quinta-feira, 22 de abril de 2010

A culpa é nossa!:: Comte Bittencourt

DEU EM O GLOBO

Muitas de nossas cidades castigadas por chuvas intensas se viram envolvidas em total desordem, agravada pela morte de mais de duzentas e cinquenta pessoas. Isso nos faz pensar na responsabilidade para com a sociedade.

O programa do governo estadual, apresentado e debatido com a sociedade nas eleições em 2006, falava que uma das prioridades da gestão moderna, para uma política de habitação, era desenvolver projetos ordenados nas regiões do Estado do Rio de Janeiro — com aerofotografia e mapeamento, atualização de dados estatísticos, identificação de vazios urbanos, mapeamento de áreas de risco, áreas favelizadas, aglomerações subnormais não identificadas como favelas etc. Propunha, enfim, a criação de base de dados para planejamento de ações e programas, criação de cadastro, legalização e titulação das propriedades para as famílias a serem atendidas.

Pesquisei as atividades legislativas da Assembleia Legislativa nos últimos vinte anos. Procurei projetos que envolvessem a questão urbana do ponto de vista da regularização habitacional. Eis o resultado: Em 1988, a Alerj aprovou um projeto do ex-deputado Milton Temer, cuja lei recebeu o no1.354, que já tratava de uma política habitacional para áreas habitadas por comunidades carentes.

Em 2006, a governadora Rosinha Garotinho encaminhou à Alerj um projeto de lei criando o Fundo Estadual de Habitação de Interesse Social — aprovado pela Casa e sancionado pela governadora.

Pergunto: quais os recursos que foram utilizados, desde 2007, desse Fundo Estadual de Habitação de Interesse Social? Para obter a resposta é simples: basta ir aos orçamentos. Constataremos que quase nada. E reparem que foi uma mensagem do Poder Executivo, de autoria da governadora Rosinha, em dezembro de 2006, com o governador Sérgio Cabral já eleito.

O que se fez com esse fundo? Praticamente nada. Dos R$ 215 milhões previstos, até hoje apenas cerca de R$ 4,8 milhões foram utilizados.

Em 2007, o deputado Gilberto Palmares e o deputado André Corrêa aprovaram uma lei ( no5.149, para destinar e vincular 10% do produto da arrecadação do Fundo Estadual de Combate à Pobreza para habitação popular. Ora, se recuperarmos o valor arrecadado desde 2003, constataremos que são mais de R$ 11 bilhões os recursos colocados neste Fundo de Combate à Pobreza! Para onde está indo esse dinheiro? Infelizmente para pagar serviços terceirizados e pessoal terceirizado. Seguramente o Grupo Facillity arrecadou muito desses bilhões nos seus contratos com o governo do Estado. Por outro lado, quantas casas foram construídas com esses R$ 11 bilhões? Não vimos.

O deputado Luiz Paulo, juntamente com o deputado Rodrigo Neves, em 2008, aprovou com apoio total dos deputados estaduais, a criação do Conselho Estadual das Cidades, mais uma ferramenta.

Continuando a pesquisa, encontrei um projeto tramitando desde 2005 do ex-deputado Carlos Minc tratando dessa mesma matéria. O mesmo acontece com um projeto da deputada Aparecida Gama. E com outro, de igual teor, do deputado José Divino, de 1999. O deputado André Corrêa tem ainda um projeto de 2004 que diz respeito, também, à habitação popular e ao ordenamento urbano das encostas do Rio de Janeiro.

É claro que, mesmo assim, a Assembleia Legislativa deveria e deve procurar meios de pressionar o Poder Executivo para que cumpra as leis em vigor. O Legislativo fez a sua parte, mas não vigiou como é sua obrigação. Produzimos a agenda legislativa, mas tínhamos de cobrar a execução. Deveríamos denunciar a não execução. Deveríamos cobrar do Ministério Público, pois toda essa legislação que está aí poderia ter ajudado a evitar a calamidade e esse inferno que estão passando diversas famílias.

Se o Executivo e nós — o Executivo e nós! — tivéssemos tido um pouco mais de prontidão e de responsabilidade, muitas vidas teriam sido poupadas.

Comte Bittencourt é deputado estadual (PPS), foi vereador e vice-prefeito de Niterói (2004 a 2005) e Presidente Estadual do PPS/RJ

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