- Valor Econômico
Mudança na Lei de Responsabilidade Fiscal terá forte efeito sobre a administração
Não recebeu a devida atenção uma mudança feita na Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) pelo projeto de lei complementar 39/2020, aprovado na terça-feira pela Câmara dos Deputados e ontem pelo Senado. O noticiário ficou restrito ao montante e à distribuição da ajuda financeira da União aos Estados e municípios, com pouca luz sendo jogada sobre uma alteração que terá caráter permanente e vai melhorar o controle sobre os gastos com a folha salarial dos servidores.
A alteração do artigo 21 da LRF, feita pelo PLP 39, torna nulo o ato que resulte em aumento da despesa com pessoal em períodos posteriores ao final do mandato do titular do Executivo, do Judiciário, do Legislativo, do Ministério Público e dos Tribunais de Contas.
Ou seja, não vale mais aquela prática, bastante difundida, de conceder reajuste salarial em várias parcelas a serem pagas pelos governos seguintes. Prática que, na esfera federal, foi usada em governos do PT. A ex-presidente Dilma Rousseff foi obrigada a pagar parcelas significativas de reajustes salariais concedidos pelo ex-presidente Luiz Inácio da Silva. A nova regra valerá para os três Poderes e órgãos da União, dos Estados e dos municípios.
Os aumentos concedidos durante o governo do ex-presidente Michel Temer tiveram parcelas pagas a várias categorias até o ano passado.
Será nula também a aprovação, a edição ou a sanção, pelos chefes do Executivo, pelos presidentes das casas do Legislativo, pelos presidentes de Tribunais do Poder Judiciário e pelo chefe do Ministério Público da União e dos Estados de norma legal contendo plano de alteração, reajuste e reestruturação de carreiras do setor público ou a edição de ato para nomeação de aprovados em concurso público quando houver parcelas de aumento de despesas a serem implementadas em período posterior ao fim do mandato.
Como foi aprovado ontem pelo Senado, o PLP 39 vai agora à sanção do presidente Jair Bolsonaro. A nova regra da LRF terá grande importância no controle das despesas com pessoal e acabará com uma prática nefasta dos administradores deixarem despesas de pessoal para serem pagas por seus sucessores.
A iniciativa de alterar o artigo 21 da LRF parece ter sido do Ministério da Economia, aceita e incorporada ao projeto por seu relator, o senador Davi Alcolumbre (DEM-AP). Ela não consta do projeto de lei complementar 149/2020, que trata da compensação pela perda de receita dos Estados e municípios, aprovado anteriormente pela Câmara, e nem do PLP 39/2020 original, de autoria do senador Antonio Anastasia (PSD-MG). Não resultou também de emenda de nenhum senador.
Alcolumbre disse, em seu parecer, que a motivação da mudança na LRF “é impedir que os governantes e chefes de Poder atuais criem despesas novas para seus sucessores, inviabilizando, dessa forma, a futura administração”. O presidente do Senado lembrou aos seus colegas as práticas política que, infelizmente, ainda imperam no Brasil. “Muitos aqui sabem das dificuldades de administrar um município ou um Estado, especialmente quando herdam dívidas contraídas pelo antecessor, que, em busca de dividendos políticos, compromete a sanidade das contas públicas”.
Alcolumbre entendeu que a proibição para que não se deixe despesa salarial a ser paga pelos sucessores “ajuda a resolver um problema mais estrutural, que a LRF, em sua redação original, não conseguiu plenamente”. A mudança, portanto, feita em meio a uma crise sanitária sem paralelo neste século, ajudará, em caráter permanente, o equilíbrio das contas.
Até agora, a LRF considerava nulo apenas o ato que resultasse em aumento da despesa com pessoal expedido nos cento e oitenta dias anteriores ao final do mandato dos titulares dos três Poderes, do Ministério Público e dos tribunais de contas. A regra poderia ser facilmente burlada pois, em boa parte dos casos, os aumentos nas despesas com pessoal são concedidos para vigorarem no último ano dos mandatos, principalmente, no caso de Estados e municípios, com parcelas a serem pagas nos exercícios seguintes.
O exemplo mais recente é o caso da prefeitura do Rio de Janeiro. No mês passado, os vereadores do Rio aprovaram um projeto de lei que cria uma nova gratificação para os servidores administrativos da prefeitura. Como o município está em situação de calamidade pública por causa do novo coronavírus, os vereadores aprovaram uma emenda determinando que a gratificação só será concedida em 2022.
Ou seja, a próxima administração, a ser eleita neste ano, terá que pagar a conta.
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Comemorou-se muito, dentro do governo, a aprovação pelo Senado e pela Câmara do artigo 8º do PLP 39, que proíbe governos estaduais e prefeituras de darem aumento, a qualquer título, na remunerações dos seus servidores. O congelamento das despesas com pessoal até o dia 31 de dezembro de 2021 foi apresentado como uma contrapartida de Estados e municípios à ajuda financeira da União durante a pandemia.
A questão discutida na área técnica é que o famoso artigo 8º do PLP 39 pode ser inconstitucional. A nota informativa 18, da Consultoria de Orçamento e Fiscalização Financeira da Câmara dos Deputados, diz que “poderá haver questionamentos quanto à possibilidade de a União legislar sobre matérias inerentes à competência legislativa e administrativa dos entes subnacionais, sem ofender a autonomia de tais entes”.
A consultoria considera que uma emenda constitucional seria “o instrumento mais adequado para determinar o congelamento da remuneração de todo os agentes públicos das esferas de governo atingidas pela calamidade reconhecida pelo Congresso Nacional”. A questão agora é saber se alguma entidade representativa de servidores terá interesse em ingressar no Supremo Tribunal Federal, com uma ação direta de inconstitucionalidade questionando o artigo 8º.
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