quinta-feira, 7 de março de 2024

Bruno Carazza - Sinal de alerta sobre a popularidade do governo Lula

Valor Econômico

Pesquisa Quaest mostra piora de avaliação entre grupos que sempre apoiaram o presidente

A fotografia parece a mesma de um ano atrás, mas nos detalhes é que se percebe a perda de brilho e uma certa mudança no semblante dos personagens.

Os números da pesquisa Genial Quaest que acabam de sair sobre a aprovação do presidente Lula e de seu governo são muito parecidos com o retrato de um ano atrás, quando seu terceiro mandato se iniciou.

Na linha do que o cientista político Felipe Nunes, diretor da Quaest, e o jornalista Thomas Traumann definiram no seu livro Biografia do Abismo, a sociedade brasileira está calcificada entre lulistas e bolsonaristas.

De forma geral, o panorama que saiu das urnas em outubro de 2022 continua intacto: Lula tem mais apoio no Nordeste, sua rejeição é menor entre as mulheres e sua aprovação é mais alta entre a população preta, menos escolarizada e com renda familiar mais baixa.

Seus pontos fracos estão justamente onde Bolsonaro prevaleceu na eleição passada: sulinos e sudestinos, homens brancos com renda e escolaridade mais alta e – detalhe muito importante – evangélicos.

Se na big picture nada mudou, quando se ajusta o zoom é possível perceber pontos de preocupação para o governo.

De acordo com os dados da Quaest, em relação a dezembro de 2023, a desaprovação do trabalho de Lula subiu de 41% para 45% entre as mulheres, aproximando-se do índice observado entre os homens (47%), que sempre foi significativamente mais alto.

Fevereiro também mostra, pela primeira vez, Lula sendo mais rejeitado (50%) do que consagrado (46%) entre os jovens de 16 a 34 anos. E apesar de contar com uma ampla margem de aprovação entre as pessoas com menores escolaridade e renda, o descontentamento com o trabalho do presidente nessas categorias subiu forte: de 32% para 38% no grupo que possui até o ensino fundamental e de 32% para 36% entre os que recebem até dois salários-mínimos por mês.

Entre os evangélicos, o salto é o mais alto desde o início do mandato: a desaprovação pessoal de Lula subiu de 56% para 62% e a avaliação negativa do seu governo se elevou de 36% para 48% – tudo isso no curto espaço de tempo entre dezembro de 2023 e fevereiro último.

Embora Lula ainda apareça bem na foto, segurando uma boa popularidade após o primeiro ano de seu retorno ao Palácio do Planalto, o esmaecimento de sua imagem revelados pela última pesquisa Quaest tendem a aumentar a pressão para que seus ministros apresentem projetos de impacto voltados para grupos específicos.

O lançamento da nova regulamentação para os trabalhadores das plataformas digitais de transporte vai justamente nessa direção, pois atende a um grupo em geral jovem, com poucos anos de estudo e de baixa renda. No mesmo rumo vão as negociações entre o governo e a bancada evangélica no Congresso por um novo pacote de benefícios tributários para as igrejas.

O mais intrigante na deterioração da forma como Lula e seu governo são avaliados, contudo, é que ela se dá após uma maré de notícias positivas na economia. O PIB surpreendeu as expectativas em 2023, crescendo quase 3%, a inflação cedeu de 5,8% em 2022 para 4,6% no ano passado, o desemprego está baixo (7,6%) e a taxa de juros básica da economia recuou de 13,75% para 11,25% ao ano.

Apesar dos números positivos, a maior parte dos entrevistados pela Quaest acredita que a economia piorou nos últimos 12 meses (38%, contra 26% que acreditam que ela melhorou). Olhando para frente, os otimistas em relação às condições econômicas para 2024 recuaram de 55% para 46% de dezembro para fevereiro, enquanto os pessimistas aumentaram de 25% para 31%.

Esse, aliás, é o paradoxo que vive o ministro da Fazenda, Fernando Haddad: a despeito de todas as boas entregas realizadas em 2023, boa parte da população ainda não reconhece que suas condições de vida melhoraram.

Pode ser apenas uma questão de timing, e com o passar do tempo os louros da boa gestão econômica serão captados pelas pesquisas. Mas esses últimos números ligam um sinal de alerta.

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