- Folha de S. Paulo
Entregadores por aplicativo lutam por direitos em vácuo regulatório.
Entregadores por aplicativo que estão se mobilizando por melhores condições de trabalho marcaram para 10 de julho uma paralisação e um boicote. Eles pedem melhor remuneração, seguro de vida, seguro contra roubos e acidentes e equipamentos de proteção contra a Covid-19.
As reivindicações de entregadores encontram-se emparededas entre os aplicativos que consideram que não têm obrigações, pois os entregadores seriam autônomos, e os defensores das antigas proteções do trabalho, que querem enquadrá-los como trabalhadores assalariados.
O trabalho por aplicativo tem características mistas, que, por um lado, lembram o trabalho autônomo (não há jornada e os trabalhadores são proprietários dos meios de trabalho), e, por outro, se assemelham ao trabalho assalariado (aplicativos definem os protocolos e estabelecem a remuneração).
Às vezes é tentador assistir essa nova forma de trabalho com as proteções consagradas do trabalho assalariado, mas, na maioria dos casos, ela simplesmente mataria esse novo mercado de trabalho, que se baseia na flexibilidade da jornada e na redução do custo do serviço.
Com a pandemia e os riscos associados a sair de casa, entregadores se tornaram um trabalho essencial, mas completamente desprotegido.
Não faz sentido, por exemplo, que os aplicativos não sigam nenhum parâmetro para definir a remuneração de entregadores e motoristas que, se medida em horas, muitas vezes está abaixo do salário mínimo, especialmente quando se computam os custos de desgaste e manutenção dos veículos. Também não faz nenhum sentido que as empresas estabeleçam elas mesmas, sem regulação ou supervisão, o percentual que retiram sobre os pagamentos para mediarem a relação entre consumidores e prestadores.
Quando o trabalho por aplicativo foi caracterizado como trabalho assalariado pela corte constitucional da Califórnia, nos EUA, a Uber fez uma contraproposta de regulação que poderia servir de ponto de partida para uma regulação moderna. Entre as inovações propostas, a empresa sugeriu um sistema de representação dos trabalhadores para negociar anualmente a tarifa que remunera os motoristas, emulando, em novos termos, uma negociação sindical em data base.
Maia e Alcolumbre bem que poderiam responder à demanda concreta dos entregadores com uma regulação bem calibrada capaz de proteger entregadores e motoristas sem destruir o mercado de trabalho recém-criado. Seria uma excelente sinalização de consideração a uma categoria que é hoje fundamental para a manutenção do distanciamento social.
*Pablo Ortellado, professor do curso de gestão de políticas públicas da USP, é doutor em filosofia.
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