O Globo
Prisão de Milton encontra Bolsonaro isolado e sem rumo
Não faz nem três meses que um indignado
Jair Bolsonaro chamou de “covardia” a pressão para que seu então ministro da Educação deixasse o cargo. "O
Milton, coisa rara de eu falar aqui, eu boto a minha cara no fogo pelo Milton,
a minha cara toda no fogo pelo Milton", disse o presidente da República,
numa live.
Na manhã de ontem, com a prisão de Milton
Ribeiro e dos pastores que intermediavam a liberação de verbas no MEC, o
governo entrou em autocombustão. “Desastre” era a palavra mais usada por
diferentes aliados do presidente para definir a situação, entre transtornados
com as prisões e apavorados com os estragos potenciais sobre a campanha para a
reeleição.
Ribeiro saiu do governo dizendo que só
acolhera os pastores no ministério por ordem de Bolsonaro. Logo depois das
prisões, porém, o presidente já disse a uma rádio que “ele responda pelos atos
dele”, acrescentando que, “se tem algum problema, a PF está agindo, está
investigando”.
A estratégia de se descolar de Ribeiro pode até fazer algum efeito imediato, mas ninguém que conhece bem as engrenagens de Brasília aposta que durará muito. Basta revisitar a história de como o ministro chegou ao governo.
Pastor presbiteriano, ele foi indicado para o cargo pelo então ministro da Justiça e agora ministro do Supremo, André Mendonça, e pela primeira-dama Michelle Bolsonaro, ambos evangélicos como ele.
Quando surgiu o escândalo envolvendo a
formação de um gabinete paralelo de liberação de recursos formado por pastores
no MEC, Michelle disse que “Deus sabe de todas as coisas e vai provar que ele é
uma pessoa honesta, justa e leal”.
Além disso, no MEC ainda estão
figuras-chave ligadas ao Centrão. Alojadas no Fundo Nacional de Desenvolvimento
da Educação, elas dispõem de mais de R$ 64 bilhões para aplicar em programas
educacionais e equipamentos como ônibus, escolas e quadras esportivas.
Desde a prisão dos pastores, submergiram o
ministro Ciro Nogueira, que até outro dia fustigava Lula nas redes, defendendo
a pauta da “família e dos valores”, e Arthur Lira, que surfava na crise dos
combustíveis, colocando a diretoria da Petrobras contra a parede.
É evidente que essa crise está apenas
começando e não dá para ter ideia ainda de como ela avançará. Pior do que a
bomba, porém, é o terreno onde ela explode.
O caso pegou o governo em completa
desorientação com a crise dos combustíveis — e o presidente da República,
isolado. Bolsonaro há meses só ouve o mesmo círculo de acólitos que riem das
suas piadas e insuflam suas teorias conspiratórias. Não quer saber de governar
e nem ao menos de buscar soluções para o problema dos combustíveis.
Quer, isso sim, botar a culpa nos outros.
Como não sabe arbitrar a disputa entre o time de Lira, que trabalha para tomar
a Petrobras de assalto e produzir “sinergias” para seu grupo político, e o de
Guedes, agarrado à ilusão de que encaminhará a privatização em poucos meses,
ele empurra a responsabilidade da crise para a empresa.
Como não consegue esboçar propostas para
combater o aumento da fome, aproveita as ocasiões em que fala em público para
atacar as urnas eletrônicas.
Não adianta seus aliados explicarem que a
dona Maria e o seu Zé não estão nem aí para a urna eletrônica, e que para o
eleitor comum toda essa gritaria já soa como choro de perdedor.
Bolsonaro parece decidido a perder a
eleição do seu jeito no lugar de tentar ganhar ouvindo alguns conselhos. Anda
paranoico com a possibilidade de impeachment, cassação ou prisão e vê traidores
por toda parte. Pode até ter razão, mas são essas as relações políticas que ele
construiu e é com elas que ele tem de marchar.
Não deixa de ser uma baita ironia do
destino que um escândalo tão danoso quanto o do MEC tenha sido criado em torno
de um aliado que ele considerava fiel e por quem colocava a cara no fogo. E é
algo que diz muito não sobre o aliado, mas sobre o próprio Bolsonaro.
O presidente da República disputa a
reeleição perdido num labirinto de sombras e passa o tempo todo querendo
fabricar um golpe para esconder suas próprias fragilidades. Só que, em vez de
sair na foto como herói ou um mártir, como pretende, ele parece apenas cada dia
mais próximo de perder as eleições.
Se isso acontecer, será inútil dizer que
foi derrotado por inimigos externos ou ocultos. A culpa não terá sido de
ninguém a não ser ele mesmo. Periga não restar nem mesmo quem queira colocar a
cara no fogo em seu nome
Um comentário:
São todos amigos de fé,irmãos camaradas,uma mão sujando a outra.
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