O Globo
Os tempos que estamos vivendo podem
favorecer que situações impensáveis numa democracia sejam normalizadas, como se
fizessem parte de um diálogo saudável. Não há nada de saudável, no entanto, no
envolvimento de militares no debate das urnas eletrônicas ou na declaração do
ministro da Defesa, general Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira, de que as Forças
Armadas continuam “em estado de permanente prontidão” para o cumprimento de
suas missões constitucionais. Se continuam, é porque já estão “de prontidão”, o
que é preocupante e inexplicável.
Os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) e os líderes políticos estão
caindo numa armadilha institucional quando colocam os militares em condições de
igualdade com os Três Poderes da República nessas conversações.
O presidente do Supremo, ministro Luiz Fux,
em discurso ontem, provavelmente decepcionado com a nota oficial do Ministério
da Defesa, referiu-se ao Legislativo quando disse que estavam juntos na defesa
da democracia. Não colocou o Executivo nessa conta, muito menos os militares,
cujo comportamento institucional pressupõe que estejam a serviço dos Três
Poderes, e não apenas de um deles, no caso o Executivo comandado pelo
presidente Bolsonaro.
O elogio da liberdade de imprensa em seu dia, feito também por outros ministros
do STF, tem a ver com essa disputa pela defesa da democracia. Outro ministro do
Supremo, Edson Fachin, que preside o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), afirmou
que não se pode transigir com ameaças à democracia, nem permitir a corrosão da
autoridade do Judiciário.
A nota do Ministério da Defesa sobre o encontro do ministro Paulo Sérgio com Fux no mínimo causa estranheza ao falar em “prontidão”, situação que se enquadra quando há guerra, sublevação, questão interna de segurança. Não consta que exista nada disso no momento, embora seja permitido temer que os ataques do presidente Jair Bolsonaro às urnas eletrônicas possam causar desestabilização política no país.
Quando o ministro Luís Roberto Barroso
falou numa palestra on-line com alunos de uma universidade alemã que os
militares estavam sendo orientados a contestar as urnas eletrônicas, criou uma
crise com o Ministério da Defesa, e critiquei-o por ter tocado num assunto
delicado em uma universidade estrangeira. Vê-se agora que ele tinha razões para
alertar sobre essa interferência, embora eu continue achando que o momento não
foi adequado.
Barroso, claro, estava realmente refletindo essa sensação de desconforto diante
do comportamento do representante dos militares que ele, Barroso, pôs na
comissão de transparência procurando uma aproximação institucional de boa-fé.
Foi um erro político, porque favoreceu que os militares endossassem as
desconfianças do presidente.
Fux está sendo criticado internamente no STF por ter marcado reunião com o
ministro da Defesa. Entendo a posição dele e também do presidente do Senado,
Rodrigo Pacheco. Preocupados com a situação, sentiram necessidade de trocar
ideias com outras instituições e autoridades. Pacheco também teve encontro com
o presidente do Superior Tribunal Militar (STM), que havia desdenhado as
denúncias de tortura a presos políticos na ditadura militar. Em tempos normais,
militares não teriam nada a ver com o que acontece no país na área política,
pois a disputa política não pode ser transformada em questão de segurança
nacional. Mas estamos em tempos estranhos.
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Morreu Humberto Barreto, assessor de imprensa do presidente Ernesto Geisel. Foi
um dos responsáveis pelo fim da censura à imprensa e um defensor da abertura
democrática.
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