histórica da Pnad Contínua, iniciada em 2012 pelo IBGE.
Do outro lado, há deficiências na exportação de serviços, na receita de turismo
e no comércio internacional.
Já a pior classificação do Brasil é no
ranking de eficiência governamental: é o penúltimo lugar, só à frente da
Venezuela. Nesse fator, os pontos fracos são custo de capital (69 lugar),
protecionismo (68) e finanças públicas (67). Em política tributária, o país
está em 47 lugar. Para o IMD, reverter esse quadro passa pela simplificação e
pela digitalização de processos regulatórios, maior responsabilidade fiscal,
mais transparência e controle de despesas, velhas recomendações que não têm
tido muita repercussão.
Em relação à eficiência empresarial, apesar
de se situar em 8 lugar em iniciativa empreendedora, os brasileiros enfrentam
problemas de custo de capital e financiamento da dívida corporativa (68 lugar),
indicando a dificuldade e o preço alto para obter recursos para investimentos,
expansão e inovação. A recente elevação da Selic a 15% ao ano, com a
perspectiva de que permanecerá em patamar elevado por um longo período, indica
que não haverá alívio nessa frente. A situação não é melhor em mão de obra qualificada
(68), produtividade e eficiência (59) e práticas gerenciais (48).
No fator infraestrutura, os contrastes são
mais acentuados. Baixo custo comparativo de energia móvel coloca o Brasil em 15
lugar nesse ranking, em que fica em 21 em exportação de serviços de TI e
comunicação, e em quinto em energia renovável. Já na infraestrutura básica e na
tecnológica cai para o 52 e o 57 lugares, respectivamente. Mas a pior colocação
é em educação (65), ficando em penúltimo lugar no ranking em educação primária
e secundária, e em último em habilidades linguísticas.
A educação é uma das áreas em que o Brasil
mais parece patinar. Apesar dos esforços feitos, falha em atingir as metas
qualitativas e até as quantitativas. Recente Pnad Contínua Educação mostrou
algum avanço no ensino superior, na instrução básica, na redução do
analfabetismo e do abandono escolar. No entanto, diversas metas do Plano
Nacional de Educação (PNE) não foram cumpridas e ainda estão distantes.
Algumas das metas que provavelmente não serão
atingidas são ter nas creches 50% das crianças de 0 a 3 anos; alcançar a
universalização da escolarização para as faixas de 4 e 5 anos e de 15 a 17
anos; e erradicar o analfabetismo. No grupo de 4 a 5 anos, o percentual de
crianças na escola subiu para 93,4% em 2024, mas ainda fica abaixo da
universalização do PNE. Na faixa de 15 a 17 anos, 93,4% estão matriculados,
também abaixo da universalização. Só na faixa de 6 a 14 anos, 99,5% estavam
matriculados em 2024.
As crianças e jovens podem até estar nas
escolas, mas o aprendizado deixa a desejar. As falhas são ainda piores nos
testes de avaliação de conhecimento. As provas do Sistema de Avaliação da
Educação Básica (Saeb) de 2023, compilados pela ONG Todos pela Educação,
mostraram que a parcela dos jovens com conhecimento adequado não passa de 5,2%
em matemática e de 32,4% em português.
Melhorar a competitividade do Brasil no
cenário internacional certamente não é uma tarefa simples dada a complexidade
da questão, os vários fatores envolvidos e as desvantagens crônicas do País.
Mas aprimorar o desempenho na Educação é um ponto de partida imprescindível.
Brasil tem saneamento de país subdesenvolvido
Folha de S. Paulo
Segundo o Banco Mundial, país estava atrás da
Índia em 2022; expansão depende de investimento privado e saúde econômica
No panorama global, o Brasil é um país
remediado —isto é, longe da bonança dos ricos, porém a uma distância
considerável dos miseráveis. Ocupa o 84º lugar entre 193 países no ranking do
Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), medida da ONU que leva
em conta renda per capita, expectativa de vida e escolaridade.
Essa posição intermediária pode camuflar,
entretanto, as profundas disparidades nacionais, entre estratos sociais,
regiões geográficas e também indicadores de bem-estar social. Um exemplo
evidente de setor em que não superamos o pior do subdesenvolvimento é o saneamento básico.
Conforme a Folha noticiou,
estatísticas do Banco Mundial mostram que em 2022 menos
da metade da população brasileira (exatos 49,6%) tinha acesso a coleta
e tratamento de esgoto. Deplorável por si só, o dado expõe um vexame na
comparação internacional.
Naquele ano não muito distante, países mais
pobres ostentavam índices melhores, casos de Índia (52,1%), Iraque (52,8%), Paraguai (55,2%)
e África
do Sul (71,7%). Ficamos também abaixo da média global, de 56,6%.
O número oficial mais recente, 55,2% em 2023,
parece indicar um avanço, mas a base de dados do Banco Mundial não permite o
cotejo no período. O fato é que o Brasil só recentemente tomou providências
essenciais para enfrentar um atraso de décadas.
Não sem resistências corporativistas e
ideológicas, foi aprovado em 2020 o novo Marco Legal do Saneamento, que abriu
caminho para maior investimento privado no setor a fim de cumprir metas de
universalização dos serviços até o início da próxima década.
O diploma, felizmente, sobreviveu
às investidas do governo Luiz Inácio Lula da Silva
(PT) em favor da
obsoleta hegemonia das estatais —cujos resultados expõem a ineficácia de modo
eloquente.
Impactos da nova legislação já se fazem
sentir. No ano passado, com o impulso da desestatização da gigante
paulista Sabesp,
o atendimento privado chegou a 30% dos municípios brasileiros, seis vezes o
percentual observado em 2019, antes da implementação do marco regulatório.
O setor público não dispõe dos recursos
capazes de viabilizar os investimentos necessários para a universalização,
estimados em R$ 45,1 bilhões anuais ao longo do próximo decênio. Já houve
aumento expressivo nos últimos anos, de R$ 18,8 bilhões em 2021 para R$ 25,6
bilhões em 2023.
A expansão dos serviços depende do mercado.
Reportagem do jornal Valor Econômico informa que os leilões de concessão devem
somar neste ano R$ 27 bilhões em aportes no setor. Há obstáculos, no entanto.
Entre os principais, obviamente, estão os
juros básicos de 15% anuais aplicados pelo Banco Central para conter a inflação
elevada pelos gastos excessivos da administração petista. O cumprimento da
promessa de universalização não depende da benevolência dos governantes, mas de
regras estáveis e boa saúde econômica.
É preciso preservar a lei Cidade Limpa
Folha de S. Paulo
Projeto que desfigura o diploma exige debate
transparente para impedir retrocessos no controle da poluição visual em SP
A lei Cidade Limpa, aprovada em 2006,
diminuiu de forma significativa a poluição visual na cidade de São Paulo, ao
restringir e regular a exposição de propaganda e a sinalização em fachadas de
comércios.
Agora, uma proposta em tramitação na Câmara
Municipal pode desfigurar a lei, aprovada por 93% dos paulistanos, segundo
levantamento da Offerwise, empresa especializada em pesquisa de mercado na
América Latina.
Causa espécie o açodamento da votação em
primeiro turno, realizada no final de maio, de um projeto capaz de impactar
para pior a paisagem urbana local.
Enquanto a norma atual veta ocultar qualquer
fração da fachada de bens de valor cultural, como prédios históricos, a
proposta de autoria do vereador Rubinho Nunes (União Brasil) autoriza cobrir
até 70% da fachada desse tipo de imóvel com painéis de LED.
Um dos artigos desfaz quase todas as
proibições referentes à exploração publicitária de espaços públicos, como ruas,
praças, postes, viadutos, entre outros.
Nunes diz que esse dispositivo será derrubado
e que o foco é criar uma Times Square —referência à famosa rua de Nova York conhecida
pela profusão de painéis luminosos— em algum ponto restrito da capital. De
acordo com o vereador, a iniciativa traria ganhos ao incentivar o turismo.
A ideia não é nova. Como
noticiou a Folha em 2023, a gestão municipal de Ricardo Nunes (MDB) e a estadual
de Tarcísio
de Freitas (Republicanos)
avaliavam formas de implementar uma demanda de empresários do centro
—transformar a esquina das avenidas Ipiranga e São João numa versão da praça
novaiorquina e criar ali um corredor turístico com casas de shows e hotéis.
O interesse do poder público seria direcionar
o dinheiro arrecadado para revitalizar a região.
Sobre o projeto de lei, o prefeito Ricardo
Nunes afirmou que não apoia desfigurar o diploma vigente, mas disse ser
favorável à "criação, em pouquíssimas ruas específicas, de uma espécie de
Times Square, com o intuito de requalificar a avenida São João".
Mesmo com a lei, observam-se
hoje irregularidades. Especialistas apontam preocupação com a proposta em
tramitação, que pode gerar mais retrocessos.
A notícia menos má foi a
abertura de audiências públicas nas próximas semanas, com participação
da sociedade, para discutir as alterações até a segunda e derradeira votação.
Espera-se que o debate se dê de forma
transparente e que os vereadores preservem esse importante mecanismo de
controle da poluição visual em São Paulo.
BC faz a coisa certa, por enquanto
O Estado de S. Paulo
Ao elevar os juros básicos para 15%, o BC
sepulta a chance de uma redução até o início de 2026 e irrita os petistas.
Resta saber se, no ano eleitoral, o banco resistirá à pressão de Lula
Em um momento de tantas incertezas, a ata da
última reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) serviu para o Banco
Central (BC) deixar claro que não há qualquer possibilidade de que a taxa
básica de juros caia tão cedo. O receio no mercado financeiro residia no fato
de o BC ter sinalizado, na semana passada, que o aumento dos juros em 0,25
ponto porcentual, para 15% ao ano, seria o último de um ciclo iniciado em
setembro do ano passado. Isso abriu espaço para especulações sobre a hipótese
de o Copom iniciar os cortes na Selic no primeiro trimestre de 2026, a poucos
meses das eleições presidenciais.
A ata demonstra que o BC tem feito um bom uso
da autonomia que o Congresso Nacional lhe garantiu por lei. Com sete dos nove
membros indicados pelo presidente Lula da Silva e comandado pelo “menino de
ouro” Gabriel Galípolo, o BC decidiu, por unanimidade, elevar a Selic ao maior
nível desde julho de 2006. Não é pouca coisa, sobretudo quando praticamente
metade do mercado financeiro tinha bons motivos para apostar na manutenção dos
juros em 14,75% ao ano.
O fato é que até mesmo quem se surpreendeu
com a decisão gostou dela. As expectativas para a inflação deste ano e do
próximo permanecem acima da meta, respectivamente em 5,2% e 4,5%, segundo o
boletim Focus, assim como os núcleos, que expurgam itens com preços mais
voláteis e explicitam a tendência dos preços de forma geral.
A taxa de desemprego permanece em níveis
historicamente baixos, o crédito continua pujante, sobretudo o crédito
direcionado, e a atividade ainda apresenta dinamismo, muito embora o BC
considere que já há certa moderação no crescimento em setores mais sensíveis ao
ciclo econômico, como comércio, serviços e indústria. Por isso, manter os juros
em 15% ao ano por “período bastante prolongado” será essencial para que os
efeitos dessa desaceleração se consolidem.
Também houve recados para o governo. O Copom
destacou que uma política fiscal previsível, crível e anticíclica – o exato
oposto do que o Executivo tem feito – ajudaria a conduzir a inflação à meta. O
BC mencionou ainda que o debate entre governo e Congresso sobre o peso do gasto
tributário no Orçamento é um fator que pode afetar a percepção dos investidores
sobre a sustentabilidade da dívida e, consequentemente, o prêmio da curva de
juros.
“Na discussão sobre esse tema, a principal
conclusão obtida e compartilhada por todos os membros do comitê foi de que, em
um ambiente de expectativas desancoradas, como é o caso do atual, exige-se uma
restrição monetária maior e por mais tempo do que outrora seria apropriado”,
sacramentou a ata, ressaltando que o ideal seria que as políticas fiscal e
monetária atuassem de forma alinhada.
Como não existe a menor chance de que isso
ocorra, resta ao BC manter os juros nas alturas e ao governo espernear. E foi o
que a tropa de choque de Lula da Silva fez. A ministra da Secretaria de
Relações Institucionais, Gleisi Hoffmann, considerou “incompreensível” a
decisão do Copom. “O Brasil espera que este seja de fato o fim do ciclo dos
juros estratosféricos”, afirmou, em suas redes sociais. O líder do PT na
Câmara, Lindbergh Farias, disse que a taxa era “indecente e proibitiva”. “Não
dá para aceitar como normal o novo aumento da Selic pelo Banco Central”,
declarou, também por meio de suas redes sociais. E alguns dos candidatos à
presidência do PT foram ainda mais incisivos. “Galípolo não é amigo. É
inimigo”, disse Valter Pomar, segundo a Coluna do Estadão.
Juros elevados serão um obstáculo adicional à
recuperação da popularidade de Lula da Silva, mas o governo não pretende ficar
parado esperando a economia esfriar. O presidente aposta em medidas para
colocar o novo Auxílio Gás para rodar e lançar o crédito para entregadores de
aplicativos adquirirem motocicletas e uma linha de financiamento para reforma
de casas. São iniciativas como essas que explicam a resiliência das
expectativas de inflação e reforçam o acerto da mais recente decisão do Banco
Central. A dúvida é se a instituição saberá resistir à enorme pressão que virá
nos próximos meses.
Entre a diplomacia e a tragédia
O Estado de S. Paulo
A ofensiva militar contra o Irã criou uma
chance rara de paz. O desafio agora é político: conter o Irã sem ilusões e
consolidar uma nova ordem regional com pragmatismo e pressão internacional
A trégua entre Israel e Irã, selada após
quase duas semanas de confrontos e bombardeios de alta intensidade, não encerra
uma guerra – apenas suspende seus fogos. E, ainda assim, representa uma
inflexão estratégica. A decisão do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump,
de ordenar ataques cirúrgicos às instalações nucleares iranianas, amparando
militarmente uma campanha israelense já em curso, foi uma aposta de alto risco.
Mas, ao menos por ora, se pagou. O Irã recuou. Israel colheu vitórias substanciais.
E os Estados Unidos reafirmaram sua primazia regional.
Contudo, seria um erro confundir vantagem
militar com solução política. A paz ainda está longe de ser consolidada. A
ofensiva pode ter desorganizado a teocracia iraniana, mas não a destruiu. Seu
regime permanece no poder, humilhado, imprevisível e perigosamente encurralado.
Se mal administrado, este momento de vantagem pode degenerar em tragédia. Se
bem aproveitado, pode abrir um caminho – estreito, mas real – para uma nova
arquitetura de estabilidade no Oriente Médio.
Trump merece crédito pelo pragmatismo tático.
A operação foi precisa, limitada e eficaz. Os alvos nucleares foram duramente
atingidos, sem provocar mortes americanas nem ampliar a escalada para além do
controle. A resposta iraniana – um ataque telegrafado à base de Al Udeid, no
Catar, sem vítimas – mostrou que, por trás da retórica incendiária, Teerã ainda
opera com racionalidade estratégica. A prioridade do regime continua sendo a
sobrevivência, não o martírio.
Mas o sucesso militar não elimina as
incertezas. Não se sabe se o Irã foi, de fato, impedido de produzir armas
nucleares. Também é incerto se aceitará negociar sob pressão, ou apenas ganhará
tempo enquanto reconstrói sua capacidade em segredo. O risco de reconstituição
do programa nuclear, de apoio renovado a milícias como o Hezbollah ou os
houthis, e de ações clandestinas contra alvos israelenses ou americanos é real.
A vigilância deve ser constante.
É nesse ponto que a diplomacia se impõe.
Trump afirmou que “agora é hora de paz”. Se acredita nisso, deve abandonar
fantasias maximalistas. A exigência do fim total do enriquecimento de urânio ou
a retórica triunfalista de mudança de regime apenas reforçará os setores mais
duros do establishment iraniano. A alternativa – mais realista e
eficaz – passa por um acordo em que o Irã interrompa o enriquecimento para fins
militares e aceite inspeções intrusivas, em troca de algum grau de capacidade
civil, operada por consórcio regional sob supervisão internacional.
O regime iraniano não merece confiança. Sua
conduta – da repressão doméstica ao patrocínio de grupos terroristas – comprova
seu caráter delinquente. Por isso, qualquer negociação deve ser acompanhada de
forte pressão internacional, de mecanismos de verificação robustos e de
garantias críveis para Israel quanto à contenção de armamentos convencionais e
ao fim do apoio a milícias extremistas.
Ao mesmo tempo, a nova correlação de forças
cria oportunidades. Israel, fortalecido, pode negociar a partir de uma posição
vantajosa. O enfraquecimento dos aliados iranianos na região – e o alívio de
líderes árabes, mesmo entre os que protestaram publicamente – sinaliza que uma
coalizão pela estabilidade é possível. Trump, por sua vez, detém agora uma
alavancagem inédita sobre Binyamin Netanyahu. Deveria usá-la para forçar um
cessar-fogo em Gaza condicionado ao retorno dos reféns, e iniciar, com apoio árabe,
um processo sério de reconstrução política palestina. A paz duradoura no
Oriente Médio exige também uma solução para o conflito israelo-palestino.
Os próximos passos definirão o legado dessa
ofensiva. A alternativa à diplomacia – o retorno à guerra – é sombria. Mas
ignorar a nova oportunidade aberta pela contenção do Irã seria tão temerário
quanto ceder a seus avanços nucleares. Entre a força e a conciliação, Trump
encontrou um ponto de equilíbrio momentâneo. Para consolidá-lo, precisará
liderar com firmeza e realismo. A vitória tática já ocorreu. Evitar a tragédia
– e construir algo mais duradouro – será a verdadeira prova de sua presidência.
O interesse pela Foz do Amazonas
O Estado de S. Paulo
Disputa de multinacionais por áreas
petrolíferas na Margem Equatorial reforça potencial da região
O resultado do leilão de áreas de petróleo
realizado neste mês pela Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e
Biocombustíveis (ANP) confirmou não apenas o interesse da indústria pela Margem
Equatorial, que desponta como a nova fronteira exploratória brasileira, mas
também a confiança de que, finalmente, pode ter início a atividade em alto-mar
na Bacia de Foz do Amazonas, onde a Petrobras busca autorização para perfurar o
primeiro poço em um bloco adquirido há mais de uma década.
Foz do Amazonas concentrou a maior disputa,
com 19 dos 34 blocos arrematados no leilão, e marcou o retorno de grandes
multinacionais à região. Além da Petrobras, as norte-americanas ExxonMobil e
Chevron, e a chinesa CNPC foram destaque na disputa, mas não por acaso. As três
atuam na prospecção de petróleo na margem equatorial dos vizinhos Guiana e
Suriname, transformados em novo polo petrolífero em razão das descobertas
recentes de reservas de bilhões de barris.
Companhias estrangeiras, como Total e BP,
abandonaram projetos na margem equatorial brasileira depois de esperarem por
anos, em vão, pela licença do Ibama. A Petrobras manteve a concessão em Foz do
Amazonas e somente há poucas semanas obteve permissão para deslocar ao local a
sonda que fará um simulado de vazamento de óleo. Trata-se de um exercício que
precede a concessão da licença, que nesse estágio só é negada em caso de
incapacidade flagrante na contenção de acidentes.
Por óbvio, o progresso da Petrobras, após 12
anos de persistência, e o grande potencial que especialistas veem na região
garantiram o interesse das petroleiras estrangeiras. Diante das incertezas de
um mundo mergulhado em conflitos, que envolvem diretamente grandes produtores
de petróleo, como Rússia e países do Oriente Médio, investir em novos campos é
fundamental na busca de suficiência energética, mesmo em meio ao processo de
transição para energias renováveis – até para financiar a transição, que tende a
ser lenta e custosa.
O Brasil promoveu, em 2013, o leilão que
ofertou blocos na Bacia de Foz do Amazonas e cujo imbróglio com o Ibama se
arrasta até hoje. Será, no mínimo, uma leviandade repetir o embaraço nos blocos
que acabam de ser concedidos pela ANP. É inquestionável a importância da
avaliação dos impactos ambientais em uma atividade de alto risco como a de
exploração de petróleo, mas é inaceitável que o exame dessas condições
ultrapasse a barreira técnica para virar uma espécie de profissão de fé de
ambientalistas mais preocupados com a repercussão midiática do que propriamente
com a garantia da segurança da atividade.
É urgente descobrir se estão na Margem Equatorial os reservatórios que evitarão a maior dependência do Brasil à importação de derivados de petróleo a partir de 2032, como prevê a Empresa de Pesquisa Energética (EPE). A Bacia de Campos, que foi o principal polo produtor, está em franco declínio, e a de Santos, que concentra o pré-sal, entrará em declínio até 2031. A de Foz do Amazonas, uma grande promessa, está emperrada pelo radicalismo ambiental.
Negacionismo conduz riscos à saúde pública
Correio Braziliense
Se a pandemia mostrou que as vacinas salvam
vidas, a mudança desse cenário depende, principalmente, das famílias
brasileiras
Esta vacina deixa uma cicatriz característica
e eterna: uma bolinha no braço direito. Ela também protege contra a hanseníase,
popularmente conhecida como lepra. - (crédito: Marcelo Camargo/Agência Brasil)
Criado pelo produtor de televisão canadense
R. Scott Gemmill, a série The Pitt, exibida na Max, é uma das sensações do
streaming em 2025. A produção se volta a um único dia em um hospital de
pronto-socorro de Pittsburgh, na Pensilvânia. Dentro do equipamento de saúde,
diversas nuances são problematizadas com foco nos desafios profissionais,
humanos, morais e éticos enfrentados pelos trabalhadores da saúde.
Em um dos episódios, a equipe coordenada pelo
doutor Michael Robby se depara com uma família desesperada para descobrir a
doença do filho. Após uma anamnese bastante desafiadora, o chamado diagnóstico
por exclusão conclui que o pré-adolescente está com sarampo — doença controlada
na maior parte dos países, inclusive no Brasil, graças à vacina tetraviral, que
também protege contra a rubéola, a caxumba e a varicela.
A reação da equipe de Robby em "The
Pitt" é automática: questionar os pais sobre os motivos da não vacinação
do filho e ressaltar que o imunizante existe e é aplicado sem custos, mesmo em
um país com um sistema de saúde pública de alto custo, como os Estados
Unidos.
A partir dali, o que se vê no desenrolar do
caso é uma mãe resistente ao tratamento médico por conta de informações falsas
compartilhadas nas redes sociais. A resposta só é permitida com anuência do
pai, que aproveita um momento de distração da progenitora para autorizar o
combate à doença, que, só em 2025, infectou cerca de 1 mil pessoas nos
EUA.
A negação à vacinação infantil é um problema
mundial e com reflexos no Brasil, como mostrou o Anuário Vacina BR, dissecado
pelo Estado de Minas em matéria publicada na semana passada. No caso de Minas
Gerais, as coberturas vacinais vêm caindo desde 2015, com quedas acentuadas a
partir da pandemia de covid-19. A dificuldade é ainda mais crescente quando se
olha para a adesão aos esquemas completos, ou seja, as imunizações que precisam
de doses de reforço.
A publicação é resultado do cruzamento de
dados públicos sobre vacinação com registros populacionais e de nascidos vivos
e cobre o período de 2000 a 2023. De acordo com o estudo, a tríplice viral, que
protege contra o sarampo e outras viroses, só teve sua meta de cobertura de 95%
alcançada em quatro estados para a primeira dose. No entanto, nenhum deles
conseguiu ultrapassar 80% de cobertura para o esquema completo, e 14 unidades
federativas ficaram abaixo de 50%.
Os dados ligam o alerta para um problema
social de profundos reflexos para a saúde pública brasileira. Se a pandemia
mostrou que as vacinas salvam vidas, a mudança desse cenário depende,
principalmente, das famílias brasileiras, ainda que o poder público tenha que
cumprir seu papel com a oferta de imunizantes de maneira descentralizada e com
a elaboração de campanhas de conscientização. São os pais os principais
responsáveis por essa proteção das crianças.
O combate ao negacionismo é o maior desafio
nesse panorama. É necessário monitoramento contínuo das informações
fraudulentas que circulam nas redes sociais, a partir de um protocolo de
resposta assertivo e ágil. Iniciativas como a oferta da imunização nas escolas
são bem-vindas, mas é por meio da comunicação governamental que esse retrocesso
precisa ser freado.
Aumentam as queimadas no Brasil
O Povo (CE)
A grande oportunidade para o Brasil e o mundo
discutirem como enfrentar a emergência climática, de modo a preservar o
planeta, será a COP30, a ser realizada em Belém (PA), em novembro deste ano
Relatório do MapBiomas divulgado ontem mostra
que no ano de 2024 foram registrados 30 milhões de hectares de queimadas em
todo o País. De acordo com o levantamento, foi a segunda maior extensão que o
fogo atingiu nos últimos 40 anos, com média de 62% acima do período entre 1995
e 2024.
Do total queimado, 72% foram áreas de
vegetação nativa, com a cobertura florestal sofrendo o maior impacto, com 7,7
milhões de hectares incendiados.
Mais da metade da área atingida (15,6 milhões
de hectares) concentrou-se na Amazônia, o maior número da série histórica. A
alta de incêndio foi de 117% em relação à média dos últimos 40 anos.
Conforme o relatório da MapBio, pela primeira
vez as florestas superaram as pastagens como a cobertura mais atingida,
representando 43% da área queimada na região amazônica.
O Pantanal também sofreu com recordes
negativos, mas todos os biomas, além dos já citados, tiveram perdas
significativas causadas pelo fogo, como a mata atlântica, caatinga, cerrado e o
pampa.
Em declaração à Agência Brasil, o coordenador
de mapeamento da Amazônia do MapBiomas, Felipe Martenexen, afirma que a região
foi muito afetada pelo fenômeno El Ninho, em 2023 e 2024, deixando o bioma mais
seco e suscetível ao fogo. Mas ele também disse que foi necessária a ação
humana para que os incêndios tivessem início.
Ou seja, o aumento das queimadas ocorre por
dois fenômenos que podem ser controlados. Primeiro, aumentando a fiscalização
para coibir a atividade dos incendiários; depois, implementando propostas para
combater o aquecimento global. No entanto, essa última providência não depende
apenas de iniciativas isoladas de cada país.
Quanto ao desmatamento, o levantamento do
MapBio traz números positivos. Em 2024, pela primeira vez em seis anos, houve
queda de desmatamento em todos os biomas, com exceção da mata atlântica, que
permaneceu estável, mas apresentou queda de 60% no ano anterior.
A grande oportunidade para o Brasil e o mundo
discutirem como enfrentar a emergência do clima, de modo a preservar o planeta,
será a 30ª Conferência da ONU sobre Mudanças Climáticas (COP30), a ser
realizada em Belém (PA), em novembro de 2025.
Sob a presidência brasileira, o Palácio do
Planalto considera a COP 30 "uma oportunidade histórica para o Brasil
reafirmar seu papel de liderança nas negociações sobre mudanças climáticas e
sustentabilidade global".
No entanto, a responsabilidade do governo também aumenta perante ao mundo, tanto pelas medidas que tem de tomar em relação ao Brasil para a proteção do meio ambiente, quanto pelas metas ousadas contidas na carta assinada pelo embaixador brasileiro, André Aranha Corrêa do Lago, presidente da COP 30.
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