sexta-feira, 24 de dezembro de 2021

Federações terão que superar impasses regionais

Federações à vista: Partidos tentam superar impasses regionais e miram formação de federações já para a eleição de 2022

PT, PSOL, PV e Rede já aprovaram debate com outras siglas e buscam atrair PSB; PSDB e Cidadania vão retomar conversas em janeiro

Bianca Gomes e Gustavo Schmitt / O Globo

SÃO PAULO — A possibilidade de formar uma federação, instrumento que permite a dois ou mais partidos atuarem como um só por quatro anos, deve mexer com as negociações para as eleições de 2022 nos próximos meses. As direções de PT, PSOL, PV e Rede aprovaram recentemente iniciar a discussão com diferentes siglas e buscam atrair também o PSB. Já PSDB e Cidadania têm conversas adiantadas. Impasses regionais, no entanto, ainda precisam ser superados para que as negociações se concretizem.

Regulamentada pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), no último dia 14, a federação permite que os partidos possam se unir sem precisarem recorrer à fusão, processo mais complexo, que envolve a criação de uma nova sigla, como o União Brasil, que deve surgir da integração de DEM e PSL.

Legendas menores veem no instrumento a chance de manter acesso ao dinheiro do fundo partidário. Essas siglas foram atingidas pela cláusula de barreira, adotada em 2018 para limitar repasses a partidos que não conseguirem um mínimo de votos. Já as siglas maiores aumentam o tempo de propaganda na TV e podem ganhar puxadores de voto na disputa pelo Legislativo.

Por outro lado, o número total de candidatos de cada partido numa federação tende a ser menor, segundo Michel Bertoni, da Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político:

— A federação pode lançar o mesmo número de candidatos nas eleições proporcionais que cada partido poderia lançar isoladamente. Assim, terá de haver muito critério na composição das listas proporcionais — afirma.

Outro obstáculo, segundo líderes partidários e analistas, é a necessidade de atuar juntos por quatro anos, inclusive nas eleições municipais. Conciliar interesses regionais, que podem colidir com a lógica nacional, pode ser um entrave.

— A federação é um repeteco da coligação com um grau de compromisso maior. Mas não resolve o problema da fragmentação partidária — afirma o cientista político Marco Antônio Teixeira, da FGV. — Quem ganha mais são os pequenos. Para os médios e grandes, é complicado pelos interesses regionais.

Situação paulista

Um exemplo é o impacto que a eleição para o governo de São Paulo pode ter numa eventual federação entre PT e PSB. O ex-prefeito Fernando Haddad (PT) e o ex-governador Márcio França (PSB) são pré-candidatos, aparecem nas primeiras posições nas pesquisas de intenção de voto, e não pretendem abrir mão da corrida estadual. O presidente do PSB, Carlos Siqueira, vê o tema com cautela:

— Federação não se discute sozinha. Só se for um acordo geral, mais amplo — afirmou Siqueira.

Além do PSB, o PT discute a federação também com PCdoB, PV e PSOL. Desses três, o PSOL é o único que ainda não aprovou internamente manter conversas com os petistas. Segundo o presidente da legenda, Juliano Medeiros, há conversas com PCdoB e Rede, legenda que aprovou a negociação no dia 22.

— Para o PSOL, uma federação não é um acordo eleitoral. Exige identidade programática e ideológica. Além disso, demanda muito diálogo para ajustar realidades regionais, o que sempre é complexo — disse ele.

Uma dificuldade para a formação de um grande bloco é que os partidos também negociam separadamente. A presidente do PCdoB, Luciana Santos, vice-governadora de Pernambuco, disse que mantém negociações em separado com PT, PV e PSB — segundo ela, todas estão “no mesmo ritmo”:

— Ainda estamos vendo a melhor equação estatuária, vamos entrar em programa, equação eleitoral dos estados, há muito trabalho.

Embora não tenha uma sinalização oficial do outro lado, o presidente nacional do PV, José Luiz Penna, afirma que colocou o departamento jurídico para trabalhar em um estatuto da federação com PCdoB e PSB.

— O PV não está só tentando se salvar eleitoralmente. Nós já estamos trabalhando há mais de um ano numa frente democrática contra o autoritarismo — diz Penna.

Com boa parte dos partidos de esquerda apoiando o PT, sobraram poucas legendas para o PDT tentar uma federação. A legenda mantém diálogos ainda iniciais com siglas como Cidadania, Solidariedade, Avante e Rede. O presidente do PDT, Carlos Lupi, diz que as realidades regionais atrapalham:

— O pressuposto (para a federação) é apoiar a candidatura do Ciro. Estamos conversando com muita gente, mas ninguém fechou. 

Movimentos à direita

Questões regionais também precisam ser resolvidas para que PSDB e Cidadania formem uma federação. Os presidentes das duas legendas devem retomar o assunto em janeiro. O Cidadania lançou à Presidência o senador Alessandro Vieira, que teria que abrir mão da pretensão ao Planalto. Além disso, deve lançar a senadora Leila Barros ao governo do Distrito Federal — no estado, o PSDB planeja anunciar o senador Izalci Lucas.

— Tem alguns problemas regionais, mas não há grandes dificuldades — diz Freire.

Republicanos, Solidariedade, Novo, União Brasil, Patriota e Podemos não discutem o tema no momento.

Professora de direito eleitoral na Escola Paulista de Direito, Gabriela Araújo, lembra que partidos maiores têm outro atrativo ao negociar federações: construir uma base no Legislativo sem precisar negociar a cada votação:

— No caso dos partidos maiores, a vantagem é que a união entre eles já prepara uma base sólida no Parlamento, antes mesmo das eleições, aglutinada por programas políticos e ideais comuns que darão suporte também ao chefe do Executivo eleito ou a uma oposição forte, a depender do resultado eleitoral.

O que são as federações partidárias ?

União de dois ou mais partidos em federações foi instituída pelo Congresso Nacional na reforma eleitoral deste ano e foi regulamentada pelo TSE este mês. Os partidos da federação devem participar de forma conjunta em todas as eleições que ocorrerem no período de quatro anos, seja no Executivo ou no Legislativo.

Punição

O partido que desistir da federação antes do prazo estipulado pode ficar sem acesso ao fundo partidário e à propaganda na TV. Se sair depois de quatro anos, porém, a sigla pode se juntar a outras.

Outros tipos de união de partidos:

Fusão

A fusão de partidos é um processo mais complexo, pois envolve a criação de uma nova sigla, por tempo indeterminado, a partir de duas legendas.

Coligação

Quando ainda era permitida, a coligação era uma união de partidos apenas durante uma eleição. Era possível que uma coligação para a eleição presidencial não valesse em todos os estados.

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